Estou lendo o livro do Donald Dorman, "The Design of Everyday Things", que ele explica a usabilidade, os aspectos psicológicos da usabilidade das coisas do dia a dia, né. Por que que a gente às vezes se bate e empurra uma porta que é para puxar, por que que a gente não consegue se achar nas bocas do fogão, por que que a gente não consegue programar o micro-ondas e uma série de aparelhos que no nosso dia a dia causam vários problemas de usabilidade para nós. Então ele vai buscar lá na psicologia cognitiva as respostas para essas falhas de comunicação entre os objetos e a gente. Então lá pelas tantas ele está explicando a diferença na mente humana sobre o consciente e o inconsciente, que o consciente ele é mais racional, né, então você pode focar numa única coisa e trabalhar com uma certa capacidade de processamento limitada. Já o inconsciente ele tem uma capacidade ilimitada de processamento, porém você não pode controlar muito como que vai ser feito esse processamento. Ele dá o exemplo dos jogos, né, que a gente não consegue jogar um jogo muito complexo conscientemente, por que senão a gente não consegue conceber as possibilidades de movimentos que a gente pode fazer conscientemente. Por exemplo, no xadrez se você tem, por exemplo, oito movimentos disponíveis para você fazer, você tem que calcular esses oito, mas também você tem que calcular a próxima jogada do seu oponente. Então se você tem oito, o seu oponente vai ter sessenta e quatro e você vai ter que calcular também o que você vai fazer depois dessa volta do seu oponente. Então começa uma relação exponencial de possibilidades que não podem ser calculadas por uma mente humana pela parte consciente. Você deixa isso a cargo do seu inconsciente, você vai na intuição, que os jogadores chamam, né. O inconsciente ele tem uma capacidade de processamento fantástica, fabulosa, por isso a gente precisa deixar pra ele fazer essas coisas. Aí eu vou dar até um exemplo aqui pra vocês verem que realmente não tem jeito da gente jogar sem simplificar o jogo, né. Peguem aí uma folha de papel, escrevam aí o número de um a nove, né, um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, cortem os pedacinhos de papel, espalhem numa mesa, peçam pra uma outra pessoa pra pegar um número qualquer, né, e você pega outro. Aí vai assim, cada um tem que pegar, o objetivo do jogo é cada um pegar três números que somados deem quinze. Aí se passar de três aí já perde, né, já começa de novo o jogo, já perdeu. Então, se não conseguir pegar, se passar de três e não conseguir chegar a quinze, aí empatou, né. Então esse jogo é muito difícil, se você for tentar jogar, eu tentei jogar com minha esposa aqui, nossa, nós se batemos um monte, ninguém entendeu direito como jogar, como vencer nesse jogo, né, mas dá pra perceber que realmente é uma complexidade, é bem complexo o jogo, você tem que ficar fazendo uma série de cálculos de números e prever qual que é o número que o seu oponente tá, né, e ver qual que é o número que você tem que pegar pra que ele não vença. Então é bem complexo esse jogo. Agora se a gente for ver, na realidade, esse jogo, ele é um jogo muito conhecido, né, é o famoso jogo da velha. Vocês pensam, não, que isso, isso não é o jogo da velha. Não, claro que é. Faz o seguinte, pega esses números um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove e arranja ele numa matriz de três colunas por três linhas, você vai ver que somados na diagonal, somado na vertical, na horizontal, os três números dá quinze. Então o objetivo do jogo da velha é você formar essa linha na diagonal, na horizontal, na vertical, que dá a combinação quinze. Então é o mesmo jogo, só que no jogo da velha você tem uma técnica de visualização. Você consegue entender melhor como funciona a mecânica do jogo graças à forma como ele se faz entender. Daí você, a partir dessa visualização, você consegue jogar esse jogo inconscientemente. Ninguém fica pensando muito "ah, vou colocar a bolinha aqui e daí ele coloca o xzinho a colar e eu coloco a bolinha". Não, as pessoas jogam totalmente inconscientemente o jogo da velha e aí que tá a graça dele. Se você for tentar responder conscientemente, você não vai conseguir. Vai ficar perdendo tempo e o outro jogador vai ficar "pô, vamos aí, vamos aí, não fique demorando". Então é uma técnica de visualização da informação que é aplicada no jogo da velha, o milenar jogo da velha, e que hoje em dia tá sendo recuperado aí no pessoal da informática. Eles têm uma disciplina chamada visualização da informação que se pretende a mostrar dados abstratos sem uma representação óbvia. Por exemplo, você tem lá uma quantidade de dados imensas sobre um acesso a um determinado banco de dados e você precisa que uma certa determinada pessoa entenda como tá sendo feita o acesso a esses dados nos últimos meses. Então você tem que criar uma visualização da informação, um gráfico que mostre principalmente os padrões entre esses dados, por exemplo, em que época que aumentou muito os acessos, em que época que diminuiu. Você tem que mostrar as relações também, quais pessoas que acessaram em quais determinados horários. Você tem que estabelecer relações e principalmente estimular o pensamento, para que a pessoa possa ter um entendimento melhor daqueles dados. Por exemplo, eu tô falando aqui com vocês, vocês estão ouvindo, mas vocês não estão vendo nada. O pessoal já me falou lá no blog que escutar esses postes aqui, prestando somente atenção neles é muito chato. Claro, você tá na frente do computador e teu monitor não tá mostrando nada. Você só tá ouvindo minha voz. É realmente chatíssimo. Eu, por exemplo, agora tô falando com vocês, mas não tô olhando pro monitor. Ficar olhando pra aquela barrinha de volume crescendo e subindo e descendo, aquilo ali já me encheu o saco já depois dos cinco primeiros segundos que eu ouvi ela. Então eu tenho que ficar olhando pras coisas em volta aqui da minha casa e fingindo que eu não tô falando com alguém. Então, se eu, por exemplo, tivesse usando slides pra suportar o que eu tô explicando falado, vocês estariam provavelmente entendendo melhor o que eu tô dizendo. Mas eu não faço isso porque na realidade isso daria muito mais trabalho. Então é só um audioblog, uma coisa bem rápida pra vocês pegarem a ideia. Quem quiser se aprofundar mais no assunto é só dar uma olhada no posto escrito que vai ter alguns links pra aprofundamento. Mas, eu poderia usar slides, mas eu poderia piorar a situação também. Eu poderia criar uma visualização ruim daquilo que eu estou falando. Como por exemplo se eu estivesse transcrevendo alguns trechos de frases que eu estou falando. Como a maioria dos slides em PowerPoint, o pessoal sempre faz isso. Coloca lá os tópicos das coisas que vai falar e repete. Até leu o slide pra plateia. Isso é uma prática muito ruim porque a plateia tem olhos, ela pode ler o que tá escrito lá. O que o cara tá fazendo é confundir os slides com as notas do palestrante. As notas do palestrante não precisam ficar visíveis pra plateia. Isso é só pra lembrar o palestrante do que ele tem que falar. Não precisa você colocar isso no seu slide pra que as pessoas vejam. Você já vai estar falando isso, a pessoa já vai estar escutando o que você está dizendo, os tópicos. Então o que você vai fazer no slide? Você vai colocar aquilo que você não pode explicar em palavras facilmente. Você vai usar visualização da informação, principalmente usar gráficos, quando você estiver fazendo uma citação, quiser usar as palavras mais corretas e exatas, você pode usar isso no slide, você pode usar figuras, imagens que ilustrem o ponto que você está falando. Isso tudo ajuda a complementar aquilo que você está dizendo, ajuda no entendimento da informação. É o Eduard Tuft, tem um paper que ele escreveu recentemente que fala justamente sobre esses problemas no uso do powerpoint. Mas voltando ao jogo da velha, essa técnica de visualização da informação, ela transforma o jogo da velha de uma coisa desafiante e praticamente insolúvel, como aquele exemplo dos números, da matriz de números, numa coisa muito simples, numa coisa do dia a dia. O jogo da velha você não consegue jogar por muito tempo porque já enjoa, é uma coisa muito chata. Então o que a visualização faz nesse caso, ela transforma o jogo da velha numa coisa fácil, uma coisa muito fácil. Você memoriza lá os padrões de como você pode se mover, você memoriza o que você tem que fazer se o teu oponente colocar duas marquinhas juntas, então fica uma coisa muito simples. É assim que as coisas de rotina elas têm que ser no nosso dia a dia. A gente não tem que ficar parando muito para pensar como que a gente vai usar o nosso fogão, como que a gente vai abrir uma porta, como que a gente vai ler o nosso e-mail. A gente não tem que pensar muito com essas coisas, a gente tem que se concentrar no que realmente importa, se concentrar em fazer a comida, se concentrar em chegar do outro lado, chegar no lugar, na sala onde você quer e se concentrar em ler efetivamente os e-mails, não ficar se mexendo lá nos controles do seu cliente de e-mail, ficar deletando spam, ficar enviando, encaminhando e-mails e organizando, não, isso aqui é só se concentrar no conteúdo. Quanto mais simples for essa tarefa, melhor. Então quando a gente estiver projetando uma interface que seja para uso corriqueiro, que seja uma coisa que o usuário vai usar diariamente, que vai ser muito importante para a vida dele, por exemplo um portal de notícias é um exemplo básico. Esse portal tem que ser muito fácil de usar, você tem que ficar pensando como que você vai navegar por ele, onde você vai encontrar as informações sobre o último jogo de futebol que você se interessa, não, você tem que encontrar isso o mais rápido possível, então tem que ser uma tarefa do dia a dia e que seja de forma inconsciente, seja bem visualizável pela sua mente para que você não fique parando para pensar como que faz para encontrar. Mas é isso pessoal, um abraço para vocês, até o próximo Posting Audio.