Teatro do Oprimido no Design de Interação Então esse mini curso que a gente está tendo aqui na EHC é sobre educação no design de interação Nessa primeira parte eu vou falar mais sobre a questão do teatro do oprimido e como ele se aplica aos problemas e objetos do design de interação Aí depois, quando a gente for passar para a parte prática, eu vou abordar mais as questões específicas de educação Bom, o design de interação é uma disciplina que vem trabalhando com a estética a partir de referências do design gráfico e do design de produto Então se você olhar os trabalhos de design de interação que são muitas vezes referenciados na literatura E principalmente no mercado, que são projetos da Apple, você vai ver algumas estratégias comuns de reprodução de valores estéticos Que você já via antes de existir a mídia digital Então você vai ver, por exemplo, minimalismo, você vai ver simplicidade, você vai ver formas icônicas, símbolos E consistência entre as formas e linguagens que são regidas por manuais, estratégias de branding, de marca e por aí vai Isso aqui é a estética formal e funcional Então uma estética da forma do produto, do produto comunicar alguma coisa a partir da forma dele Então esses cantinhos arredondados que você vê nos produtos da Apple não é por acaso Não é simplesmente por uma questão ergonômica para ele não machucar o seu corpo, se ele tocar no seu corpo Mas é também para dar uma sensação de que esses produtos são produtos informais para você poder utilizar no seu dia a dia Estar mais próximo de você, além de ter essa questão ergonômica Então tem o lado funcional aliado à estética e o lado formal Porém o design de interação inaugura um novo tipo de estética que é a estética relacionada à interação Relacionada à maneira como você modifica o produto e como o produto modifica você Um exemplo de estética da interação bem perceptível é o gesto de pinch Que você faz para aumentar ou diminuir, fazer zoom ou diminuir o zoom em uma foto ou no mapa Esse gesto, embora seja algo bem simples e intuitivo, ele não existia antes enquanto um gesto computacional Foi um projeto que criou essa relação entre você fazer esse movimento e você aumentar o zoom Hoje em dia crianças, bebês, fazem esse gesto de maneira natural, sem você nem precisar ensinar Porque ela vê fazer, vai lá e reproduz E aquilo ali fica sendo uma parte do conhecimento daquele bebê Que aquele bebê quando vai em uma revista impressa vai fazer esse movimento aqui Porque está reproduzindo essa gestualidade, que é uma gestualidade muito fácil de ler Mas é um tipo de estética que tem a ver com o tempo Não tem a ver só com a forma, com a função Então tem muita referência do design de interação na questão das animações, dos filmes e das artes que tem a ver com o tempo Como por exemplo o teatro Quem fala um pouquinho sobre essa estética da interação é o professor sueco Jonas Lundgren Tem alguns artigos sobre esse assunto, pouco conhecido aqui no Brasil Mas muito interessante o trabalho dele em design de interação Então como eu vinha falando, essa estética da interação tem a ver com as artes de performance As artes que envolvem o tempo Porque quando você projeta uma interação, você não vê a interação acontecer antes que alguém realmente interaja Você tem apenas uma proposta de interação E quando as pessoas interagem é que essa estética se manifesta Então se você tentar descrever o gesto pinch sem você se mover estaticamente Você não tem como mostrar isso Inclusive é uma das grandes críticas que se faz aos produtos da Apple, em especial do iPhone Como é que você faz para alterar o calendário da visualização mensal para a visualização semanal? A maioria das pessoas não sabe que é fazer isso aqui A hora que você fez isso aqui, já vira É um gesto, e não está escrito em lugar nenhum, não tem ajuda, não tem uma dica de como fazer isso É apenas se você ver outra pessoa fazer que você vai reproduzir esse gesto Por que? É uma decisão da Apple de enfatizar a beleza da gestualidade Eles preferem que as pessoas não saibam que tem essa informação, que não seja acessível Do que ela descobrir, ela não saiba, mas assim mesmo ela descobre através de uma outra pessoa E algumas pessoas não vão descobrir nunca Criando também uma diferenciação, uma distinção entre pessoas que sabem como usar os recursos que o iOS oferece E pessoas que não sabem Ele dá uma certa valorização sobre aqueles que conhecem os segredos do iOS Uma coisa engraçada, como a gente falou do WCAG aqui, das diretrizes Uma das orientações, esse é o 78, um dos itens é justamente a orientação Em que você não deve projetar ou pensar em orientação do device de acordo com a funcionalidade A não ser que seja imprescindível para o uso Nesse caso não é imprescindível Não, não é imprescindível, a decisão da Apple é meramente arbitrária Eu nem acho que é funcional, mas ela cria um segredo Em outros aplicativos tem esses segredinhos também Por exemplo, voltar, como é que você faz o voltar na iPhone? Sacode Não está escrito em lugar nenhum, você precisa ter a interação com alguém que tenha Ver alguém fazendo, porque você está sacudindo o seu telefone? Eu chamo esse tipo de efeito que acontece na interação pós-projeto de performance emergente Na minha tese de doutorado Assim como no teatro você tem uma performance que é diferente em alguns detalhes da maneira como é escrito o roteiro Você tem na execução do gesto, da interação, uma divergência Porém, no caso do digital, a divergência é muito maior do que no teatro tradicional Embora os designers de interação projetem vários fluxos Pensando como os usuários deveriam ir de uma tela para outra São roteiros, equivalente a um roteiro Essa analogia muito bem desenvolvida pela professora Brenda Laurel Nesse livro aqui, que é um clássico pouco lido aqui no Brasil de computador como teatro Vocês já viram? Deixa eu só pegar minha canetinha aqui Opa, desculpa Brenda Laurel é uma professora e também pesquisadora e empreendedora Muito bacana, tem uma história muito legal Não sei se ela já veio ao Brasil Ela é uma mulher pioneiríssima na área de interação no computador Inclusive ela que conheceu o termo de experiência do usuário, não foi o Dono Norman A maioria das pessoas mencionam o Dono Norman como criador desse termo, mas ela usou antes dele Ela faz essa analogia que a interagir com o computador é como se você estivesse em uma peça de teatro Porque o que interessa no teatro é que tenha significado as ações que as pessoas estão tendo Para o computador também, que tenha significado para você, que está usando, o usuário Assim como tenha significado para o computador, que ele consiga entender a sua ação como sendo algo computável Porém na mídia digital, diferente do teatro, a performance não precisa necessariamente seguir o roteiro Então as pessoas podem sair do carrinho de compras e desistir da compra Para o desespero dos designers e marqueteiros que querem aumentar a taxa de conversão Isso aqui é uma tela do Google Analytics, mostrando que 80% das pessoas vão na página inicial desse site E desistem, vão embora, não encontram nada que tenha valor ali E dificilmente apenas uma bem pequena porcentagem vai chegar ao final, comprar o produto e realmente converter Por quê? Porque as pessoas têm a liberdade de seguir outros roteiros Então nessa mídia digital, os atores também podem criar os seus próprios roteiros E consequentemente as suas próprias estéticas da interação Aqui eu estou trazendo um exemplo de uma estética que cresceu bastante nos últimos anos Típica da internet, que é o Vaporwave O Vaporwave tira um sarro, uma onda de elementos gráficos que existiam no começo dos anos 90 No final dos anos 90 e começo dos anos 2000 Com uma série de referências bizarras para mostrar que a internet não faz sentido A internet é um lugar da zoeira, é um lugar onde é permitido você fazer bullying a outras pessoas E a internet é o lugar onde estão as pessoas de extrema direita Curiosamente o Vaporwave acabou se tornando uma estética da extrema direita E utilizado inclusive na campanha de eleição do nosso presidente Mas vamos voltar para o design de interação Mas isso é importante, por que a estética Vaporwave acaba sendo utilizada por um movimento político? Porque toda estética tem uma ética em pista A palavra ética está dentro da estética Então quando se discute estética no design, você também está discutindo ética Só que isso pode estar implícito, não está muito claro Então quando um designer diz "isso aqui é bonito" Ele não está fazendo apenas um julgamento de valor estética Ele está fazendo um julgamento de valor moral também Isso aqui é bonito na nossa sociedade porque as pessoas acham isso bonito Então é um modo de viver em sociedade Você não vai falar "uau, você está viajando, isso é filosofia" Não, isso é dia a dia A gente vai lá e escolhe um animoje para representar as nossas emoções Isso é uma das grandes inovações últimas da Apple, esses animojes Na verdade isso não é uma grande inovação Porque você utilizar uma máscara já existia esse tipo de interação há centenas de anos O carnaval de Veneza é um exemplo mais clássico Mas isso se espalhou pelo mundo todo O uso de máscaras para você esconder o seu rosto e demonstrar uma outra emoção diferente Ou para você mostrar uma emoção mais exagerada Inclusive o símbolo do teatro são as duas máscaras Uma feliz e uma triste Então a utilização de máscaras é fundamental para a cultura Mas curiosamente quando vai para o digital as pessoas perdem essa referência E acham que animoje é uma coisa que vem do nada Que não tem história, que é uma invenção da Apple Na verdade a Apple simplesmente está colocando alguns elementos novos Porque com certeza uma máscara que se altera de acordo com a sua movimentação do rosto É uma novidade para a história das máscaras Mas a coisa que realmente a Apple não traz, não discute Que a maior parte da discussão em design de interação e interação no computador não discute É que essas escolhas por certas interações Elas tem a ver com a moral de um grupo social E não a ética dos direitos humanos do mundo inteiro É a moral daquele grupo Então aquele grupo vai achar que aquilo ali é correto, bonito, é legal Olá, quer fazer algum aviso? Eu tenho que pensar as três, entre a ética e a moral Então é importante enfatizar essa diferença entre ética e moral Ética é universal, é você discutir coisas do tipo Quando que se justifica matar uma pessoa dentro de uma sociedade Agora moral é você discutir se jogar uma bituca de cigarro nessa rua aqui é uma coisa moral Então ela é mais específica a moral E ela vai refletir o interesse de um grupo dentro de uma mesma sociedade Uma mesma ação pode ser considerada moral por um grupo e amoral por outro grupo Então a ética é uma questão mais filosófica Já a moral é uma questão do dia a dia, de cotidiano, de escolhas, de ações O Pierre Bourdieu tem um livro muito interessante que todo designer deveria ler Que é o A Distinção, que diz o seguinte Ele fez um estudo sobre os gostos que a sociedade francesa tinha Nas diferentes estratos sociais E aí ele via, por exemplo, o que as pessoas mais gostavam de fazer quando elas tinham tempo livre E aí na classe que tinha menor salário, eles preferiam ir pro bar, bater um papo Na classe mais alta eles preferiam jogar golfe E aí você perguntava qual o seu esporte favorito, qual você mais gosta Ah, eu gosto de golfe Aí outra pessoa, eu gosto de ir pro bar E aí a pessoa fica pensando, isso é uma escolha minha individual Eu gosto de feijão com arroz porque eu gosto de feijão com arroz Porque eu sempre gostei de feijão com arroz Mas na verdade você gosta de feijão com arroz porque você cresceu numa classe social Onde comer feijão com arroz é uma coisa considerada gostosa Então existe uma indicação em não só gostosa, mas também saudável Então isso é uma decisão moral Então esse livro aqui ele mostra que tudo aquilo que a gente acha que é bonito, que é gostoso Que a gente acha que é uma escolha pessoal, na verdade é uma escolha que a gente pode estar seguindo Apenas porque é um grupo social que gosta daquilo Isso é bem tenso de você ler, porque você começa a pensar, então o que eu sou? O que eu realmente penso a respeito É mais ou menos isso, na verdade ele diz o seguinte Tem variedades, por exemplo, tem pessoas que gostam de coisas esquisitas dentro do grupo social dela Ou seja, tem gostos desviantes E tem pessoas também que quebram as barreiras entre classes e convivem com pessoas de diferentes classes Mas nunca há pressão de se confortar quando você tem um gosto desviante Exatamente, ele vai falar que existe uma certa pressão das pessoas que estão dentro daquela classe Para você gostar das mesmas coisas que elas gostam, até para você curtir junto com elas É, a gente começa a entrar até numa história filosófica, não é? Na verdade, todos nós nascemos ali ainda com uma folha em branco A gente vai adaptar a nossa vida àquilo que alguém nos projeta Seja a escola, isso, você vai ser curintiano, você cresce com aquilo na cabeça E acaba se tornando, se você tivesse em outro lugar, você vai fazer uma boa reflexão E aí, aqui tem alguma evidência de que essa questão da distinção que o Bourdier identificou na sociedade francesa Na metade do século XX, ainda é válida hoje em dia Porque você tem correspondência entre classes sociais e escolhas de emoji Aqui você vai ver na coluna da esquerda os emojis mais utilizados por pessoas que tem essa cor de pele E aqui você vai ver pessoas que tem essa cor de pele Você veja uma diferença Aqui, pessoas que tem a cor de pele mais clara Elas vão ter emojis que estão relacionados a entretenimento, a um amor, coisas boas, só coisa boa E quem tá aqui no último, o emoji mais utilizado tem a ver com luta Tem a ver com dinheiro, questão do dinheiro Ou cadeado, acesso, coisas que estão trancadas Ou até mesmo a bateria, aí dá a indicação de que essas pessoas tem que recarregar o seu celular com frequência Porque não aguenta bateria, provavelmente é um equipamento que não é top de linha E você também tem correspondência de gênero Então dá pra ver que homens e mulheres utilizam emojis bem diferentes Então essa escolha do digital também é, o gosto digital também é, segue a classe social E esconder essa questão do gosto através de uma estética faz a questão ética que tá embutida parecer uma questão meramente de escolha individual E o problema disso é que essa escolha individual quando ela é reproduzida em larga escala, ela gera exclusões do tipo Tinder Mulheres negras, homens negros, pessoas asiáticas, principalmente em países que tem uma certa xenofobia contra asiáticos LGBT, essas pessoas entram no Tinder e elas são constantemente negativadas por causa do gosto social Essas pessoas não estão dentro dos padrões de beleza mais cultivados dentro das classes que utilizam o Tinder Então essas pessoas sentem que estão no lugar errado e elas não conseguem ter o mesmo número de oportunidades de parceiros Que tem as pessoas que são brancas, loiros, com aparência caucasiana E aí acontece de novo algo que acontece em outros contextos que não é o digital, que é a opressão Ou seja, você negar que essas pessoas fazem parte da sociedade, que elas podem se desenvolver tanto quanto uma outra pessoa que não está dentro desse grupo social Então a estética da interação ela pode esconder, reafimar e manter opressões entre grupos sociais Então esse movimento aqui, esse gesto que o Tinder faz, swipe left, swipe right Que faz você definir se você gosta ou não gosta de uma pessoa que você vê O Tinder vai te mostrando fotos de pessoas uma atrás da outra e você vai decidindo se você está interessado ou não com um mero gesto desse tipo Jogando a pessoa para esse canteio ou trazendo ela para perto, se por acaso você trazer uma pessoa para perto e a outra pessoa também te trazer para perto Vocês vão ter a oportunidade de conversar e talvez desenvolver um relacionamento Mas o que acontece é que isso parece uma escolha individual, quando eu faço swipe parece que eu estou escolhendo apenas pela minha própria desejo Mas na verdade eu estou muitas vezes rapidamente utilizando, às vezes sem pensar, alguns critérios básicos de exclusão social Que a minha classe social faz com frequência Então se a minha classe social não gosta de negros, é bem provável que eu também não vou gostar de negros Mas é obviamente que existem exceções, como a gente discutiu antes, de pessoas que convivem com grupos sociais distintos O que é uma relação de opressão? Então vamos para uma definição clássica do Paulo Freire Ele tem aquele livro "Pedagogia do oprimido" que foi bastante influente hoje em dia Tem muita gente questionando o Paulo Freire, dizendo que ele na verdade é uma ideologia comunista Mas são pessoas que não leram o livro dele, que explica algumas coisas muito importantes do processo educacional Que é como a educação se relaciona com a opressão E como historicamente a própria educação tem uma relação de opressão que tem se construído Que é a tal da educação bancária, que é o tema principal desse livro, que vai falar o seguinte A educação se construiu a partir do século 19, as escolas de ofícios, como sendo uma oportunidade Para depositar um conhecimento na cabeça dos estudantes como se fosse um banco Se você tivesse uma conta de banco para o estudante, você coloca um dinheirinho lá, que na verdade é o conhecimento Pode ser que esse estudante use esse conhecimento, pode ser que não use, como se fosse uma poupança para o futuro Só que o problema é que esse conhecimento não tem relevância muitas vezes com a realidade daquele estudante E por isso aquele estudante não vai ficar com aquele dinheiro depositado, entre aspas Simplesmente aquilo ali não vai se conectar com as experiências prévias E o estudante vai considerar aquilo irrelevante e não vai aprender aquele assunto Então ele faz uma proposta muito bacana que vai originar várias pedagogias críticas, dentre elas o teatro do oprimido Que parte do interesse, do contexto de vida daquele estudante Então ao invés dele aprender alguma coisa que tenha a ver com a sociedade europeia E talvez um dia se ele for para a Europa ele utilize aquele conhecimento Ele vai aprender algo sobre a sociedade onde ele está vivendo agora É esse principal conhecimento que o Paulo Freire vai passar nesse livro Então não é nada de ideologia comunista como algumas pessoas a criticam Mas especificamente o conceito de opressão, ele é utilizado às vezes também para falar sobre conflitos de classe Por isso que às vezes as pessoas pegam só esse pedaço da teoria e esquecem o resto Por exemplo, quando você fala que existem grupos sociais privilegiados que tem mais recursos financeiros que outros grupos sociais Por exemplo, ricos versus pobres Então os ricos por que eles são privilegiados? Porque existe uma lei que permite a transmissão de bens hereditários Quando um rico morre ele passa com seus filhos e os filhos continuam ricos Então os filhos ricos vão ter uma vantagem para quem não tem essa riqueza toda Isso não é uma questão a ser discutida, isso é um fato, é uma questão social que acontece Agora como a gente lida com isso? Se essas pessoas que utilizam esse privilégio para oprimir os outros ou não? Daí depende, se elas utilizarem elas vão fazer parte de grupos de opressores Por exemplo, pessoas que são ricas que se encastelam na sociedade, que vivem em lugares totalmente fechados Não interagem com pessoas de outros grupos sociais, que não gostam dessas pessoas Que acham que não deveriam existir essas outras pessoas Porém, a sua riqueza, o seu trabalho, a sua fortuna só existe porque essas pessoas oprimidas estão ali diariamente Trabalhando e mantendo seus negócios funcionando, ou a casa limpa Ou as diferentes oportunidades de emprego que os privilegiados oferecem aos desprivilegiados Então nessa relação que pode ser uma relação de trabalho, pode acontecer uma opressão do rico Questionar a capacidade de desenvolvimento do pobre, achar por exemplo que a sua empregada doméstica Não é capaz de fazer uma conta de matemática, não é capaz de escrever o português bem escrito Porque ela é pobre, porque ela é negra, ou porque ela é mulher, ou porque ela é mulher negra E aí subestima, não estimula, e aí de repente aquela empregada quer fazer um curso "Ah, por que você vai fazer um curso? Não vale a pena você fazer esse curso, porque a gente vai precisar de você no final de semana" "Ao invés de você sair para esse curso, vem aqui trabalhar, você tem que trabalhar mais, eu te pago uma área extra" E aí desincentiva essa pessoa desprivilegiada a se desenvolver E essa pessoa não sai dessa condição, e nem as filhas dessa pessoa que saem dessa condição Porque vão ter que trabalhar de novo no mesmo trabalho E aí você tem uma situação muito próxima da escravidão, ainda até hoje no Brasil Que são o caso das empregadas domésticas que são exploradas muitas vezes sem pagamento Sem um registro em carteira, sem os direitos que elas deveriam ter A gente ainda tem isso hoje no Brasil Porém, essas pessoas desprivilegiadas podem reagir, elas podem criticar, elas podem se organizar Então algumas cidades têm sindicatos das empregadas domésticas Justamente para atender essas mulheres que não sabem dos direitos ou querem saber dos seus direitos Querem saber como que faz para assinar a carteira, o que tem que pedir para o empregador e por aí vai E ao fazer isso elas conquistam de volta os seus privilégios, quer dizer, as vantagens E aí fica menos desprivilegiado Esse basicamente é o esquema da relação de opressão Aqui eu usei o exemplo da empregada doméstica, usei a opressão de classe Mas existem também outras opressões como opressão relacionada a gênero, raça, etnia E várias outras que a gente vai abordar daqui a pouco No caso da interação lá no computador e do design de interação Existe uma opressão também que eu estou construindo junto com alguns pesquisadores lá na UTF-PR E aí eu vou falar um pouquinho sobre essa definição, que opressão que é essa Mas eu vou começar mostrando um exemplo bem cotidiano Quando uma pessoa sente que interage de maneira feia com o computador É porque ela faz parte de um grupo desprivilegiado Ou então porque seus colegas fazem parte de um grupo privilegiado E ela não está agindo de acordo com o grupo privilegiado Então se ela está utilizando o iPhone e ela faz alguma besteira com o iPhone Poxa vida, você tem dinheiro para comprar um iPhone, como é que você não sabe usar um iPhone? Ou se ela não tem um iPhone e está usando o Android e faz uma coisa e está se batendo Aí você que tem um iPhone você chega e fala, fica à vontade Chega e fala assim "ah, você deveria ter um iPhone, porque o iPhone é muito mais fácil de fazer isso" Mas a pessoa não tem o dinheiro para comprar um iPhone que custa às vezes cinco vezes mais do que um Android Então essa questão da interação feia que faz as pessoas se sentirem burras Que a gente na interação lá no computador tem lutado há muito tempo já Uma história de luta para que as pessoas não se sintam feias ou burras quando usar o computador Ela não é uma mera questão técnica, ela também é uma questão social Pelo menos é isso que o teatro do oprimido traz, o insight que ele traz Quando a gente começa a trabalhar com interação lá no computador E aqui tem uma evidência, um exemplo concreto disso acontecendo Antigamente, uns 10 anos atrás mais ou menos, eu era um dos professores do Instituto Faber-Ludens Que era uma ONG que fazia um movimento bem bacana em design de interação A gente postava um monte de vídeo no YouTube de experimentos que a gente fazia em sala E um desses vídeos era sobre um teste de usabilidade que a gente fez em uma avaliação heurística Em vários eletrodomésticos, dentre eles o que mais incomodou os usuários do YouTube Era uma balança eletrônica, e quando a gente está fazendo o teste nessa balança eletrônica A gente está tentando se comportar como um usuário que não sabe como usa aquela balança eletrônica Que não leu o manual, então a gente vai fazer besteira Porque a gente vai testar, olha aqui, daí vou pisar em cima, não, mas não está aparecendo o número que ele estava esperado O que significa esse número? É o meu peso? É o meu índice de massa corporal? E aí a gente não sabia, a gente está se batendo no vídeo para descobrir como é que funciona O projeto da balança é muito ruim, mas a gente colocou no vídeo no YouTube E hoje em dia é um dos vídeos mais vistos no meu canal, tem 30 mil visualizações E a maioria das pessoas que vê fica revoltadíssima com o que está vendo E fala "Seus burros, como que pode vocês não saberem como usar essa balança? Todo mundo sabe né?" Olha aqui, "Quanto imbecil avaliando produto sem o menor conhecimento do assunto Ao menos deveriam ler o manual do produto e saber onde começar O imbecil não sabia que tinha que tirar a meia, senão os sensores não conseguem fazer a leitura de medidas de índice de gordura, massa óssea Relacionados aos recursos que a balança oferece" Então veja, onde que está escrito que tem que tirar a meia? Na balança não estava escrito, nem no manual estava escrito isso Mas ele fala que é imbecil, por que ele fala que é imbecil? Porque é óbvio que você tem que tirar a meia, porque ele já esteve em um grupo social Um grupo social onde ele viu alguém tirando a meia, colocando aquela balança Porque aquela balança faz parte do cotidiano daquela pessoa, é um objeto banal Enquanto que para essas pessoas que estavam investigando isso na época do vídeo Não era, nessa época era pouquíssima gente que utilizava essa balança Também tem essa escala temporal de uma coisa que na época era novidade, agora já é banal Todo mundo tem, pelo menos na classe social do Fabiano Carvalho tem E é curioso também, você ter que ler o manual para usar um produto Dentro de IHC, dentro de design de interação, a gente bate nessa tecla que não deveria precisar ter manual Ou pelo menos o manual deveria ser uma questão que você iria consultar depois Porque senão você faz um sistema extremamente difícil de usar Faz o manual e diz "ah, está pronto, está aqui, está fácil de usar, é só ler o manual" E o manual tem 80 páginas e tu sabe que as pessoas daí não lêem Aí fica um sistema que não atende as necessidades Mas para esses usuários do YouTube nada disso importa Então a estética de interação, inclusive essa interação que os usuários do YouTube criaram Criando uma meta-linguagem aqui, comentários agressivos no YouTube viraram hoje uma coisa comum Não é só o meu vídeo que tem esses comentários agressivos, isso é uma coisa geral E não era assim antes, quando eu comecei no YouTube, desde o começo, praticamente, em 2004 Acho que eu já estava colocando coisas lá, as pessoas não ficavam xingando umas às outras no YouTube Isso se tornou um hábito comum que não foi moderado corretamente pelo YouTube Eles deixaram isso crescer e hoje nós temos uma estética do opressor Entrar no YouTube é entrar para você receber porrada Já existe esse ambiente, digamos assim, essa expectativa Por isso também que vários desses grupos de política extremista e agressiva Se utilizam no YouTube para ganhar maior audiência Porque ele permite que essas interações aconteçam Mas agora trazendo para outros casos que não sejam no YouTube Casos cotidianos como a interface para você comprar passagens na Gol Se você for lá, hoje em dia, espero que eles tirem isso logo Tem o Dark Pattern, que é terrível Dark Pattern é uma estratégia de design que esconde alguma informação De maneira que engane o usuário para que ele faça alguma coisa que ele não quer fazer É uma técnica de persuasão muito baixo nível, por isso é chamada Dark Pattern Ela não é uma persuasão ok, não é uma publicidade que tenta seduzir a pessoa Ela esconde alguma informação através de um truque de interface Que o designer pode sempre dizer "não, mas a informação está lá, a opção está lá" Só que ela está de uma maneira desprivilegiada, escondida Ou com um significado que não é aquilo que o usuário espera Por exemplo, se você quiser comprar, nessa interface aqui Quiser comprar ou marcar um assento sem pagar a mais Onde você clica? Você sabe me dizer? Na Gol, você manda o papai marcar o assento online e você paga Você foi vítima do Dark Pattern, desculpe Pode, pode, mas a Gol fez você achar que não podia Eu nunca fiz a coisa não marcar o assento Mas aí você pode, só que você tem que esperar o check-in Você pode marcar o assento no dia do check-in, você pode fazer isso Não pode marcar o assento antes, com antecedência Mas no check-in pode Essa informação que eu estou te dando agora poderia estar aqui, certo? Não marcar o assento e deixar para marcar no check-in Mas eles fazem de tudo para você marcar o assento de antemão e ter que pagar por isso No caso 15 reais Se você quiser seguir essa opção, você tem que clicar em fechar O que não tem nada a ver com o significado da ação Fechar é fechar, cancelar é voltar Mas na verdade fechar aqui é uma progressão na interface Essa interface está extremamente antiética Eu espero que se os designers da Gol estiverem ouvindo essa gravação Por favor, mudem isso porque está feio As outras companhias aéreas não estão pegando tão pesado nos Dark Patterns É um dos piores que eu já vi nos últimos anos E não precisa disso, eu imagino, para a empresa ser lucrativa Como você descobriu? Pessoas, para não ser que nem tentar marcar? Isso, eu sei que é um Dark Pattern Eu tenho essa formação, já vi vários Dark Patterns Então não cai fácil um Dark Pattern Mas eu tenho certeza que a maioria dos usuários não estão acostumados a fazer isso A tentar descobrir um jeito de fazer A pessoa vai seguir o que a interface está propondo Tem uma questão bem engraçada, eu sempre marco Confirmo o assento agora por conta disso Mas no meu caso, eu sei da existência Só que eu marco por conta da localização Porque da forma como está, a maioria dos usuários Que vão marcar o assento, eles vão marcar com antecedência Consequentemente, na hora do check-in, talvez não tenha o local que eu gostaria Isso, é verdade Mas aí é uma escolha, eu estou pagando por isso, conscientemente É uma escolha que está criando um privilégio para você Quem tem R$15,00 a mais para pagar por uma passagem, ganha um privilégio no avião Só que não está claro este viés Exatamente Esse é o problema, tratar diferentes pessoas que tem R$15,00 a mais ou não O que não deveria ser uma questão importante para a Gol Fred, só para comentar A publicidade de uma forma ou outra tem um estando de auto-revolução Sim Quando a publicidade faz alguma coisa anti-ética A própria área de publicidade desce do polo Eles mesmos se organizam no processo de auto-revolução E esse processo não é atingido dos dark patterns Faz muito tempo que eles passam por isso É que eu acho que a gente precisaria ter ou novas organizações da profissão Relativa à interação com o computador, design de interação e os experience Ou as organizações existentes como a UXPA, a IXDA Ou as outras eventualmente que estão por aí Delas tomarem esse papel político Porque elas até hoje não se posicionaram politicamente É assim, agora que começou para mim A primeira vez que eu comecei a ver essas associações profissionais da nossa área se manifestando Foi primeiro ano passado, eu vi a IXDA de Minas Gerais se posicionando a respeito Da questão das eleições, do processo eleitoral De falar que existia uma candidatura presencial que era contra os princípios do design de interação De inclusão de pessoas diferentes E agora ontem eu vi uma postagem da XDA Santiago Comentando o toque de recolher que o governo chileno impôs à população chilena Dizendo que eles, como design de interação, eram contra essa forma de violência E eu achei muito interessante E foi um dos primeiros momentos que essa profissão está se percebendo que tem um papel político Agora, está atrasada, eu diria Está atrasada Nossa, acho que a gente como profissional tem que fazer esse papel Tem que fazer Cobrar esse papel É, essa desculpa E é um abuso mesmo, é um abuso antigo Pois é Eu acho que o proponho nunca foi ratificado desse tipo de abuso Mas é que está, valeria a pena a gente também se organizar e fazer essas notificações Para os investidores, os usuários e tudo mais Eu acho que fica como uma ideia também a partir desse mini curso E também a gente trazer essa questão também como uma questão de pesquisa Trazer essa questão como uma questão de palestra Que a gente vai comunicar para as pessoas Que existe também um lado negro dessa profissão É, porque se a gente não tem isso, nós que estamos formando Nós como formalidade, que estamos formando É, exatamente Esse design Se você não discute Se você não discute a questão ética Um profissional de experiência usuária que vai trabalhar na Gol, por exemplo Vai aceitar fazer essa interface Ou porque ele acha até legal Isso Ou porque ele não parou para pensar Não percebeu que ele está reproduzindo o Dark Pattern (risos) Ou como eu venho discutindo bastante com meus alunos Eu crio situações do tipo, dilemáticas mesmo E se um cliente vem e fala Não, eu quero Dark Pattern Eu quero aumentar minha taxa de conversão Você vai ter que descobrir um jeito Ou então você vai ter que fazer do jeito que eu estou falando Porque eu sou seu chefe, estou te pagando o seu salário E o que você faz? Como que você reage? A gente cria essas situações com o teatro Aliás, adiantando um pouco a parte pedagógica Spoiler Mas vamos voltar então para a gente finalizar essa apresentação Aqui tem um outro exemplo, acho que mais tenso ainda do que esse Dark Pattern Porque no Dark Pattern a diferença entre grupos sociais É a questão de dinheiro Se você tem 15 reais ou não tem E se você quiser ter 15 reais, você consegue Trabalhar um pouquinho mais, você consegue 15 reais Mas se você for uma pessoa negra E você não tem como deixar de ser uma pessoa negra Você não tem como trocar de corpo Inclusive, a não ser que você seja o Michael Jackson Mas mesmo o Michael Jackson ainda manteve algumas características E teve a sua história Enfim Não é considerado uma opção boa Você ter que mudar quem você é Ou você esconder quem você é Na verdade isso cria uma sensação de extremo desconforto Então aqui você tem o presidente Obama Ex-presidente dos Estados Unidos Utilizando o filtro do FaceApp Que embeleza as pessoas Esse filtro era para embelezar, para tornar mais bonito E o resultado é que o Obama fica com cara de branco Ele embranquece o negro quando ele utiliza esse filtro Então eles lançaram esse filtro As pessoas negras utilizaram esse filtro Ficaram revoltadíssimas, criticaram E alguns dias depois a empresa FaceApp teve que tirar o filtro do ar Ou corrigiu o algoritmo para que esse tipo de coisa não acontecesse Pediram desculpas públicas, o que era o mínimo que eles podiam fazer Mas por que eles não prestaram atenção nisso antes de lançar para o público? Porque não tem pessoas negras na equipe do FaceApp Porque se tivesse um negro ele ia falar isso Nem jovens, né? Pois é É porque também o FaceApp acabou entrando em diversas discussões polêmicas também A questão do armazenamento das informações Se eu não me engano a hospedagem, a localização oficial da aplicativa na Rússia Então eles tinham algumas questões que não ligavam mesmo Para questões jurídicas Enfim, acaba envolvendo também, mas é real Se não tem ninguém que interesse em falar, pra acertar Pois é Então eles vão reproduzindo apenas os padrões de beleza Que como a gente já viu, os padrões estéticos também recarregam preconceitos de classe Ou preconceitos de raça, né? Nesse caso E aqui o caso mais clássico de estética do opressor Que são as telas de erro, de alerta E que tem aquele sonzinho Vocês lembram do sonzinho clássico? TAM! TAM! Quando você ouve o TAM dentro de um laboratório de informática Você sabe que alguém fez uma coisa errada E que aquela pessoa se ficar ouvindo TAM! TAM! TAM! toda hora Ela vai sentir vergonha Porque esse barulho TAM, ele revela para os colegas que estão em volta Que essa pessoa, ela está tendo uma interação feia E o TAM ele vai te dizer Você ou seu programa executou uma operação ilegal e será fechada Antigamente eles usavam palavras como abortar Era uma palavra dos anos 90 Abortar, inválido Que eram palavras que... E o fatal Palavras muito tensas que faziam as pessoas se sentirem muito mal, né? Por exemplo, esse abortar teve vários processos judiciais contra a Microsoft De mulheres que se sentiram lesadas Porque elas passaram por um processo de aborto traumático E aqui a interface colocava essa palavra sem nem pensar Porque não tinha mulheres pensando nisso lá dentro da equipe da Microsoft E é isso Fica à vontade, hein? Bora Então, a estética do opressor faz o oprimido achar que ele é culpado Ou que a opressão é uma questão de mera opinião Então tem um exemplo bem curioso de tentativa de assédio De assistentes virtuais que atendem por voz Siri, Alexa, Cortana e o Google Home Esses pesquisadores falaram palavrões ou insultos relacionados ao lado feminino desses personagens E viram como eles reagiam Se eles aceitavam o insulto, se eles devolviam o insulto Ou se eles aceitavam ou até tinham um resultado positivo E aí, olha só que curioso, né? O Google Home finge que não tá entendendo a pergunta A Siri tenta sair fora Uma saída francesa, digamos assim Mas em alguns casos dá umas respostas positivas Do tipo que transforma aquele xingamento ou aquela cantada Numa coisa positiva Quando na verdade ela tem um fundo machista E aí, hoje em dia, a Siri, especificamente tirando um exemplo aqui Qual a sua opinião sobre o direito das mulheres? É a sua opinião que conta Quando a pessoa pergunta isso, ela tá falando dessa história de opressão das mulheres Porque os direitos das mulheres surgiram pra evitar que a opressão contra as mulheres O machismo se disseminasse e fosse uma coisa considerada normal na sociedade E aí a Siri hoje diz que não, é uma questão de opinião Você pode ser contra ou a favor dos direitos das mulheres É isso que ela tá dizendo Direito não é uma questão de opinião Direito é uma questão de ética Como a gente tava discutindo, uma questão mais ampla da sociedade Não é uma escolha que um grupo social faz É uma escolha que uma sociedade como um todo faz Você imagina a empresa nesse momento se a Siri der uma opinião sensata como essa? Imagina os processos de fim da empresa e o que que ia acontecer? Bom, eu acho que a Apple tá comendo bola Porque ela em vários outros momentos se posicionou explicitamente a favor da luta pelos direitos humanos E nesse caso ela iria responder qual a opinião dos direitos dos homens Eu acho que as mulheres tem que se organizar e por aí vai Seria uma resposta mais correta A Apple faz isso em outras situações Eu acho que aqui comeram bola (Inaudível) Ah, olha aí Tem essa também Como a opinião fosse mais importante do que direito, né Tem outra coisa também A Siri, ela é por padrão uma voz feminina E todos os outros são vozes femininas, por padrão Então, se você pergunta qual a opinião dos direitos das mulheres Não é uma pergunta tão sem sentido assim Porque ali tá sendo reproduzido a posição da mulher como uma assistente Né Por que que eles escolheram a voz feminina como padrão? Porque na nossa sociedade, por padrão, as mulheres é que atendem E isso não é uma posição normalmente dentro das empresas de grande prestígio Normalmente quem tá atendendo tem os menores salários Quem tá lá em cima da gestão, quanto mais longe do usuário Eu costumo dizer, mais você ganha Isso é o que gera, é uma das, digamos assim Origens econômicas de por que a experiência do usuário é tão desprevilegiada Porque quem tá na frente do usuário, quem tá diretamente interagindo Não recebe um benefício por isso, um incentivo E agora por fim, pra coroar essa discussão toda Só uma coisa, só porque veio na minha cabeça, desculpa Não presumei nada a ver Alguém que tem robô aqui na casa Ah, minha esposa fez questão de comprar um robô É muito bom Eu gosto muito da gente falar "foda" Mas é, eu tava na sua casa, eu chamo de "arrobô" "Arrobô" "Arrobô" Ela é estranha Pois é E ela é muito boa Mas ela também tem voz feminina, né? Pelo menos o meu lá de casa tem Ela não fala Mas ela é "arrobô" Ela desde o primeiro dia, entrou na nossa casa Era "arrobô", a gente chama de "pôsse" Por causa do Jackson Mas, nunca a gente parou pra pensar no "pô-pô-pô" Quando é o robô que calcula lá, né? Que a gente interage, que calcula as coisas lá no projeto que a gente tá fazendo É mágico Mas é bom, né? Por padrão, né? E é isso que eu fico impressionada Não consigo me dar É, lá em casa a gente teve dois O primeiro não falava, daí a gente chamou de "arrobô" Aí veio o segundo, a gente começou a chamar de "arrobô" Mas quando ligou, aí já começou a falar E aí falou em voz feminina Foi difícil dizer que era o robô Mas eu não sei porque deveria ter também a tonalidade de voz feminina Poderia ser... Pra um robô de limpador, você ter um gênero, não sei se faz tanta diferença Tem algumas situações que você pode perguntar Tipo, eu tô configurando Primeira vez que eu tô utilizando um aparelho Eu vou configurar se ele não conversa com a voz E ele aparece ali E dá as opções Qual o tom de voz que você gostaria E também tons de voz que não sejam mulher ou homem, né? Porque também existem muitos tons, né? Existem muitos outros tons de voz E a gente tá acostumado a destruir Na verdade a gente vai pro estereótipo, né? Do feminino e masculino Porque existe uma variação enorme, né? Se você vai cantar, por exemplo Você vai ver que tem contralto, soprano, barítono, não sei o que, não sei o que lá Que eu nem sei direito Mas são uma variedade de vozes E que algumas pessoas não vão ter vozes tipicamente masculinas ou tipicamente femininas Mas não deixam de ser menos mulheres ou mais mulheres por causa disso? Menos homens, mais homens por causa disso? Agora, então, pra fechar essa discussão Esse livro aqui Vai, vai (Tem um estudo que foi feito) (Para tentar encontrar o tom de voz neutro) Ah, eu não vi ainda (Não sei se vocês chegaram a entender esse estudo) (Que é exatamente quebrar esse sexismo de um lado para o outro) Aí, ó (Depois você tem que pesquisar por) (Neutral voice assistant) (Que é muito caro) (Entender a pesquisa e o vídeozinho da computação) Legal Então, na literatura de interação monocomputador, design de interação Essas questões que a gente está discutindo aqui agora São raramente discutidas, raramente são abordadas, infelizmente E também nas próprias organizações profissionais Como a gente já mencionou anteriormente Os livros que são muitas vezes dados para os praticantes que estão no começo dessa área Ou "Não me faça pensar" por exemplo, do Steve Krug Por acaso, não explicitamente, talvez até de maneira inconsciente Ele estimula que você crie sistemas que não façam a pessoa estar consciente das suas opressões E que quando houver uma situação de opressão, você consiga resolver isso de maneira técnica Então no caso do Dark Pattern, você vai lá e faz a usabilidade para a pessoa conseguir comprar a passagem que ela quer Mas você não mostra para ela que ela foi vítima dessa opressão quando ela teve que passar pelo Dark Pattern (Teve uma apresentação, se não me engano, no New York Stock este ano) (Com a Letícia Piz, do Quintal Noir) (Que ela fez uma apresentação, eu posso estar equivocado porque foram várias apresentações) (Mas eu tenho quase certeza que foi ela, mas se não for, depois eu confundo) (E nessa apresentação, ela comentou justamente do livro e ela comenta esse ponto) (Dizendo que não quer que "Não me faça pensar", pelo contrário, me faça pensar) Se a gente não tiver a intenção de fazer os usuários pensarem, a gente não vai ser um objeto cultural Uma produção cultural de valor, vai ser simplesmente uma coisa que você troca e substitui Um commodity, como você ir no McDonald's, você vai no Burger King, em termos de experiência cultural dá a mesma Agora, você ir num filme de um Coppola, ou você ir num filme qualquer, você vê a diferença Então, eu acho que a gente precisa evoluir além dessas opiniões de usabilidade McDonaldizada E pra isso, a reflexão e a crítica que a gente está fazendo aqui é fundamental Lá na UTF-PR, a gente está construindo o conceito de usuarismo Um novo tipo de opressão que a gente está percebendo relacionada à sociedade digitalizada O usuarismo é uma opressão que reduz pessoas a meros usuários, sem história, sem corpo, sem voz e sem direitos Mas com muitas necessidades que podem ser supridas pela tecnologia, em especial a tecnologia do Vale do Silício Os grandes opressores no usuarismo são as grandes empresas de tecnologia da informação que estão no Vale do Silício E que tentam, de várias maneiras, impor suas tecnologias para o mundo inteiro Além de reproduzir o colonialismo, que é uma espécie de nova colonização digital Também estão reproduzindo essa questão do usuarismo, porque os outros países, as outras pessoas Acabam sendo usuários das tecnologias que eles criaram (Inaudível) Na verdade seria mais o sentido de você só tratar as pessoas como usuários, desse tipo Você vai fazer uma pesquisa com usuários, e aí você só estuda eles enquanto usuários Você só quer saber qual a relação que a pessoa tem com aquela tecnologia que está interessada Você não quer saber se aquela pessoa é negra, se aquela pessoa é pobre, se aquela pessoa é estudante, é imigrante, se é deficiente Isso não interessa, você só pega aquilo que te interessa para o teu projeto Isso é um problema seríssimo que está acontecendo hoje na profissão de experiência de usuário Principalmente os novatos da área, eles estão entrando na área de UX por causa do dinheiro Não porque eles têm alguma preocupação com o usuário de fato E aí está corrompendo a nossa profissão, porque esses caras são aqueles que vão fazer o dark pattern E vão estudar a subjetividade dos usuários e vão usar isso contra os usuários Sem às vezes estar sabendo que estão fazendo isso Então aqui tem uma listinha de reducionismos que estão cada vez mais comuns no nosso vocabulário E curiosamente essa redução está sendo vista como uma coisa positiva Por exemplo, o discurso de smart cities que fala "não, não precisamos mais ser cidadãos, você pode ser usuário de uma cidade que funciona tão bem quanto o seu sistema operacional" E aí você vai fazer o que o sistema operacional está te mandando fazer Basicamente um sistema de controle e de vigilância generalizada que está sendo implantado nas cidades E que reduz a questão do cidadão enquanto alguém que pode decidir sobre essa tecnologia Ninguém está discutindo quando fala de smart cities e que essas tecnologias deveriam ser discutidas democraticamente como toda decisão em uma questão pública Então criando um sistema de ordem Exatamente, daí quando você cria uma cidade com base nessa visão de usuário O usuário não tem raça, não tem corpo, não tem direito Então se ele é negro, se ele é mulher, se ele vai ter alguma desvantagem por conta disso Isso não é uma questão que concerne ao projeto, isso vai além do escopo "Ah, isso é uma questão de legislação, isso não é uma questão de tecnologia" Só que quando a tecnologia se torna mais forte do que a legislação para regular o nosso comportamento Isso deveria ser uma questão pública sim Nós estamos numa situação, fica à vontade Estamos numa situação bem complexa que hoje em dia realmente a tecnologia é mais forte às vezes até do que as legislações E é mais rápida também no se atualizar Então a gente vê nas últimas eleições acontecendo isso claramente A tecnologia de disseminação de notícias falsas, o WhatsApp por exemplo, bombou Antes mesmo que existisse legislação proibindo ou coibindo esse tipo de prática E aí o eleitor se torna um mero usuário de redes sociais Ele não se torna uma pessoa que tem que construir com liberdade politicamente a sua posição Ele se torna um recipiente de informações E quanto mais informações aquela pessoa receber e desinformações receber, melhor para quem está enviando Então o WhatsApp agora está fazendo algumas coisas para mudar isso Por exemplo, impondo limite para a disseminação de mensagens por minuto Mas a interface do WhatsApp deveria de várias maneiras, e poderia tanto quanto o Facebook O Facebook já é um pouquinho melhor, ele te diz "Olha, essa notícia pode ser que seja falsa" No WhatsApp não tem essa função, mas é a mesma empresa que desenvolve, por que não implementa isso? O ponto é que fica cada vez mais difícil quando você acumula esses papéis Então por exemplo, se você é uma pessoa pobre, negra, gay, mulher, imigrante, deficiente, tudo junto E você ainda é usuário, você basicamente não vai ser privilegiado no processo de criação dessas tecnologias E você vai ser provavelmente tratado como mais uma peça nesse sistema Então tem uma tese de doutorado que saiu lá da UTF-PAR recente, de um colega meu, Rodrigo Gonzato Que propõe essa ideia de que usuários como um grupo de oprimidos Que estão alinados dos meios, técnicas, condições e saberes para a produção para si próprio De suas próprias existências Traduzindo para um português mais coloquial, significa o que? Esses usuários não sabem que eles estão sendo vítimas dos dark patterns Não sabem que quando eles estão usando uma interface, isso afeta a vida deles de várias maneiras Simplesmente essas pessoas estão sendo alijadas de entender por que existe aquela tecnologia e a intenção que está por trás E a literatura em interação com o computador não ajuda a isso, não ajuda a resolver essa questão Se você for ver os modelos clássicos de ergonomia cognitiva ou de engenharia cognitiva Eles vão mostrar o usuário como se fosse uma peça do sistema, como se ele funcionasse como uma engrenagem Como se ele fosse um anexo do sistema, ou se ele não é um anexo, se ele é separado Ele é visto apenas como um rosto, um dedo e o resto do corpo acabou Vejam aqui, não tem mais corpo, não tem... E esse corpo aqui, apesar de ser um corpo meio disforme, é um corpo que tem mais traços masculinos do que femininos Então basicamente nós temos uma despreocupação muito grande sobre o corpo na interação com o computador No design de interação, e o teatro, por isso toda essa introdução, ele vai ser fundamental para trazer de volta essa questão do corpo Eu escrevi junto com esse colega no ano retrasado um artigo aqui no IHC, a gente apresentou sobre a questão do corpo na interação com o computador Esse é um exemplo de como as interfaces, em especial das redes sociais, transformam o corpo em objeto Então no Facebook tudo gira em torno do corpo, só que esse corpo não é um corpo ativo É um corpo que o Facebook está explorando, transformando em objeto para vender esse corpo para os anunciantes Então no Facebook nós usuários somos o produto, nós não somos usuários mais, viramos produto E aí o teatro do oprimido, e antes do teatro do oprimido, a estética do oprimido, que é uma proposta mais ampla do que o teatro do oprimido Está escrita nesse livro aqui do Augusto Boal, a proposta foi a última coisa que ele escreveu antes de falecer em 2009 É um livro muito bacana, que ele vai falar o seguinte, todo mundo produz arte, todo mundo produz beleza no seu dia a dia Basta a gente reconhecer e valorizar essa beleza, então o mero gesto de você mostrar a língua numa foto já é uma forma de você fazer arte E todo mundo tem essa capacidade, esse é o conceito da estética do oprimido, ao invés de você ter que atingir padrões estéticos de uma outra classe social Você vai, a partir da sua classe social, buscar a beleza na verdade do seu dia a dia Isso aqui é uma atividade de estética do oprimido, que eu participei no CTO, que é o Centro do Teatro do Oprimido no Rio de Janeiro Fundado pelo Augusto Boal, e essa cena aqui, do ponto de vista teatral, você poderia olhar e falar "Poxa, cadê a produção cinematográfica, está muito fraco" Mas isso aqui é uma cena de improviso, é uma cena que está discutindo o quanto as pessoas, elas ouvem e são influenciadas pelo que outras pessoas dizem perto dela E eles construíram essa cena utilizando materiais que são recuperados do lixo E essa cena, ela traz uma verdade, que é a verdade de você ter que ajustar o seu comportamento pelo comportamento dos outros E muitas vezes se sentir mal porque você não está se comportando do jeito que os outros se comportam Então o Boal diz o seguinte, no teatro tudo é verdade, até a mentira É uma frase bem profunda, ele mostra o seguinte, a verdade do teatro é quando você representa de fato o que está acontecendo Inclusive os lados contraditórios, como a mentira Se a gente quiser trazer para a estética da interação esse conceito de estética do oprimido É preciso primeiro reconhecer e incluir os oprimidos na produção de interações Então eu vou mostrar agora uma série de experimentos que a gente tem feito lá na UTF-PR para incluir oprimidos Mas antes, um exemplo mais amplo do que a UTF-PR e muito bacana, que é o UX para minas pretas Alguém já tinha ouvido falar? É um movimento super bacana de mulheres negras, para valorizar as mulheres negras dentro da área de experiência do usuário Para criar oportunidades Algumas mulheres negras perceberam que eram muito poucas nessa área e começaram a se perguntar por que E viram que não havia muitas oportunidades, que normalmente elas eram vítimas de uma opressão dupla Que é por serem mulheres e por serem negras Quando juntas duas coisas você se torna uma situação pior, mais difícil de se incluir na sociedade Que ser só um homem negro, por exemplo E aí criaram um movimento, tem grupos de apoio e tudo mais Que está crescendo e aumentando e pressionando também as empresas a contratarem essas mulheres negras O que tem também criado oportunidades para você ter aquela pessoa negra dentro da sua equipe Para ver se você não está reproduzindo machismo, desculpa, racismo na sua interface Então se você tem pessoas diversas na sua equipe, a chance é maior de que você verifique Não deixe passar uma opressão no seu projeto sem querer Agora voltando para o TFPR, a gente tem discutido bastante a questão da formação dos estudantes de design Ser crítica, porque de um modo geral ela não é A gente viu no resultado do Enad do ano passado Que a maioria dos estudantes não conseguiu responder uma pergunta simples Sobre o caso da Marielle Franco, que foi uma ativista de direitos humanos assassinada no ano passado Ou no ano retrasado, acho que já tem quase dois anos E aí essa pergunta perguntava, olha, você consegue discutir Tinha que escrever, por isso que é tenso A defesa dos direitos humanos e a produção de notícias falsas Você consegue comparar essas duas questões? Aí tinha gente escrevendo coisas bizarras do tipo A Marielle Franco foi culpada de ser sido assassinada Porque ela mexeu com quem não tem que se mexer, não deveria ter feito isso A Marielle Franco, ela fica defendendo direitos humanos Mas direitos humanos defende bandido, então ela tinha que morrer mesmo Opiniões assim que são bizarras, não tem nenhuma conexão com a realidade Mas que é fruto de uma educação que não constrói uma visão crítica nos estudantes Que simplesmente eles vão reproduzindo aquelas notícias falsas mesmo Que eles viram no WhatsApp e em outros veículos Que vão dizer esse tipo de coisa, que a Marielle foi culpada Ou que ela era casada com um traficante, ou era namorada do traficante Ou que ele tinha se assado, também uma das fake news que saiu nessa época Na verdade isso acaba acontecendo em todas as situações Eu lembrei agora de um fato, teve o João de Deus, o caso dele E aí uma pessoa que trabalhava do meu lado, ele frequentava E aí foi engraçado, que a pessoa que fez a denúncia, a mulher que eu esqueci muito dela Ela se matou, e aí o comentário dele foi justamente isso Que foi o mais lógico, que ela se matou Denunciou o cara lá, denunciou gente grande Porque qual foi a vez que ele se deu nessa situação, podia estar quietinho até agora É a visão das pessoas que tem dessa situação, é bem similar a isso É, mas esse tipo de visão mantém as opressões vivas na nossa sociedade Então como é que você educa estudantes de design para que eles tenham consciência crítica? A gente não sabe ainda muita coisa, mas tem algumas respostas Ou tentativas de respostas Isso aqui é a caminhada dos privilégios digitais É uma atividade bem simples, que a gente tem uma lista de perguntas Do tipo, se os seus pais utilizam a internet desde que você é criança Dê um passo à frente, que é uma vantagem que você vai ter na sua vida, um privilégio Se por acaso você utilizava, se você tinha que ir na lan house para acessar a internet Dê um passo para trás E aí fica claro que mesmo entre estudantes de design de uma universidade privada Como essa daí, a PUC do Paraná, tinha estudantes com mais privilégios do que outros E eles começavam a discutir, poxa, eu tenho muito mais privilégios do que quem está lá atrás Dava uma distância muito grande E mesmo assim nós estamos aqui juntos Daí a gente discutia qual o papel da tecnologia em reproduzir esses privilégios E o que a gente pode fazer para que ela compartilhe as vantagens com todo mundo Tem uma outra vertente também de trabalho que eu tenho me interessado bastante Que é o design para a inovação social Que é para que os estudantes compartilhem os seus privilégios Então, essa estudante tinha várias conexões com pessoas da área da produção agrícola Ela tinha recursos, ela tinha tempo E ela foi lá e conectou as mulheres cafeicultoras que tinham o seu trabalho visibilizado Com as mulheres que são baristas, mestres de torres Que tem venda de café na cidade de Curitiba E aí fizeram uma exposição nas cafeterias mostrando que, curiosamente Não eram homens que produziam aquele café que a pessoa bebia Mas sim mulheres e mulheres muito fortes Mulheres que têm capacidades que são muitas vezes desvalorizadas O design livre é uma filosofia que combate o usualismo Legitimando o projeto feito pelo uso A gente já tem várias publicações sobre esse assunto É uma ideia inicialmente que surgiu inspirada pelo software livre Depois a gente hoje está trazendo muito mais para esse lado da liberdade no sentido freiriano Liberdade de você se desenvolver enquanto ser humano de várias maneiras Não só liberdade de abrir um código-fonte de um software Enfim, tem várias ideias interessantes aí Recentemente nossos estudantes escreveram um manifesto inspirado no design livre Que é o manifesto design de senso E aí eles dizem o seguinte O "designer" deveria apoiar o meio ambiente, a nossa sociedade E principalmente as necessidades dos oprimidos Em vez de ser usado para atrair usuários com propagandas enganosas E gerar mais desigualdade Então esse manifesto é uma reflexão que eles fizeram sobre a profissão deles E também os problemas que essa profissão envolve hoje com os dilemas éticos e morais Eles vão, pretendem publicar, fazer um evento sobre esse manifesto É uma escrita deles próprios e com um estilo também próprio e intencional Não é por acaso que eles colocaram "comic sense" e fundo "lies" brilhante Porque eles querem chocar mesmo e questionar o design Que reproduz aquele gosto da classe social que tem maior poder aquisitivo E por fim, o teatro do oprimido, que vai ser o foco desse mini curso Então, o teatro do oprimido, dando um panorama rápido, histórico Ele foi desenvolvido no Teatro Arena Que era uma companhia de teatro em São Paulo entre os anos de 60 e 70 Ao invés de representar peças clássicas que nada tinham a ver com o contexto brasileiro A proposta do teatro do oprimido era representar dramas cotidianos que a população oprimida vivia Então, ao invés de reproduzir pela enésima vez Shakespeare Vamos reproduzir alguma coisa que tenha a ver com a nossa sociedade Ou mais longe que Shakespeare, comédias gregas Então, vamos trazer os dramas que as pessoas vivem nas favelas brasileiras Só que daí, ao começar a trabalhar com essa temática A ditadura brasileira persegue e prende o seu principal defensor O principal desenvolvedor do teatro oprimido, que é Augusto Boal Ele acaba sendo exilado em 1971 e retorna ao Brasil em 1984 Fundando o centro do teatro oprimido, o CTO, que eu já mencionei anteriormente Pra quem não lembra ou não conhece essa história Tem uma canção muito famosa do Chico Buarque Que ele dedica ao Augusto Boal e a outros amigos também que estavam exilados nessa época Como Paulo Freire e outros mais E ele diz lá, né "Aqui na terra estão jogando futebol, tem muito samba, muito choro e rock'n'roll Uns dias chaves, outros dias bate o sol, mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta" Então, o que é a coisa tá preta? É que a ditadura segue firme e forte impedindo a liberdade de expressão Então, essa mensagem aqui é uma mensagem muito bem codificada Pra ela conseguir furar a ditadura, né, porque ela não tem uma... Ela não fala explicitamente sobre a ditadura Mas explicitamente, como várias outras canções do Chico Buarque Ele traz esse cenário e como as pessoas estão alienadas Jogando futebol, ouvindo rock'n'roll, tem samba Mas não estão conscientes de que essas opressões estão num nível muito preocupante É muito curioso que, depois de todos esses anos, toda essa história que a gente tenha passado A gente volte a discutir de novo isso como se... Uma reescrita desses momentos, como "não, não teve opressão nessa época" "Não, não teve ditadura, foi uma mera intervenção militar, não houve censura" "Foi apenas uma escolha de programação, uma curadoria" Ai, meu Deus, não, deixa eu voltar pra cá Não vou longe Mas é importante também o fato de eu estar escolhendo trazer o teatro oprimido aqui pra UIHC Tem a ver com o nosso momento sociopolítico, não é por acaso E também o interesse dos estudantes pelo teatro oprimido também tem a ver com isso Eles não estariam tão interessados em discutir se as impressões não estivessem tão fortes como estão hoje Tão explícitas e tão diárias e cotidianas e tão digitalizadas também Bom, o teatro oprimido começou com o teatro jornal, que está aqui Foi a primeira técnica, depois se desenvolveu o teatro imagem, jogos, arco-íris, o desejo, teatro invisível Cada uma dessas é uma técnica diferente de fazer teatro Todas elas são baseadas em improviso, em interação com a plateia Que eles não chamam de plateia, eles chamam de espectadores Porque as pessoas que estão olhando a peça, uma hora podem ser convidados a fazer parte da peça E aí se tornar atores, então o espectador vira ator e vice-versa, o ator às vezes volta pra plateia A base filosófica do teatro oprimido é essa estética do oprimido que eu estava falando até agora Tem toda uma discussão bem interessante naquele livro do Boal Mas agora a gente vai passar então para a parte prática e técnica Que é o teatro imagem, teatro fórum, a gente vai fazer alguns exercícios, jogos, teatro imagem e teatro fórum Meu objetivo é terminar com essas três aqui Porém, na UTF-PR a gente está desenvolvendo uma quarta galha aqui Sexta galha, eu acho já, na verdade Que seria o teatro projetual, que é isso aqui A gente está tentando criar, usar o teatro como um processo de criação de tecnologias libertárias Então ao invés de você fazer um rascunho no papel ou de você fazer um vídeo improvisado Que é uma coisa que eu já fazia antigamente, de você filmar um contexto de uso futuro de uma tecnologia Você pode usar o teatro para fazer isso, improvisar com o teatro E aqui se torna muito interessante a relação com design de interação Apesar de que eu posso dizer que ainda não está completamente aperfeiçoado esse sistema Ainda não conseguimos configurar bem o método para fazer o teatro projetual A parte que mais funcionou até agora foi a seguinte Quando você tem uma tecnologia, uma pessoa pode fazer o papel dessa tecnologia Encarnar e ser o personagem tecnologia Nesse caso aqui a gente tem uma... Eu vou mostrar o vídeo que é engraçado Essas estudantes, elas estão trabalhando com a opressão machismo E elas querem criar um artefato, um objeto que coloque em evidência Como o machismo se reproduz a partir da moda E elas querem falar sobre o sutiã O sutiã é um objeto que a gente acha normal na nossa sociedade Mas ele obriga a mulher a ficar com um objeto, uma moda que não é necessariamente confortável E é uma imposição social - Pode ficar uma necessariamente na mulher confortável Isso, obrigado Eu vou mostrar É uma questão que vale a pena debater E aí elas fizeram um projeto chamado Scrotian Que é o que a gente tem chamado hoje lá na UTF-PAR de design prospectivo Que é visualizando uma sociedade futura em que existe igualdade de gêneros até na moda Então vai ter sutiã, vai ter Scrotian para os homens Tem até a versão dry fit para esportes e tudo mais E esse design prospectivo, vale o parênteses, que é o tema do nosso programa de mestrado Que a gente acabou de submeter para a CAPES A gente não tem mestrado em design Se for aprovado vai ser todo focado nessas especulações sobre o futuro E eu vou estar falando sobre esse programa lá na quinta-feira, no design Me convidaram para uma palestra, 19 horas é isso? Ou 18 e 30? 19, 19 horas Onde que é o C... Lá no costelo, perto da Alameda Ah tá Então quem quiser participar dessa palestra e conhecer mais sobre esse tipo de trabalho Eu vou falar só sobre isso Design prospectivo que é um novo tipo de design que a gente inventou Mas voltando para o teatro oprimido, então o Augusto Boal E também relacionando com essa questão de prospecção e futuros Se a gente tentar alcançar essa sociedade que não tem opressões É fomo, utopia, não importa, avançar na direção não é a utopia É a opção ética, nós temos que tentar Se as utopias não se alcançam nunca, porque sempre haverá outra mais distante Caminhamos na sua direção Então o Boal nos dá uma referência ética, estética De articulação política e de humanidade Que é muito inspiradora, eu adoro os trabalhos dele, adoro ele falando E as pessoas com quem eu conheci, eu nunca tive a oportunidade de vê-lo pessoalmente Mas as pessoas com quem eu conheci que tiveram a oportunidade de conhecê-lo Fala que ele era um grande ser humano, uma pessoa incrível O teatro oprimido se espalhou pelo mundo inteiro Existem milhares de grupos de teatro oprimido Eles criaram um sistema Coringa que permite que você multiplique Você treine pessoas para serem agitadores do teatro oprimido, multiplicadores Eu fiz esse curso de formação de Coringa lá no CTO E tento disseminar essa prática e também relacionar ela com o design de interação Que é a área de pesquisa onde eu atuo Bom, a apresentação conceitual era isso Aqui tem algumas referências bibliográficas Depois eu vou passar por e-mail para vocês, quem quiser consultar mais a fundo Se vocês tem alguma dúvida, alguma questão