Prospectivo é o tema dessa palestra. Então a gente está falando sobre o poder que esse design prospectivo pode ter. É um conceito novo que a gente desenvolveu na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, que está sob avaliação atualmente na CAPS, um programa de mestrado inteiro com esse foco. Não existe ainda essa área. A gente espera que ela venha a existir a partir das fundações desse programa. De onde surgiu o conceito design prospectivo? Refletindo sobre a história do design, nós professores da UTPR percebemos que por muito tempo o design esteve associado à criação de novas formas para funções antigas. Então já existia automóveis, já existia trens, mas com a contribuição do design industrial e na figura do Raymond Lowey, um projetista industrial, um designer industrial clássico dessa área, design significa most advanced and acceptable. O que seria o mais avançado? Seria a forma mais avançada, ou seja, uma forma que traria uma percepção de que você estaria num outro mundo, num mundo futurista, no presente. Então a questão do design nessa época era uma questão de estilo, uma questão de forma. A função vai se tornar uma questão, uma preocupação para o design industrial a partir de alguns anos depois do trabalho do Lowey. Vai vir também outras escolas de design industrial, outros pensadores, outros nomes que vão questionar essa abordagem, mas a gente pode ver que ainda é muito forte a associação principalmente popular. O design conseguiu se firmar e justificar e legitimar por conta do trabalho com a forma. Já recentemente, aí avançando mais de 60 anos na história do design, você tem uma discussão mais ampla sobre o design enquanto um conteúdo e não só uma forma. E aí que conteúdo, o que que o design pode dizer à sociedade? Bom, Anthony Dunn e Farona Rebic são atualmente caparçons nos Estados Unidos, mas eles ficaram muito conhecidos pelo trabalho questilional no Royal College of Art na Inglaterra. Eles começaram a discutir com os estudantes se design poderia ser uma maneira de debater as grandes questões da ciência, da política, da sociedade que estavam sendo colocadas no debate público. O design poderia se colocar através da produção de artefatos visando a ampliar esse debate para o cotidiano, para a gente pensar as questões, por exemplo, de ética, na engenharia genética, no dia a dia. Como é que isso vai impactar? Que tipo de comida que a gente vai ter? E aí eles criam toda uma série de experimentos de design que depois ficam conhecidos como design crítico, posteriormente como design especulativo, como por exemplo esse experimento que vocês estão vendo aqui atrás, faz parte do projeto UK Micro World, que eles imaginam um futuro em que as pessoas modificam os seus genes para se adequar melhor às suas funções, o seu trabalho na sociedade. Então eles imaginam uma sociedade que com a possibilidade de modificar os genes ela não precisa depender tanto de tecnologias metálicas, ela pode usar só tecnologias biológicas, então não precisa mais de valores que poluem, basta você ter pessoas com genes de coxa de cavalo e aí essas pessoas podem andar em bicicletas gigantes carregando as pessoas como se fosse no ônibus. Que bizarro! É justamente isso que eles estão querendo provocar, essa sensação de estranhamento para que você se engage com questões trabalhistas que raramente são discutidas na nossa sociedade, especialmente nessa sociedade do Reino Unido onde eles estão, o liberalismo econômico ele tem sido uma voz preponderante no debate político e com essa especulação eles conseguem colocar uma proposição que não é nem de um lado nem de outro, ela joga o debate para a esfera política para você olhar para esse projeto e você pode apreciar e achar legal essa ideia, você pode até gostar da ideia, mas você também pode sentir uma sensação de que tem algo muito errado no estudo. Então isso é design para debate, a proposta de um design muito mais engajado. Porém não o TFPR, a gente pensa que discutir, debater apenas o que que acontece na, o que que rola na nossa sociedade, os grandes debates, materializar eles não é suficiente, a gente precisa realmente estar ativamente construindo esses futuros, essas alternativas, porque no caso do Brasil a gente não tem uma sociedade democrática real, a gente não tem uma abertura política para ficar apenas debatendo, isso se reverter em voto, isso se reverter em mudança de políticas públicas, se a gente quer se engajar com uma questão pública a gente tem que também fazer essa questão pública se tornar realidade, ou seja, precisa ativismo junto com o debate. E aí a gente cunha esse conceito de design prospectivo como foco em prospectar novas relações. Você fala que relações? O que que é isso? Vai ficar mais claro com exemplos que eu vou passar. Como eu estava falando, na época do Desenho Industrial, da sua fundação com Raymond e outros, se preocupava-se muito com as coisas e o design dessas coisas. Porém, com o design prospectivo a gente percebe que a gente está consolidando uma preocupação mais recente, que não é só do design prospectivo, mas também aparece no design especulativo, só que não de maneira mais concreta, que é o foco em relações, por isso a ontologia se tornando uma questão importante. Então o design prospectivo ele foca na relação entre coisas, só que essas relações entre coisas elas não são livres, você não pode relacionar uma coisa qualquer se quiser, você vai depender de uma série de regulações, uma série de normas, uma série de tabus, você não pode fazer associações livres entre as coisas. E aí esses tabus, essas regulações a gente tem conceitualizado dentro do design com o conceito de caixa de possibilidades, que é muito parecido com aquela que é do pensar fora da caixa. Não é bem exatamente pensar fora da caixa que a gente quer com o design prospectivo, a gente quer mudar a caixa ou expandir essa caixa. Então o que seria, refletindo sobre essa caixa a gente tem percebido que existem cinco níveis ou cinco caixas, uma dentro da outra, tá? Uma delas é o possível, aquilo que as pessoas acham que não vai ter esforço para fazer agora. O provável é aquilo que pode ser que aconteça, mas é bem provável que aconteça, mas pode ser que também não aconteça. Já o improvável e o impossível, o impensável fazem parte daquela área escura da caixa ou na maioria do caso as pessoas não acreditam que nem faça parte da caixa. E na verdade nem valeria a pena você pensar sobre o improvável, o impossível, o impensável, ou seja, são opções que são negadas. Essas opções de comportamento, de relações, elas são negadas pela sociedade, pelos coletivos, pelas organizações, pelas instituições, pelos governos e por aí vai. O design prospectivo, ele tenta então expandir essa caixa de possibilidades através de uma prospecção que considere cenários e se o improvável se tornar possível. Essa é meio fácil, ela desafia a lógica estatística de que as coisas que são prováveis vão acontecer. Vamos especular assim mesmo, mesmo que isso seja pouco provável de acontecer. Agora, e se o impossível se tornar possível? Você começa a pensar que a distância entre o possível e o impossível não é tão grande assim. E uma coisa que a gente acha que pode ser possível, pode se tornar possível por uma pequena mudança de relações. Mas o que realmente faz a diferença no caso do design prospectivo é que a gente também pensa no impensável. Como é que você faz isso? Você tem que forçar um pouco a barra no processo de prospecção para você encontrar conexões entre coisas que não estão conectadas. E a partir disso pensar em relações. Conexão é só um passo para uma relação. Quando você vai fazer esse processo de prospecção, se você fizer isso individualmente, você vai depender do seu estilo cognitivo, da sua experiência de vida e da sua perspectiva em relação ao futuro e às suas ações e consequências do mundo. Muitas pessoas são mediatistas, algumas outras pessoas são pé no chão e pouquíssimas pessoas são visionárias. Mas nenhuma delas sozinha vai conseguir ver a caixa de possibilidades como um todo. Então vocês estão vendo que mesmo o visionário pode enxergar coisas que são mais impossíveis, improváveis, impensáveis, porém não consegue às vezes ver uma coisa que é muito possível de acontecer perto dele. Então a profissão que a gente está buscando no design prospectivo é coletiva, ela combina, ela promove sobre posições entre as perspectivas, sobre as possibilidades e aí você começa a ter um design transdisciplinar. Por isso que vocês vão perceber que a maneira como a gente está descrevendo design aqui poderia se encaixar em qualquer profissão e é justamente isso que a gente quer, que é para estudantes que venham fazer esse mestrado de qualquer área. Especialmente pessoas que não têm informação em design, porque quando a gente observando na graduação percebo que os nossos estudantes estão muito à foio para construir um produto para resolver um problema e a maioria das vezes eles não sabem qual problema que o produto está resolvendo ou se sabem muito superficialmente as características desse problema. E tem mais uma coisa, quando você considera que uma relação é um problema, pode já ser um problema. Então as relações não necessariamente são problemas, elas são características da nossa sociedade. Quando você problematiza uma relação aí sim pode ser que você esteja simplificando essa relação com uma mera troca de informação, uma mera disponibilização de uma funcionalidade e acaba reduzindo uma relação, uma conexão ou pior, uma transação que é algo muito mais superficial e menos enriquecedor da experiência humana. Então eu estou falando que vocês estão fazendo isso, não estou falando que os nossos estudantes estão fazendo isso, estou falando que a academia está fazendo isso com vocês porque a literatura em design concentra-se principalmente em dizer isso para vocês o tempo todo. Design produz artefatos, inclusive as definições das associações profissionais vão dizer isso para resolver problemas na sociedade considerando os múltiplos aspectos culturais, emocionais, que você já jogou no lixo antes quando você disse que você vai produzir um artefato para resolver um problema. Então a gente está tentando dar um reboot, digamos assim, no design por isso é uma proposta um pouco mais pescada, não sei se vai ter, eu não acredito sinceramente que tem muita chance de ser aprovado isso, mas vamos tentar né. Vamos mostrar um exemplo então, esse exemplo aqui está no processo de transição, uma estudante que está fazendo um TCC no curso de design da UTF-PR, porém ela tem se interessado cada vez mais pelos temas que a gente lida no design prospectivo, então o trabalho dela não é 100% design prospectivo, mas também acho que nenhum trabalho que a gente tenha feito é 100% design prospectivo, que é uma coisa nova, que a gente está nomeando uma coisa que ainda não existe, na verdade a ideia é essa, estamos prospectando o design prospectivo, essa palestra faz parte disso. Se fizer sentido isso para vocês, vocês me avisem, se não fizer, por favor ajudem na nossa prospecção coletiva. Então vamos lá, o trabalho da Rafaela, ela começou com uma motivação que ela tem familiares que trabalham com a produção de café no norte do Paraná, essas mulheres trabalham a gerações com produção de café, mas muitas vezes os consumidores e principalmente a própria família não sabe que são as mulheres que fazem, "ah não, tem aquela tia nossa que mora lá no norte do Paraná, ah é o marido dela produz café", não, é a tia que faz o café, ela que está na lavoura, e aí ela ficou preocupada com isso assim muitos anos e de repente falou "ah vou fazer um TCC sobre isso para fortalecer a identidade dessas mulheres" e aí ela viajou para Pinhalão, que é a cidade no interior do Paraná onde moram essas mulheres cafeicultoras, descobriu que tinha uma associação dessas mulheres e aí ela começou a desenvolver uma relação com essas mulheres para entender como elas eram invisibilizadas, porque que elas eram invisibilizadas e o que que podia ser feita para dar mais visibilidade para o trabalho dessas mulheres cafeicultoras. Depois disso ela conheceu outros grupos em Tomazina, em Baiti, outras cidades que são próximas naquela região, ela fez um estudo de vários processos do dia a dia, momento da colheita, momento da distribuição, momento da negociação, ficou lá morando com essas mulheres há algumas semanas, voltou para Curitiba, depois foi para lá e organizou, começou a organizar oficinas depois que ela começou a entender mais ou menos quais que eram as principais preocupações que essas mulheres tinham e aí ela organiza uma oficina que prospectava ações que poderiam ser feitas para se relacionar melhor com Curitiba, a proposta da intervenção dela nesse nessa comunidade era como é que essas mulheres que estão produzindo café podem se aproximar mais do mercado consumidor de café em Curitiba e aí essas mulheres vão lá propõe ideias usando algumas dinâmicas inspiradas em design thinking, e aí vai, depois disso ela consegue convencer várias mulheres que vêm de café em Curitiba, mulheres que são baristas, mulheres que são mestres de torra, enfim, ela envolve uma série de pessoas no projeto para receber essas mulheres café e culturas promovendo uma troca de experiências, uma troca de aprendizagens e também para que elas se conhecessem e desenvolvessem relações de longo tempo, o que acontece no meio tempo dessas conexões e relações que ela está cultivando realmente acontecem coisas interessantes como uma exposição nas cafeterias curitibanas mostrando fotos dessas mulheres café e culturas tiradas por uma amiga da Rafaela que estava fazendo o curso de fotografia que ficou sabendo do projeto via Instagram que quis ir junto com ela para lá participar da empresa etnográfica que ela fez no começo e aí depois ela exibe isso num um dos cafés que vende o café da mestre de torras que ela conheceu via uma pessoa, quer dizer, eu nem sei contar essa história direitinho, ela fez um diagrama para me mostrar mas eu ainda não entendi tudo que aconteceu, basicamente ela começou fazendo essa conexão indo para Pinhalão, daí ela perguntou em Pinhalão quem estava ajudando a fortalecer a identidade dela foi para o café do Matão, foi para a Emater que é a entidade do governo que fortalece esse grupo de mulheres e daí começou e essas conexões ela ia e vinha foi conectando as pessoas mas algumas pessoas já estavam conectadas só que a relação estava uma relação estava fraca, fortaleceu com a atitude dela, a articulação que ela estava fazendo e hoje a entidade dela está focalizando bastante em contar a história dessa rede que ela de relações que ela foi cultivando. Então esse projeto ele não tem exatamente um objeto físico como um resultado final, tem lá se quiser perguntar um professor mais da velha guarda e falar cadê seu projeto gráfico? Tá aqui ó, uma exposição, tem material mas não é esse o ponto da pesquisa dela, o ponto principal da articulação de rede que ela fez que ela pretende transformar isso também num papel que ela pretende desempenhar em outros projetos através de uma empresa que ela pretende fundar estilo dois e meio negócio social para fazer esse tipo de coisa com outras comunidades de mulheres e de outras comunidades vulneráveis. Então esse projeto da Rafaela tem me feito me refletir bastante sobre o novo papel do designer, o possível novo papel da designer ou da designer, mais especificamente as mulheres também tem acho uma potencial muito grande para fazer esse tipo de trabalho, de entender isso mais rapidamente do que os homens eu diria, de que o paradigma de informação que a gente tinha lá nos anos 90 que deu origem ao design da informação, a arquitetura da informação que o professor Mauro foi um dos pioneiros no Brasil, o design de interação que também veio aí nos anos 2000 para o Brasil que eu fui um dos pioneiros, o Hugo também foi um dos pioneiros, Mauro também depois migrou para essa área design de interação e mais recentemente o design de experiências que está na boca do mercado que está gerando altas demandas eu tenho visto que a gente está caminhando para um escopo de projeto e um horizonte de tempo muito mais longo, ao invés de de 30 segundos, horas, pensar em anos, o design de relações, se é que isso pode existir algum dia, eu não estou propondo isso, estou falando design prospectivo, eu acho que as relações elas emergem, elas não são projetadas do jeito que a gente projeta por exemplo uma experiência, uma interação de informação, mas talvez eu multitere futuramente ou talvez outras pessoas pensem outras referências, mas eu tenho pensado mais essa questão do tempo, do horizonte e pensar em projetos de longa duração, é claro que quando a gente começa a vir para cá eu vi que a maior parte das referências não está no design de experiência, interação, informação e sim no design sustentável, já tem pensado nessa escala de anos há muito tempo, porém sem essa estrutura que a gente tem que traz o design de interação que dá uma perspectiva de projeto mais robusta, então o design prospectivo ele não tem nada a ver com gráfico, produto, nem com interação de experiências, ele não é uma continuidade, ele tem uma ruptura bem forte aqui que é acabar com o objeto, deslocar o objeto, então se aqui no gráfico e no produto você tem um objeto estático que você desenvolve relações para alimentar aquele objeto, depois esse objeto empacota essas relações e você pode enviar ele para a China e lá ele vai gerar valor, já no design de interação, design de experiências a relação com o contexto é muito forte porque ele passa a ser um ampliador dessas relações, então já tem uma noção mais próxima do que a gente está discutindo no prospectivo, porém no prospectivo a gente quer acabar com o objeto, perder o objeto para ganhar o campo, então se você vai projetar um objeto aquele objeto não é um objeto, aquele objeto é um nome, uma rede de relações. Que relações que a gente está falando? As relações precisam ser projetadas ou repensadas ou prospectadas, a palavra ainda não está muito clara para mim, mas são essas que eu acho que seriam prioridade, relações ecológicas, relações de produção, relações de poder, relações de pressão e relações internacionais, no contexto brasileiro, no específico lá no Paraná, eu tenho visto que essas relações são urgentes. Começar pela relações ecológicas, que estão aí gerando uma situação de não existir mais futuro para uma sociedade que consome mais recursos naturais e consegue renovar os recursos, que tem poluído os recursos e tornado nosso alimento tóxico e por aí vai, mas isso também é uma questão tão importante quanto por exemplo a opressão que a gente vive, hoje no Brasil especialmente os grupos opressores terem se colocado, estarem em posições de liderança na nossa sociedade, estarem propagando discursos de ódio e não serem repreendidos por isso, então o design precisa se posicionar com respeito disso. Como é que a gente faz isso na prática? A gente ainda tem poucos exemplos de técnicas, de métodos, de metodologias ou de anti metodologias e atitudes e whatever you wanna name it, mas eu vou mostrar alguns exemplos de projetos que tem feito, desenvolvido nos últimos anos lá no BR em outros lugares que poderiam ser exemplos de técnicas voltadas para relações. Então aqui você tem aquele caixa de possibilidades que eu mostrei anteriormente sendo utilizado como um framework para uma discussão coletiva para ver que relações que podem ser possíveis dentro de uma sala de aula, quais relações são improváveis e por aí vai. Aqui nós temos um mapeamento de relações, esse mapa é um parede desse tamanho que os estudantes fizeram, é um giga map, algumas pessoas chamam isso, eles estão observando a prospecção de relações com a cidade, várias relações. Aqui nós temos visualizações de relações entre tendências de design digital, projeto mais antigo que eu desenvolvi quando eu estava na UQ do Paraná. Então perceber que as tendências, um dos resultados dessa pesquisa que durou uns três anos, é que as tendências de design digital, elas ao invés de virem para trazer novas ideias, para romper com o Stabilizement, trazer novos estilos, pelo contrário elas buscam desesperadamente se apropriar das tendências que já estão estáveis no mercado, que já tem uma ligação comercial, ou seja, buscam legitimação e ao fazer isso geram um ciclo de restyling mesmo, de você ficar remoendo uma coisa que já existe. É muito curioso que a gente olha para trás e critica o styling, que é aquela época do design que os carros cada um ficava com um formato diferente para poder parecer diferente, para poder vender mais carro e aquilo ainda não acrescentava muito, mas eu acho que no design digital por mais que mude o nome, mude eventualmente a técnica, o conteúdo dessa técnica não é muito diferente. Então você vê aí, por exemplo, um fortalecimento muito grande do clean, do minimalismo nessa rede e ninguém questionando isso. Nos três anos que a gente fez essa pesquisa, isso só se consolidou, não houve vozes dissonantes, então eu cheguei à gente que o design digital é extremamente conservador e isso não é por acaso que ele esteja relacionado também e tem uma parcela de responsabilidade social pela eleição de governos conservadores na nossa sociedade, não só no Brasil. Voltando então, outro exemplo, relações podem ser montadas e aqui há relações metafóricas com o Lego, o Cirrus Play, que ajudaram a gente a bolar um monte de design prospectivo, isso aqui é uma das oficinas das várias que a gente desenvolveu com os professores do DADIN, tentando pensar como que eles poderiam se relacionar melhor, alinhar suas pesquisas para fortalecer esse programa. Nessa época a gente nem tinha esse conceito ainda design prospectivo, a gente estava realmente buscando o ponto de contato entre nossas pesquisas. Teatro do oprimido é uma maneira também de ensaiar relações, eu vim aqui para Vitória para dar um curso de teatro do oprimido vinculado à computação, um evento chamado IHC. Teatro do oprimido é fantástico porque você consegue ver a materialidade das relações, quantos pequenos detalhes na maneira de olhar, na maneira de você andar, na maneira de você se aproximar de um outro corpo, faz uma diferença enorme numa relação social e como isso pode ser usado e de fato é o tempo todo como um instrumento para opressão, então a tecnologia, os objetos que mediam essas relações de opressão, eles podem ser repensados se você pensar primeiro e perceber que existe uma relação de opressão sendo mediado para esses objetos, a começar pelo layout dos espaços físicos, que muitas vezes estabelecem uma diferença entre aqueles que têm mais poder, que têm menos poder e por aí vai. No teatro você consegue reverter isso rapidamente e ensaiar como seria diferente ou como seria uma reação. E aí a parte mais tecnológica dessa discussão, que essas relações também podem ser prototipadas, prototipada não quer dizer que você precisa entender como funciona a tecnologia completamente, você só precisa fazer essa relação se tornar um aspecto tangível, num caso de uma distribuição geográfica ou numa necessidade de interação assíncrona, que essas pessoas continuem tendo essa relação ou estabeleça essa relação, através de uma tecnologia que pode estar ali temporariamente permitindo que essa relação aconteça. Aqui nesse caso é um projeto de um assistente virtual que ajuda o estudante a ter uma relação com um tempo mais crítica e reflexiva sobre o que ele está fazendo, por que ele está fazendo aquilo ali e com isso perceber se ele deve ou não deve procrastinar, porque o assistente ele não é não de mental, ele diz que procrastinar também faz parte da vida e isso é importante para a gente relaxar e ter os momentos de reflexão. E as relações também podem ser vividas, né, eu souberto-se em sala de aula de maneira muito contundente com as minhas estudantes, elas têm me colocado em várias situações em que o professor enquanto representante do conhecimento, ele perde muito na relação com os estudantes quando ele aceita essa posição, quando o estudante quebra essa perspectiva e se coloca numa posição humilde de ser mais um dentre um grupo, um coletivo mais interessado numa questão social e ouvir mais do que falar, você pode viver uma relação completamente diferente de aprendizagem, eu aprendendo junto com elas e elas aprendendo junto com outras pessoas além dessa classe, então isso aqui é um momento que elas resolveram manifestar isso para outras pessoas, escreveram um manifesto sobre um design mais engajado socialmente e eles receberam, como é que eu posso descrever isso, escrever esse manifesto no corpo como se fosse uma segunda pele, vestir esse manifesto e sair para uma universidade dançando com os parangolés que a gente construiu em cima de frases do tipo "contra projeto dos oprimidos", "antifascista", "dormir com a consciência tranquila durante quando você termina o dia de projeto", "ter certeza que você fez o melhor que você podia para combater a opressão e para aí vai". E por fim a questão do cultivo, que relações, a gente tem falado bastante, eu tenho falado bastante projetar relações, de estabelecer conexões e tudo mais, mas no fim das contas, acho que talvez a palavra que funcione melhor para pensar, "relações" seja "cultivo", uma relação não adianta você estabelecer ela também, porque ela pode desaparecer, ou ela pode se tornar uma relação que não é peréfica para os dois que estão relacionando, pode se tornar uma relação, hoje a gente usa bastante o termo "tóxica", então você precisa cultivar, você precisa tirar as ervas da linha, você precisa estar cuidando dessa relação, você precisa estar discutindo dessa relação e a metáfora da horta orgânica, que algumas estudantes lá da UTFPR ajudam a desenvolver em alguns lugares em Curitiba, estiveram capitaneando uma política pública para hortas orgânicas, hortas urbanas, desculpa, na cidade, eu acho que aqui está, digamos, o futuro do design, essa horta, essas relações que as pessoas têm ao redor de uma horta de criação de um comum, de um recurso comum que é compartilhado entre essas pessoas, as quais ninguém se coloca como dono ou como proprietário, acho que aqui tem uma janela de uma nova sociedade, digamos assim, de uma série de outras coisas que podem surgir, a partir disso a gente aplicar essa lógica para outros domínios e conectar esses domínios, a gente fala, falava bastante de "common", de bens comuns no digital, no começo da internet, com "creative commons", "soft delivery", por exemplo, e com o crescimento das plataformas voltadas para user experience e a usabilidade, como por exemplo Netflix e Spotify e outras que oferecem conteúdo por um preço muito baixo, a gente acabou esquecendo essas histórias, até mesmo o software virou um serviço, você paga um preço embaixo para ter um software da Adobe, mas não se engane, porque a Adobe não está fazendo isso pelo bem comum da sociedade como a gente fazia lá no começo dos anos 2000 cartaneando o commons, a Adobe faz isso porque é mais lucrativo e tão logo não seja lucrativo ou existe uma regulação, a Adobe puxa e tira essas ferramentas da sua mão, como se você estivesse trabalhando lá na sua horta e de repente sumisse a sua ferramenta, a gente aconteceu com os designers na Venezuela algumas semanas atrás quando a Adobe teve que tirar todas as licenças, suspender todas as licenças do software, todos os softwares, Photoshop, todo o Switch pararam de funcionar, todos os seus arquivos que você teria projetado durante a sua carreira de designer se tornarem inacessíveis dentro daquele país, então você fala "ah, mas eu não moro na Venezuela", Venezuela é aqui do lado gente, Venezuela tem uma relação muito forte no imaginário coletivo do Brasil, então o que acontece lá pode ter certeza que pode ser que aconteça aqui também. E aí quando a gente começa a pensar nos futuros, a gente na verdade está transformando o presente, porque o futuro de alguém pode ser o nosso presente, em vice-versa, o nosso presente pode ser o futuro de outra pessoa, então a gente tenta espacializar essa ideia de tempo, tempo como uma coisa que é simultânea, então na maior parte do tempo quando a gente, não, desculpa, não posso usar essa palavra agora, senão vai confundir. Quando a gente pensa em história de maneira superficial a gente vê que a história é uma coisa linear, o passado precede o presente e o futuro ainda não chegou, mas é uma tendência que continua na mesma linha, a gente continua fazendo as mesmas coisas que a gente faz no presente que a gente está determinado pelo passado, não dá pra mudar o passado, então se a gente usa carros hoje no presente, usou carros do passado, é bem provável que a gente use carros no futuro. Então, a nossa imaginário quando está influenciado por uma lógica de progresso linear, de que a gente está indo para o caminho daqueles gurus do futuro, os futurologos, as empresas do Vale do Silício, quem tem, domina a tecnologia, sabe para onde está o nosso futuro, se a gente acreditar nessa ideia linear de história a gente vai estar fadado a utilizar os carrinhos do Google e ter que conviver com eventuais acidentes e assassinatos, provavelmente de pessoas, começando com pessoas negras, porque os algoritmos não vão ser tão bons para detectar o rosto das pessoas negras, porque nunca são, primeiro tem que ser só na segunda, terceira, décima versão que se faz uma consideração sobre isso, porque quem faz algoritmos são os brancos e fazem muitas vezes para excluir, para dar vantagem para os brancos e não para os negros e por aí vai. Estou usando só exemplos dos negros aqui, mas existem outras, outros grupos sociais que são excluídos nessa ideia. Quando você começa a prestar atenção um pouquinho mais atenta à história, você percebe que algumas ideias vêm e voltam, elas são tiradas às vezes do baú ou às vezes elas são mantidas como se fossem fantasmas para sempre, a história do carro voador, tem estado presente no imaginário de futuro há muito tempo. Então na verdade isso aí é um passado do futuro, porque sempre esteve presente essa ideia do carro do futuro e ah não, quando a gente tiver carro do futuro e agora tem um japonês, um chinês, um coreano, um indiano que está fazendo um carro do futuro e o negócio está voando e já vai chegar para a gente, isso aqui é o futuro. Na verdade essa aqui é mais uma espécie de um meme ou um teme, melhor dizendo, para a gente acreditar nessa história linear e não necessariamente uma coisa que vai trazer novas relações, pelo contrário, imagina o caos de você controlar o tráfico de carros voadores, imagina se cada pessoa pudesse voar livremente pelo céu de Vitória, quantos acidentes, caiu um avião aqui recentemente lá em BH, matou três pessoas, imagina um por dia desse, chuva de carro voador, absurdo isso aqui, quem gosta desse negócio aqui não sabe onde está se metendo, ou então, na verdade isso aqui é só para pessoas que tem muito dinheiro para poder andar de carro, mas ele não é carro, é limusine, vamos falar a verdade, para pessoas muito ricas. E para o outro lado tem também essa coisa que o design é super requisitado e volta e meia faz isso com frequência que é o retrô, você pegar um elemento do passado, trazer ele para o presente, misturar com algumas coisas do futuro, aí na verdade você está dando de novo, como falei, um restyling nas coisas que já existem. Então isso aqui você começa a olhar de maneira mais crítica de que a história é cíclica, não é somente linear, mas a proposta que a gente está querendo trabalhar no design prospectivo é pensar que tudo isso é alternativa, não existe passado, não existe presente, não existe futuro, só existem alternativas. Então você pode pensar, se você pensar que tudo é alternativa, então abre um horizonte de possibilidades muito maiores para você perceber que sim, dá para você ter uma mobilidade muito mais sustentável do que o baseado em carro. E aí você pode pensar e pesquisar que no passado já teve gente tentando fazer isso, você pode ver futuros alternativos ao ver que no passado alguém já estava andando de bicicleta e que a China tinha o maior índice de uso de bicicleta do mundo, que tinha taxas muito baixas de poluição do ar, e aí o futuro da China na verdade é o passado dela, é voltar até as práticas que incentivavam o uso de bicicletas, mas como fazer isso? Então você pode pesquisar de repente um presente, um futuro, um passado em outra comunidade, em outro grupo e por aí vai. Ou seja, não ficar preso, digamos assim, por esse determinismo da história, pensar a história como sendo algo que você pode fazer, fazer a partir da perspectiva do design, porque não pensar o design como fazer história. Na prática a gente pode chamar isso de projeto de transição, uma maneira de explicar isso. Projeto de transição é semear futuros alternativos a partir de passados e presentes alternativos, então visando tornar esse futuro mais próximo, uma espécie de transição gradual para futuros onde há futuros, porque a ideia de que a sociedade que está caminhando para o colapso não é um futuro, que depois que tiver o colapso acabou a sociedade. Vou mostrar alguns exemplos de projetos de transição que a gente tem desenvolvido lá no TFPR. Esse é um conceito que já está um pouquinho mais consolidado dentro da história do design prospectivo. Esse aqui é um modelo que a gente puxou lá da Carnegie Ballot University, que é o back casting. Antes de você pensar nas transições graduais, fazer um esforço de visão de longo prazo e pensar como será o horizonte de uma comunidade daqui a 50 anos. Quais seriam as utopias dessa comunidade? Materializar essas relações, seja através de legos, seja através de diagramas, seja através de teatro e por aí vai. E aí você pensar quais seriam as etapas. O back casting significa você ir voltando, quais seriam as etapas necessárias para chegar lá. Então em 2050 teria essas características, em 2040 teria que ter essas características, essas daqui se tornarem possíveis. E assim você vai fazendo até chegar nos dias de hoje e aí você presta atenção e vê puxa quais são as, olhando para esse caminho, quais são as ações que a gente precisa fazer no nosso horizonte de 10 anos que vão abrir futuros mais importantes e aí você priorizar essas ações. É uma ferramenta que combina uns elementos de planejamento de cenários com esse aspecto mais lúdico que o design traz na materialização das relações. Pode ser aplicado também como uma fase anterior de exploração de cenários para depois você fazer planos mesmo de transição, como esse projeto para a igreja Batista Agape. O estudante conversou com várias pessoas, fez uma visita, verificou os planos que a igreja tinha e principalmente os planos que ela não tinha, porque a maioria das organizações não tem planos de longo prazo. E aí pensou e focou na materialização da transição através do plano de ocupação do espaço, do terreno que eles tinham. Então pensou que em 2030 teria um sistema de coleta de chuva, em 2040 bosques e jardins verticais, um novo templo numa outra posição onde eles não estavam utilizando ainda, estacionamento subterrâneo, salas. Tem mais alguns detalhes que eu estou simplificando aqui no projeto, não veio ao caso de citar. Aqui um outro projeto eu estou simplificando para caramba também, foi um estudo que esses estudantes fizeram no assentamento do Contestado, do MST, perceberam que a primeira fase é de ativismo agroecológico para que a agroecologia se tornar uma questão aceita e interessante para a sociedade, não uma questão meramente política, como às vezes as pessoas colocam. Deslocar um pouco a questão do MST também para ser uma questão que várias outras organizações também estão empenhadas em desenvolver a agroecologia. Alcançar a distribuição de produção para centros urbanos, uma vez que já tem mais maior produção e por fim a agroecologia ser um conteúdo curricular para a escola primária para as pessoas entenderem desde cedo as suas relações ecológicas. Esse projeto aqui está vinculado à horta do Cajuru, que eu mostrei mais cedo ali aquela imagem. A Laísa, ela pensou num plano de cultivo sustentável, assim como um plano de consumo responsável de plantas alimentícias não convencionais, as PANCs. E é um projeto bem bacana que ainda não foi implementado, que são visões, prospecções de futuros, mas tem várias relações novas para a gente pensar que quando a gente come uma PANC não é só uma escolha entre essa espécie de planta ou aquela outra espécie. Quando você escolhe uma PANC você também está escolhendo uma produção que tem uma pegada ecológica menor por conta dessas PANCs serem nativas. Elas não são convencionais porque elas não são as mesmas plantas que são comidas no Brasil inteiro. As PANCs são nativas. Então sendo nativa ela está mais adequada para aquele ecossistema e então as relações ecológicas vão ser melhores para o ecossistema do que simplesmente você ter que comer banana no Brasil inteiro. Ou morango no Brasil inteiro, que é a coisa mais louca que tem. Morango, comprei morango aqui em Vitória, né? E o morango, nossa, morango gente, sabe como é que é o morango? Morango tem que crescer num clima frio, que nem no Brasil tem. No Brasil praticamente o único lugar que dá para crescer mais ou menos o morango é no Rio Grande do Sul, mas ainda assim muitas colheitas não dão certo. Hoje em dia o morango é assim, ele é plantado na Patagônia, ele cresce na Patagônia e quando está na fase de pré-colheita, que ele não saiu, eles trazem para o Brasil, da Patagônia para cá e distribui para os outros. Aí as diferentes hortas vão lá e plantam e termina a fase do... Imagina a pegada de carbono que tem esse trânsito, né? Fora, depois que plantou aqui vai distribuir para o resto do estado e tudo mais. Então é um impacto muito grande para a gente querer comer morango, né? É melhor a gente comer as pankas ou as outras, as frutas nativas, né? E o último exemplo de projeto de transição é esse muito louco aqui, que é o scrotian. Essas estudantes estavam interessadas em igualdade de gênero na moda, perceberam que existia uma desigualdade muito forte hoje, materializada, uma relação de desigualdade muito forte materializada através do scrotian, que é imposto à mulher, a mulher não pode escolher, não quer usar scrotian porque isso tem consequências no nosso convívio. Então elas resolveram criar o scrotian, visualizando uma sociedade em que o homem vai se relacionar com a moda da mesma maneira que a mulher. Então ele vai cuidar do seu corpo do mesmo jeito que a mulher. Então assim como a mulher tem que usar o scrotian para não cair os seios, o homem tem que usar o scrotian para não cair o escroto. E elas criam toda uma campanha imaginando um futuro onde o scrotian é uma coisa normal para mostrar que os homens estão preocupados sim com o bem-estar do seu escroto e eles utilizam inclusive diferentes tipos de scrotians para diferentes ocasiões, como o scrotian dry fit para fazer esportes. Tem o scrotian com bubo e tudo mais, com bojo, com renda, todos os detalhes do scrotian tem para o scrotian também. E ao fazer esse projeto ela causa um estranhamento, como eu falei, o futuro é uma dimensão do presente. Então muitas vezes os homens que tiverem um pouco mais sensibilidade ao ver um projeto desse podem começar a pensar o quanto eles estão contribuindo ou não para essas relações desiguais na moda ou em outros setores da sociedade, a moda sendo uma materialização evidente dessa desigualdade. E por fim, quais são as características ou a estética do projeto de transição? Qual estética? Que qualidades que o projeto de transição prioriza? Aí eu trago esse conceito de qualidades relacionais que ainda não está muito claro também, nem na literatura, nem no nosso discurso, mas que eu acho que amplia bastante a perspectiva estética, porque a gente não está mais falando de propriedades das coisas, né? Você não está mais olhando para as coisas isoladamente, quando você está pensando em projetos de transição, está pensando em qualidades das relações entre coisas, qualidades que emergem pela interação entre essas coisas diferentes. Então se a gente antigamente estava olhando para qualidades objetivas, você poderia mensurar numa interação como usabilidade, acessibilidade, durabilidade, utilidade, beleza, clareza. Agora a gente está olhando para qualidades que são relacionais, ou seja, depende da relação, cada relação vai ser diferente. E como eu disse, também tem o horizonte de tempo muito maior para você observar essas qualidades também, como a sustentabilidade, resiliência, igualdade, solidaridade, convivialidade, mobilidade, só para dar uma listinha inicial. Se você pensar que isso aqui poderia ser um novo horizonte estético, para você pensar como que você avalia, como você cria, como que você desenvolve algo focado na solidaridade enquanto um princípio estético. Como que se manifesta a solidaridade? Se você pega um projeto de um objeto para economia solidária, isso acontece bastante que eu tenho me envolvido com alguns projetos nessa linha. Você pede para um estudante de design, sem ter uma preocupação com relações, para ele representar solidaridade, ele vai cair nos clichês do tipo mãozinhas dadas, pessoas em volta. Mas isso é uma perspectiva que ainda está vendo a solidaridade como uma característica de um objeto. Eu vou fazer o objeto ser solidário, vou fazer aquela logo ser solidário, então ele vai ter a carinha solidária. Isso aqui é o que a gente está tentando deixar para trás, a gente está querendo pensar na solidaridade, não para ser expressa através de signos que sejam portados por objetos como a logo, por exemplo. A gente está pensando que a solidaridade seja vista realmente nas expressões, nas relações. Isso é um pouco abstrato, porque você está querendo falar "então tá". Então você está destruindo o design, a ideia de design, porque o design tem construído uma história de que nós criamos signos para as coisas, até a palavra design vem disso, dar signo. Mas veja, a gente também pode pensar que essas relações também podem ter signos. Então se eu estou aqui falando com um certo tom de voz, estou propondo ideias provocativas, estou criando uma relação com vocês. Isso tem uma estética também. Tem uma característica que pode ser percebida desse tipo de trabalho. Não necessariamente tem a ver com os meus slides dos anos 2000, que eu mal eu percebi no começo, que eu não tive ainda a oportunidade, talvez a coragem de mudar nesses anos todos. Os mesmos slides, o mesmo estilo, mas isso aqui é a ponta do iceberg, minha gente. Se você for comparar as preocupações que eu tinha naquela época quando eu criei esses slides que eu tenho hoje, eu fui um dos numiares da usabilidade no Brasil, tanto é que eu tenho um site chamado Usabilidoido, que é onde eu disponibilizo ainda esses materiais. E eu não estou mais pensando tanto nisso, agora estou mais pensando nessas coisas aqui já há alguns anos. Agora com design prospectivo veio a oportunidade de consolidar ou não. Isso tudo. Bom, não somos só nós que estamos pensando nisso, vou mostrar um exemplo de projeto da Carnegie Mellon University, trazer o discurso deles, que eles chamam de Transition Design, o design de transições. Eles têm um programa de doutorado focado nisso lá e eles têm visto isso também como uma nova mudança de paradigma dentro do design. Eles falam o seguinte, qualidades relacionais emergem de sistemas sociotécnicos. Sistema sociotécnico é uma palavra bem complexa, mas para uma coisa bem complexa também, que é essa imbricação que existe entre tecnologia e sociedade e que funciona, e que se você tira um pedaço continua funcionando, tira outro continua funcionando. Ou seja, existe uma capacidade regenerativa nesse sistema sociotécnico gigantesco, que torna eles muito difíceis de serem transformados. E a Carnegie Mellon University utiliza o design como uma maneira de você pensar essas transições, de materializá-las, envolver vários atores humanos e não humanos nessa transformação para que não seja um projeto de transição, daí existe essa discussão sobre transição já em outros campos, que não seja o design, mas eles são muito pontuais. Então isso aqui é um projeto de transição da nossa companhia elétrica do Paraná, Copel, para a mobilidade elétrica. Eles instalaram vários postos de recarga de energia elétrica acompanhando uma das PR do estado, e se você quiser viajar com um carro elétrico, você pode abastecer desde que você fique nessa rodovia. Isso não vai fazer um impacto muito grande, porque não adianta ter só o posto, tem que ter o carro com preço competitivo, tem que ter a vontade muito grande do consumidor de pagar mais, porque inicialmente essa tecnologia é mais cara porque é poucas pessoas que estão comprando, a escala é menor, precisa ter a rede de manutenção, precisa ter uma série de elementos que ainda não estão disponíveis. É claro que do ponto de vista de marketing, você fazer esse tipo de ação é excelente, pode até ajudar o diretor da Copel a se releger no estado como um deputado, por aí vai, e é por isso que essas coisas acontecem. Não disse isso. As qualidades relacionais mudam quando há pressão vinda de todos os lados no sistema sociotécnico, quando as pessoas saem às ruas, mas não só isso, quando existe pressão financeira, quando existe pressão de órgãos internacionais, quando existem pressões do próprio sistema natural, quando começa a ter desastres na nossa sociedade, as pessoas vão para a rua e pedem mudanças sistêmicas. E agora, voltando para Copel, um projeto que a gente desenvolveu lá quando eu estava na PUC, projeto Copel+, projeto muito bacana de pesquisa em colaboração com uma empresa, que era para tentar pensar como é que a gente pode mudar o sistema sociotécnico da geração de energia para que tenha alternativas no horizonte de energia renovável. Então, eles sabiam já que não adiantava só mudar e colocar o posto de eletrocarga, porque, enfim, dentro da Copel tem muita gente competente, não tem só esses diretores malucos. Tem pessoas que são responsáveis e estão vendo essa necessidade de pensar sistemicamente. Então, a gente fez um projeto que durou mais ou menos, está durando ainda, não terminou, faz menos ou um ano esse processo que está aparecendo aqui, várias oficinas, várias atividades de prospecção de futuros, de presença, de passados, visando identificar quais eram essas principais pressões que o sistema de distribuição de energia estava recebendo. Então aqui você vê o resultado desses debates, dessas discussões, dessas oficinas, são vídeos e animações que mostram os problemas do setor elétrico. Então todos públicos, nenhuma companhia de energia elétrica até hoje fez isso, falar das dificuldades que elas enfrentam, as pressões que eles estão sofrendo e como é difícil você passar para um sistema. Não é assim "ah, tá, fecha a hidrelétrica e abre um monte de, sei lá, energia eólica, esses cataventos gigantes". Tem outros impactos ambientais e fora isso tem a questão da transição que é cruel. O problema principal é o seguinte, a energia elétrica no Brasil é extremamente barata se você comparar com outros países. Por que ela é barata? Porque ela é centralizada, só tem uma empresa só produzindo energia para todo mundo, por isso fica barato. A hora que você fala "se você quiser", e o Brasil fez isso, tem uma política pública que permite que você crie a sua própria geração de energia e se você conectar no grid, a empresa de energia elétrica vai ter que pagar para você porque você está gerando energia para o grid. Ou seja, você tem um incentivo muito bom financeiro que dá um resultado direto, imediato para o seu investimento em geração de energia. E o que está acontecendo é que essas pessoas estão saindo do grid, a gente fala isso. Essas empresas, shopping centers, estão instalando uma malha de teto solar e você fala "nossa, que legal, finalmente nosso planeta vai ter um futuro". Quem vai ter futuro são essas empresas que estão fazendo isso, esses gigantes, quem tem muito dinheiro para investir e fazer isso. Porque se você quiser fazer isso na sua casa, no seu barraco, você não vai ter o dinheiro para poder pagar por isso, porque por enquanto ainda é caro o investimento inicial. E aí o que acontece, a cada vez que um desses grandes sai do sistema, o custo fica maior para quem fica no sistema. Então, imagina, se sair metade das pessoas que estão no sistema, o preço da energia elétrica vai dobrar para quem estiver dentro do sistema. Dobrar, na verdade, não, vai multiplicar muito mais porque dá uma economia de escala. Então a ideia de você colocar um monte de painezinhos solares, espalhar, quanto mais painezos solares por aí, se você achar que painel solar vai fazer diferença, você está pensando como objeto, você não está pensando em relações. Se você pensar em relações, você vai pensar que para aquilo ali ser sustentável tem que ter toda uma mudança no sistema sociotécnico. É exatamente isso que esses vídeos tentam inculcar na cabeça dos empreendedores que vão participar, que na verdade já estão participando desse programa. Então, por fim, refletindo sobre o papel do designer, no design prospectivo ele é mais um articulador de relações e um facilitador de transições. A gente ainda não tem muita noção disso, tem poucos casos para a gente mostrar um projeto do designer atuando dessa maneira. O mais avançado até agora que eu encontrei foi o projeto da Rafaela Pérez que eu mostrei para vocês, mas a gente espera que saiam outros projetos logo mais e que a gente consiga lidar com toda essa problemática que a gente tem proposto para nós mesmos lá no programa. Só que não vou explicar todos os detalhes, é uma imagem bem complexa, uma síntese que a professora Fernanda Bota fez das nossas discussões lá no programa de pós-graduação em design. E o que eu reflito a partir disso aqui, que é mais complexo e simplifico, uma linguagem mais acessível, é que no design prospectivo a gente trabalha com possibilismo ao invés de probabilismo, ou seja, confiamos mais em qualidades do que em quantidades, confiamos mais em abrir possibilidades do que em calcular probabilidades, porque a gente acredita que sempre tem alternativas, nesse sentido somos otimistas. Focamos em relações de longo prazo, valorizamos qualidades relacionais que se cultivam em relações de longo prazo e tentamos envolver projetos com escopos cada vez mais amplos. É isso gente, muito obrigado pela atenção até agora, vamos lá se vocês quiserem comentar