Então essa aula, olá, eu sou professor Frederique da UTF-PR, essa disciplina de metodologia da pesquisa e esta aula sobre Introdução ao Meta Design. É uma aula que vai dar uma visão geral sobre o assunto e apontar referências para quem quiser se aprofundar mais. No fundo dessa fala agora já tem uma música tocando que é "Tô", é uma canção composta em 1976 pelo Tom Zé, e essa canção ela faz uma crítica sobre a realidade. É difícil de entender daquela época da ditadura militar, que você havia uma diferença muito grande entre aquilo que a notícia e a séria pública falava sobre a realidade que você via no seu dia a dia. Por isso, isso gerava muita confusão. Por isso que ele vai falar no verso "Eu tô te explicando pra te confundir, eu tô te confundindo pra te esclarecer". Para que você veja a tua realidade, você precisa se confundir com ela e se perguntar se realmente aquilo ali é real. Ele faz parte de um movimento chamado Tropicália, que vai gerar as canções de protesto mais criativas da época. Ele não recebeu o crédito devido na época pelas suas criações, mas a gente faz aqui a referência pela profundidade também desse pensamento, que é o core, talvez o cerne, da abordagem da Tropicália, que é fazer a luta através da chacota, do hibridismo, da antropofagia, das misturas e tudo mais. Que era o que era possível fazer dentro de um cenário de censura. Eu vou agora passar para um autor da área do design, que tem uma frase que é muito parecida com essa frase do Tom Zé, que ele diz assim, uma definição de design é "Design é fazer o design de um design para produzir um design". O John Haskett, nesse livro traduzido para o português, design, muito bom para quem está começando na área, ele vai dizer que a maior maneira de você entender o que é design é eu te confundir, te mostrar a polisemia da palavra. Então design pode significar tanto um conhecimento, uma área do conhecimento, quanto uma maneira de projetar um processo de trabalho para produzir um produto. Então a mesma palavra design pode servir para esses vários significados. Então a primeira frase que dá aqui para frente através de um exercício prático com os nossos estudantes é que eles experimentem esses diferentes jeitos de fazer design. Então a gente utiliza o método Lego Serious Play, que é uma maneira de criar e pensando, fazendo tudo junto, e a técnica específica What the Duck, que são pacotinhos menores de pecinhas separadas para construir patos. Então esse é o primeiro exercício para os estudantes construir um pato igualzinho a esse da foto, começando pelos pés, terminando pela cabeça. Os estudantes muitas vezes alguns conseguem, outros não conseguem fazer exatamente igual. O ponto é que eu defini o que era certo, e o que era diferente disso era o errado. Nesse caso o design já estava definindo tanto no produto, quanto no processo, quanto no projeto. Apenas poderia se considerar, né, seria design fazer o uso de um pato para produzir um pato? Eu acho que sim. Fazer, considerar o objeto, o produto, o processo como um conhecimento e ter contato com esse conhecimento, que é o que os estudantes fizeram aqui, isso também é design. Por mais que eles não tenham tido criatividade na execução ou definido o projeto, ainda assim existe criatividade em entender aquilo como um objeto de conhecimento. E por si só eu também considero como design, assim como John Haskett. Agora, a dimensão de projeto, que talvez é a mais importante do design, acontece quando se pede para montar um pato qualquer, um pato diferente daquele pato que apareceu na imagem. Então nesse exercício é uma variabilidade muito maior de patos. É raro você ter um pato igual a outro dentro de uma turma de 50 pessoas. Isso é interessante porque demonstra também que existe uma liberdade quando você abre a possibilidade de pensar design como projeto e não só como um conhecimento teórico, mas também como um conhecimento aplicado na prática de um projeto. E aí existe a possibilidade da pessoa trazer a sua experiência de vida e interpretação do que é pato, dar sentido ao pato, né. A palavra design pode ser traduzida como dar significado, dar sentido para as coisas e é nesse nível em que há talvez um diferencial maior em relação a outras áreas. Mas aqui eu tô querendo discutir que design também pode ser outra coisa que não seja só projeto, né. Então a pergunta agora é, seria design, fazer o design de um pato para produzir um pato? Quer dizer, aqui a gente já respondeu, né. Eu acredito que sim, que mesmo que o processo de trabalho e o produto já esteja sendo o que é o pato do pato, né, ainda assim o design ele entra numa dimensão de projeto. Isso normalmente quando você tem uma divisão de trabalho entre quem projeta e quem executa o processo de produção. Agora, eu acredito que é possível também o design projetar esse processo de produção, né, que é esse exercício na sequência, né. Projetar um pato com a definição do processo de construção, né. Então a equipe, as equipes vão desenhar ou escrever como que deve ser produzido um pato, vamos fazer isso numa folha de papel que pode ser compartilhada com outra equipe e a outra equipe vai executar o projeto, o plano e no final da tarefa as duas equipes vão comparar o resultado daquilo que foi planejado com aquilo que foi atingido. Muitas vezes acontece de uma equipe não definir o processo muito bem e o objeto acaba tendo uma variabilidade maior. Na equipe de cima você vê uma definição melhor daquele projeto do que na equipe de baixo, né, porque ali tem etapas do processo bem definidas, embaixo apenas se define o produto, não se fala como chegar nele. No caso os construtores foram bem sucedidos, tá, bem parecido com o projeto, mas nem sempre isso acontece. Então é possível sim fazer design de um design para um design para um design de um pato, né, que é o que a gente acabou de ver. Agora imagina a gente incrementar ainda mais essa formalização do conhecimento do processo para que ela aconteça numa máquina semi-automatizada ou automatizada, né. Então é um exercício mental, fecha os olhos e pensa numa máquina para produzir patos e diversos tipos de patos, uma máquina programável. Quem conhece o LEGO Mindstorms talvez tenha uma ideia parecida com essa daqui que o Daniel Benedeteli teve, ele postou no YouTube esse vídeo que é um vídeo muito interessante que mostra o funcionamento de uma máquina que constrói LEGO, patos de LEGO, mas que é feita de LEGO também usando esse kit LEGO Mindstorms que é um kit fantástico para aprender programação e robótica, mas também para aprender design. Essa máquina ela faz design também, né, só que ela faz um design pré-programado pelos designers da máquina. Isso levanta a questão então será que é possível projetar uma máquina para projetar qualquer coisa que não seja necessariamente um pato? Que tipo de design é esse que a gente tá falando, né? Bom, essa foi uma ideia que os fundadores da área do design, os pensadores que justificaram a pesquisa em design como o Herbert Simon que escreveu o livro Ciências do Artificial, eles tinham na cabeça essa ideia quando começaram a fazer os primeiros experimentos dessa ciência do artificial. Junto com o Shaw e o Newell eles criaram um dos primeiros algoritmos de inteligência artificial, que foi o General Problem Solver em 1957. Ele conseguia resolver problemas lógicos bem simples do tipo torre de hanoi, como é que você faz para mover discos coloridos de uma antena para uma outra, que tá no canto, seguindo uma série de regras relativas às cores que não podem se repetir, não pode estar juntas e tudo mais. É um desafio lógico, matemático que esse General Problem Solver conseguia resolver, assim como vários outros. Então ele era uma inovação porque ele tinha a separação entre a camada de abstração da definição do problema e a camada de abstração da solução. A definição do problema poderia ser diferente para cada problema, e assim também se encontrariam soluções diferentes. Inspirado no trabalho do Herbert Simon, de outros que acreditavam que a inteligência artificial poderia automatizar o processo de design como todo, o Nicolas Negroponte no MIT Media Lab fez vários experimentos, dentre eles a criação de uma uma jaula de um viveiro para hamsters que se modificava na medida que os hamsters iam se movendo dentro desse viveiro. Havia uma detecção de movimento por câmeras e havia também uma atuação sobre a disposição desses cubos metálicos. Um braço mecânico movia esses cubos de lugares diferentes do viveiro para responder às vontades e desejos dos hamsters. Esse foi o projeto Software Architecture Machines, desenvolvido em 1975, que envolveu outros experimentos, que foram fortemente criticados depois da sua publicação e também os outros experimentos que tentaram estender essa ideia de uma máquina de projetar 100% automatizado. Verificaram que o resultado, o objeto criado era inútil ou não atendia aos requisitos ou cerceava demais a liberdade de pessoas. Elas se sentiam como ratos dentro de um ambiente projetado automaticamente. Então, essa automação completa acabou sendo deixada de lado a partir dos anos 80 e deu lugar a uma automação gradual através do Computer Aided Drawing, Computer Aided Manufacturing, CAD/CAM, CMC e vários outros que foram automatizando pedaços do processo de design. Pedaços do conhecimento do design foram formalizados. E isso foi dando uma, abrindo novas possibilidades de atuação, claro, em maior escala, até o ponto que nós chegamos hoje em dia a ter movimentos físicos que antes tinham que ser feitos por artesãos ou feitos em colaboração entre operários e máquinas, hoje são feitos por robôs, braços mecânicos, impressoras 3D que conseguem produzir, de maneira razoavelmente autônoma, um objeto extremamente complexo como uma ponte toda tridimensional, uma ponte feita de metal com formato orgânico que foi instalada em um dos canais de Amsterdã, na Holanda. Esse é um projeto que demonstra o nível de estadarte da automação no projeto de design, mas que não consegue completamente automatizar os movimentos cognitivos ou conceituais que o projeto se funda, que é a ideação, a conceitualização. Existem algumas máquinas que ajudam, que apoiam, mas quem faz esse processo essencialmente são a equipe de projeto. Quando há uma área de atuação de design que é considerada mais manual, de trabalho mais manual, há também maior esforço para automatizá-la porque acredita-se que é mais fácil, porque tem menos movimento cognitivo simbólico. Isso em parte se dá pelo preconceito relativo a essas tarefas, como por exemplo o design de sobrancelhos. Muitas vezes nem considera que é verdadeiro design por não ter esse trabalho intelectual, mas ele tem sim, só não é reconhecido. Tanto é que se você pegar uma máquina de fazer sobrancelhos como o Benefit Brown Gene, você vai ver que o resultado é reisível, é horrível. Essa imagem do lado direito mostra como que eu fiquei depois de executar esse prítimo. Eu me senti insatisfeito e outras pessoas às quais eu mostrei disseram que não fazia sentido esse design de sobrancelhos. Então existe uma produção de conhecimento bem específica no design de sobrancelhos que a automação não consegue capturar, que é o pensamento crítico, na prática crítica. O design de sobrancelhos precisou observar o seu rosto, perceber as atividades, criticar o que pode melhorar, perceber o que está desalinhado, o que não está expressando a sua identidade. Isso envolve uma percepção muito aguçada da personalidade, da história da pessoa, do contexto daquele projeto que uma máquina hoje não consegue fazer. Então a máquina não consegue automatizar a crítica, mas ela consegue automatizar a criatividade. Principalmente quando a criatividade é você misturar coisas que já existem e criar coisas derivadas, parecidas com as que já existem, tem um nível de originalidade baixa. As inteligências artificiais hoje já estão chegando fortemente na área de ilustração, pintura, criação de imagens através de softwares como Crayon, Dali, Mid Journey e outros que permitem a síntese de imagens a partir de queries, de entrada de texto, tal como um buscador como o Google, só que nesse caso com alguns tipos de comandos que você pode ver que vão puxar diferentes estilos, diferentes ações. No nosso caso, desse exemplo da imagem, nós queríamos compor uma imagem que representasse a possibilidade de trabalhar com movimentos sociais e ainda assim pagar as suas contas. E todas as imagens puxam por referências tradicionais aos movimentos sociais, que é o vermelho, que é a coletividade do povo, mas também puxam a questão de a representação das células ou então de algum tipo de cálculo. Isso é um exemplo de algo que está tendendo a crescer cada vez mais, ferramentas substituindo a criatividade por um processo automatizado ou semi-automatizado. Isso gera preocupação entre designers se eles vão perder o emprego deles logo logo, mas a gente acredita que o pior que é isso não é a perda do emprego, mas a precarização dos empregos existentes. Então a gente fez um teatro-fórum em 2020 junto ao gremio dos estudantes de design da FAUSP para denunciar as possibilidades futuras de uberização do trabalho de design. Então na peça tem uma plataforma de criação de identidades visuais através de uma inteligência artificial e o cliente pedi, especifica o projeto e a inteligência ao invés de gerar automaticamente, ela vai repassar o trabalho para o Lumpa designer, que é o trabalhador precarizado dessa plataforma. Ele vai ter que produzir uma logo em apenas duas horas para ganhar cinco dólares, o que é um valor muito baixo. Ele não vai ter décimo terceiro, não vai ter seguro saúde, não vai ter nenhum benefício de trabalhador porque ele não é considerado um empreendedor pela plataforma, tal como o motorista de Uber, tal como o entregador do iFood e de outras empresas que são chamados capitalismo de plataforma. Então a gente chamou atenção para esse processo de modo que designers percebessem que para eles serem reconhecidos como designers, para o design deles serem reconhecidos como algo diferente daquilo que é feito por uma máquina, eles precisam se fazer designers politicamente, socialmente, economicamente. Isso vale também para o meta design, só que o meta design tem um potencial de produção de valor maior na sociedade atual e que tende a aumentar e também tem uma sobrevida em relação a esses processos de automação. Afinal de contas quem automatiza é o meta designer. Então a gente já vem estimulando os nossos estudantes a pensar e se formar como meta designers há muito tempo. Eu comparo o perfil de um designer que produz um produto, não precisa sair do escritório para isso, porque é um usuário que vai utilizar, só precisa ter dados de um contexto mais ou menos definido daquele uso. Já o meta designer não, ele tem que estar aberto para várias modificações, mudanças que podem acontecer na sociedade como um todo, por isso ele faz pesquisas etnográficas, pesquisas de campo, observa tendências sociotécnicas e aí gera propostas que entram dentro de sistemas, ecologias, que envolvem vários produtos, vários serviços. O objetivo é oferecer uma estrutura de design para que designers amadores ou como eu prefiro e usiners, que é a mistura de usuário com designers, possam continuar o projeto. O projeto do meta designer não termina nunca, ele não é entregue como um job, como entregável, ele é um processo social. E o meta designer então, ele se coloca numa posição que é mais difícil de automatizar, porque ele está trabalhando com valores sociais, com sociologia, antropologia, psicologia e várias áreas que vão ser necessárias para pensar esses sistemas sociotécnicos. Porém, os meta designers também não vão necessariamente ter a segurança total de que o trabalho deles não vai ser precarizado, que é justamente o que acontece nessa peça de teatro, quando o lumpa designer consegue finalmente entrar em contato com o designer que criou essa plataforma, o meta designer. E ele denuncia o meta designer falando assim "olha, você criou uma plataforma de precarização do nosso trabalho, você traiu a sua classe, sua profissão, mas um dia pode acontecer com você, vai que alguém cria uma plataforma de criação de plataformas, talvez você perca o seu emprego ou então você tem que trabalhar por cinco dólares que nem a gente está trabalhando". O meta designer, é claro, ele fala "ah não, isso vai ser ótimo, você pode ser um empreendedor e criar sua própria plataforma, vai lá, cria plataforma de criar plataformas, seja você também um capitalista, um bom capitalista". E é claro que essa possibilidade não está disponível para todo mundo, ninguém tem acesso livre ao capital como teve, por exemplo, o meta designer devido aos seus privilégios. Então essa peça tenta conscientizar designers de que eles podem se tornar meta designers, mas também que eles precisam ser meta designers críticos para evitar essa precarização do seu trabalho. Isso já está acontecendo hoje, por exemplo, na disseminação cada vez mais ampla de técnicas e métodos que simplificam o processo de design e reduzem ele a uma série de etapas que são executadas mecanicamente e que não precisam ter a presença de profissionais de design. Então a gente vê no design sprint, no design thinking e outras relacionados que há um produto, um resultado final inferior ao aquele que poderia ser produzido por alguém profissional, mas se a empresa não está interessada, se a organização não vê valor nisso, esse tipo de processo se reproduz cada vez mais. O que a gente pode ver também é o caso oposto de empresas que estão contratando profissionais de design, mas estão colocando ele dentro de estruturas também muito rígidas de projeto, muitas vezes influenciadas até por essa simplificação do design thinking, do design sprint, que é o chamado design ops, design operations, que é a otimização dos processos de trabalho de modo que os designers não tenham muita liberdade de criação, que fique mais pensando em design como um processo e não como um projeto nem tão pouco como um conhecimento. Alinhados que estão dessas dimensões, designers acabam executando apenas ordens e ideias que vêm de uma hierarquia mais definida. O design ops muitas vezes dentro de uma organização que está cada vez mais ampla, tem muitos designers, e para conter essa complexidade e a criatividade possível que esses designers trazem, há uma lógica hierárquica que vem lá das fábricas, lá do fordismo, que passa pelo toyotismo, que se transforma em desenvolvimento ágil, mas que não muda a lógica de reduzir a criatividade do trabalhador para ele entrar dentro de uma lógica de controle da organização, uma lógica de extração de lucro. Isso se traduz, por exemplo, na formação de sistemas de design orientados pelo atomic design, que é uma abordagem para criar esses sistemas. O atomic design vai dizer o seguinte, organize as peças, os materiais do que você vai construir antes de construir, assim quando alguém for construir essa pessoa pode ser construída por outra. E quem chegar de novo vai poder saber o que construir apenas olhando essa disposição das peças de Lego organizadas, sabendo exatamente o que pode construir. Exatamente significa com menos possibilidade de construção do que se o Lego tivesse bagunçado na mesa. Então, a gente vê hoje uma espécie de super valorização dos sistemas de design, como se fosse um santo grau da produtividade, do branding, para padronização, que reduz completamente a criatividade das equipes de design, colocando elas como se fosse mais uma engrenagem dentro de uma grande máquina de produção de aplicativos, de produtos ou de serviços. Aqui nós vemos o exemplo do padrão digital do governo federal, que é muito especificado. Isso é interessante para quem não é designer e vai trabalhar para o governo federal, que é um problema sério, tem pouquíssimos designers. Então, substitui a necessidade de profissionais de design, o meta designer que cria esse sistema de design, de uma certa maneira também está eliminando a possibilidade de designers profissionais trabalharem, a necessidade de designers profissionais trabalharem para o governo federal. Isso é uma tendência mais ampla na nossa sociedade, essa obsolescência da pessoa e da criatividade da pessoa não é só uma restrição do design, pelo contrário, é uma restrição da sociedade como todo. Tanto é que nós temos aí algo muito mais amplo que o meta design, que é o metaverso, que é uma proposta de uma outra segunda vida virtual totalmente mediada por sistemas informáticos, que não dá criatividade para os sujeitos transformarem o seu ambiente de convivência social. E pelo contrário, vai tender a levar essa convivência para os comportamentos mais lucrativos do ponto de vista de quem criou a plataforma. Então, a gente já tem experiência de muitos anos de organização e conversas baseadas no ódio dentro da plataforma Facebook, não vai ser muito diferente no metaverso, talvez outros comportamentos sejam mais lucrativos do que esse, mas o fato é que a manutenção das práticas de ódio dentro das redes sociais é em função de uma escolha de projeto. Existem definições de regras, de políticas de conduta, mas sempre tem também as áreas cinzas, por exemplo, a piada preconceituosa é permitida e isso vai gerando uma mudança nos comportamentos gerais da sociedade, que pode, por exemplo, afetar eleições presidenciais como aquelas que a gente está passando agora neste momento no Brasil. Então, para a gente aprofundar no meta design, a gente precisa entender o contexto do todo o texto ou o meta design em volta de todo design. Perceber que o objeto em si já não é a única preocupação para designer, mas o que está em volta desse objeto. Essa é a preocupação do meta designer. A teoria do meta design foi formulada inicialmente pelo Fanon, que é um professor da escola de UMA na Alemanha, depois ele publica um artigo que vai definir o que é esse processo de projetar o próprio processo de trabalho para atingir uma meta mais complexa, algo mais complicado. Tem o exemplo clássico do Antônio Gaudi, que é o arquiteto que cria a Sagrada Família, através de um modelo que ele constrói de cima para baixo, pendendo do teto, ele vai amarrando fios e colocando peso de madeira, colocando esses tecidos para visualizar uma espécie de uma maquete de como seria a distribuição de peso entre as mesmas e arcos dessa construção maravilhosa que até hoje, quase 200 anos, não foi ainda, quase 150 anos, não foi ainda completada. Já numa perspectiva diferente, falando sobre o design think, não sobre meta design, mas também se aplica, eu acho na minha opinião que se aplica ao meta design, Roger Martin vai perceber que esse processo de desenhar o próprio processo é muito interessante para os negócios que visam lucro a curto prazo. Então ele vai descrever negócios que originalmente eram mistérios, define heurísticas, princípios de como funcionamento, esses heurísticas definem algoritmos bem definidos de processo para execução independente de quem estiver trabalhando, por fim, isso é automatizado num código que é executado através de sistemas de hardware ou software. Nesse processo de formalização do conhecimento há uma perda de qualidade no produto final, por isso que ele diz que o design de negócios, diferente da engenharia de negócio, da administração de negócios, ele muitas vezes vai fazer o caminho contrário de informalização do conhecimento, de abertura de possibilidades para a qualidade do serviço ou do produto pela confiança nas pessoas, na capacidade das pessoas de projetarem os seus modos de trabalho e os seus processos de trabalho. Portanto, o escopo do meta design, ele envolve não só a definição de um processo, mas de quem está nesse processo, os corpos específicos, os papéis que cada um faz, os espaços em que essas pessoas se encontram, as ideologias que elas acreditam, as metodologias que implementam essas ideologias e as ferramentas que são usadas para apoiar as metodologias. Então, meta design é basicamente todo o contexto do design, parece muito bacana, parece muito interessante, mas existe também um aspecto negativo ou perigoso ou preocupante do meta design, que é o foco da crítica do pesquisador e arquiteto Caio Vassão, um colega meu que escreveu um livro maravilhoso em 2012 ou 2013 sobre esse assunto, baseado em vários autores, mas principalmente no Paul Virilho, que é também outro arquiteto que faz uma crítica à modernidade, identificando meta design como essa tendência geral de formalização e controle da política moderna no capitalismo. Então, o Virilho fala que o meta design pode reduzir as liberdades individuais e cooptar as liberdades coletivas, gerando um sistema parecido com aquelas distopias que a gente vê nos filmes de ficção científica. Um filme que não é ficção científica, na verdade é muito mais uma interpretação da realidade que a gente já vive, é o videoclipe para a canção de "Bind Me" do grupo Roscoop. Esse vídeo vai mostrando o cotidiano, o dia a dia de uma cidadã no Reino Unido, mostrando como existem várias camadas de informação, camadas de estruturas, muitas vezes invisíveis ou visíveis, que vão interpelar o seu corpo humano, os seus sentidos, e vão alterar o seu fluxo sanguíneo, as suas emoções, gerando um certo cotidiano robotizado, que essa pessoa vai passar com uma série de etapas e processos pré-definidos que podem ser considerados meta projetados, ou seja, flutos de um meta design, um meta design coletivo que vai fazendo as pessoas sentirem cada vez mais parte de uma engrenagem, ou melhor, a engrenagem de uma máquina gigante, que seria a cidade ou talvez a própria sociedade, nação. Então, é interessante que essa canção nos faz pensar sobre a liberdade que a gente tem dentro de uma sociedade como essa. Pensando sobre esse problema da liberdade, o Caivação vai fazer uma proposta alternativa e complementar ao meta design, que é arquitetura livre. Ele vai propor isso na minha interpretação, que é esse diagrama aqui que a gente publicou no livro design livre em 2012. A gente pensa no meta design como sendo um processo constante de redefinição do design e não um processo que foi antes do design, que é o que pensa de João de Moraes, num outro livro chamado Meta Projeto. Ele vai definir o meta design como uma fase anterior ao projeto, uma preparação que envolve também a definição dos contextos, mas que não é revista. No meta design, na arquitetura livre, o meta design é constantemente revisto porque ele faz parte da sociedade, não do projeto do designer. O meta design é uma tarefa coletiva que se torna uma questão pública eventualmente. Isso é mais ou menos o que a presidenta Dilma Rousseff estava tentando explicar nessa fala pouco entendida sobre o Pronatec. Ela disse assim "não vamos colocar meta, vamos deixar a meta aberta, mas quando atingimos a meta vamos dobrar a meta". Basicamente, isso é o princípio básico da arquitetura livre, o projeto como uma pergunta e não como uma resposta. Então, ela estava fazendo uma pergunta, mas que já contém uma condição de resposta. Ela diz assim "a gente quer dobrar a meta, não sabemos qual vai ser essa meta". Isso é um pensamento lógico também, só que do jeito que ela escreveu ou falou, ficou parecendo meio lógico, mas faz sentido você definir que você vai dobrar tudo aquilo que você tiver feito daqui a um tempo, mesmo que você não tenha feito o que você imaginou. Qualquer coisa que você conseguiu fazer dobre. Isso é uma arquitetura livre da liberdade, mas ao mesmo tempo cria um determinismo indireto do que se vai fazer no futuro. Exploramos então essa ideia da arquitetura livre no livro livre, trouxemos para o contexto do design de produto, design gráfico, demos vários exemplos de como que o open design estava chegando na profissão, falamos sobre a importância da questão política, por isso traduzimos open design como design livre e falamos muito da questão da caixa preta, como essa caixa poderia ser aberta, perguntando-se sobre como se faz design e quem pode fazer design. A caixa transparente do design livre é essa que é permeável, várias pessoas que entram podem sair, podem aprender sobre como fazer design participando de um projeto de design público. A gente tem como diferencial abrir a caixa preta do processo, assim como o software livre já abriu a caixa preta do produto. Então a gente tenta articular o meta design como parte de uma lógica de produção de liberdades coletivas na nossa sociedade. Nós focamos bastante no design de metodologias, métodos e ferramentas porque acreditamos naquela época que isso era o core ou cerne do processo de design. Depois com o tempo verificamos outras questões que eu não vou abordar aqui pela brevidade dessa apresentação. Vamos comparar o que é metodologia, métodos e ferramentas através de livros como o do John Chris Jones Design Methods, tem uma distinção fundamental, embora no jargão profissional ou mesmo na academia haja confusão. Metodologia não é um processo, não é uma série de etapas, é o estudo crítico dos métodos a partir de uma perspectiva teórica. Então teoria é fundamental para metodologia, algo que muitas vezes é ignorado. Já o método em si é mais votado para uma prática e aí sim ele é uma estrutura coerente de técnicas para atingir o resultado. Já a ferramenta ela pode encaixar em vários métodos e metodologias porque ela tem um propósito múltiplo, ela tem uma ação específica formalizada ali, mas ela pode atender vários outros tipos de atividades e propósitos. Então recapitulando e colocando já de maneira mais explícita, a metodologia é composta de visão de mundo, leitura de situação, base teórica, experiência prática, formalização do conhecimento e por fim o que fazer com isso e o que se deve fazer com isso que a atitude ética. Um exemplo é o design centrado no usuário que muita gente descreve como uma série de etapas ou um processo, mas na verdade ele tem no seu CERN uma abordagem teórica que parte do princípio que o sistema deve ser projetado a partir do modelo mental do usuário, ou seja, como o usuário pensa a respeito desse sistema. Para compreender esse pensamento tem que fazer uma pesquisa empírica e aí a interface tem que ser construída a partir dessa pesquisa empírica, tentando simplificar e aproximar os modelos do usuário com o modelo da máquina, que é representado de maneira metafórica com essa imagem da capa do usuário entre um computador e uma pessoa e a vontade de criar uma ponte entre os dois para eles pensarem juntos. Isso é o CERN do design centrado no usuário, o resto que vem depois são dos dobramentos métodos específicos criados a partir dessa metodologia. O método aí sim são atitudes que se demonstre eficazes numa sequência de experimentos, você fez, deu certo, você define aquilo como método para outras pessoas utilizarem também e aí pode envolver etapas e passos a serem de hipidade, até a palavra rodos, compõe a palavra método em grego, significa caminho. Agora o método pode também ter conceitos abstratos que não sejam necessariamente orientando a etapas ou processos ou passos, né? Por exemplo, você pode ter um método que estimula a descoberta, a serendipidade e isso significa que você não vai ter passos pré-definidos, isso também é um método e isso também tem um critério de rigor que é se deixar levar pela situação, isso é um critério de rigor de como é verificar se as etapas estão sendo executadas nos conformes, depende do método, né? Então o método não é necessariamente uma série de etapas e processos, mas isso é bem característico da maioria dos métodos. Vejamos aqui a prototipação interativa, que é um método bastante popular no design, prototipom significa forma primitiva e a ideia é que você vai formalizando, melhor dizendo, materializando essa forma primitiva mesmo que você não saiba como ela deveria ser, porque ao fazer você vai descobrir novas ideias a partir da interação com aquele objeto materializado. Então a cada nova interação, que não é repetição, né? A interação tem um avanço a cada vez que repete, o conceito daquele prototipo vai se tornando mais robusto, tal como nesse exemplo do desenvolvimento dos vários prototipos para chegar no famoso controle de videogame do Playstation 1. A ferramenta por si só ela é composta de um conhecimento formal colocado à mão, ela não é um método, tem gente que confunde figma com prototipação, figma é uma ferramenta de prototipação, assim como várias outras, assim como o material usado para fazer aqueles modelos de controle de videogame. Agora as ferramentas elas têm funcionalidade genérica, elas podem ser usadas para várias coisas, inclusive que não seja prototipação, mas elas sempre vão ter um modo de operação eficaz, vai funcionar bem, não vai funcionar mal e aí você vai ter que descobrir como funciona. Quanto mais automático, o mais mecanismos automáticos tiver nessa ferramenta, mais rápido vai ser essa aprendizagem. Então a gente desenvolveu uma ferramenta semi-automatizada do UX Cards lá no Faber Ludens, naquela época do design livre, ela foi desenvolvida como projeto livre, tem o código aberto do SVG para quem quiser modificar e transformar em outros baralhos, em outras propostas, tem o PDF também para baixar e tem a versão do UX Cards no Miro para quem quer trabalhar com equipes remotamente distribuídas. O UX Cards ele divide o conceito de um projeto de metodologia e método. A metodologia é essa sequência de métodos que se constrói, que pode ser linear, pode ser circular, dependendo da intenção daquela equipe, mas cada carta é um método, é uma parte desse processo. Então saber a diferença entre metodologia e método é fundamental para usar o UX Cards, ele também ajuda a entender essa diferença na prática. Agora ele tem um mecanismo automatizado que é a definição de entradas e saídas de cada método. No topo de cada carta tem o que precisa para fazer o método, embaixo o que você resulta, o que você consegue com aquele método. Aqui nós temos um exemplo que eu fotografei em sala de aula de estudantes que definiram o brainstorming antes do mapa conceitual, porque foram sugeridos pela entrada e saída dessas cartas. O mapa conceitual fala que precisa de ideias e brainstorm, quer dizer cita um outro método, isso nem sempre acontece no UX Cards, muitas vezes é apenas uma ideia mais abstrata, menos automatizada, como por exemplo ideias. Então a carta brainstorming produz novos conceitos, novos conceitos é parecido com ideia, logo tem compatibilidade uma carta com a outra, então é melhor você fazer um brainstorming antes de fazer um mapa conceitual e não vice-versa. Essa mecânica desse jogo, porque é um jogo também o UX Cards, ela implementa o conhecimento que profissionais mais experientes que sabem como esses métodos têm, mas quem está aprendendo não tem ainda. Então pela interação com UX Cards o estudante vai aprendendo a lógica por trás da construção de uma metodologia nessa área de pesquisa de experiências e design de experiências. Então jogando o UX Cards, experimentando ele, você percebe que existe uma infinidade de metodologias, métodos e ferramentas de design, nenhum deles é definitivo, sempre pode modificar, é justamente isso que trata o meta design. Essa coisa que o Caivação fala no livro dele, que para quem vai pegar isso descontextualizado vai pensar que é parecido com a frase do Tom Zé, de que eu tô te confundindo para poder te explicar, mas para quem está entendendo o que é meta design faz muito sentido dizer que meta design é fazer o design do próprio design. Isso é constante, é uma praxis, tem prática, mas também tem teoria em conjunto. Então como começar no meta design? Comece estudando teoria, vincula isso é uma corrente de pensamento, porque é dali que vão surgir críticas a respeito da realidade. E aí você vai olhar suas ações de projeto, vai antecipar elas, mas também vai refletir sobre as consequências delas uma vez que elas foram executadas. Essa reflexividade é bem importante para se desenvolver no meta design. E aí você começa a olhar para o seu processo de trabalho tão intencionalmente como um produto, chegando ao ponto que se repensa também o seu conhecimento de design. Isso significa estar aberto para novos conhecimentos, novas maneiras de fazer coisas antigas. Por fim, só queria comentar que o meta design ele também tem o seu oposto, que é um movimento em vez de transcendente, um movimento imanente da percepção de projetos invisíveis, que é o que a gente chama de infra design aqui na UTFPR. É um trabalho que pioneiro do Matheus Pelando, estudante que orientei o UTC em 2019 e que vem desenvolvendo esse conceito, mas que ainda não está pronto para ser apresentado de maneira tão simplificada como eu fiz aqui agora, mas a gente espera no futuro poder estender esse diálogo e mostrar a complementariedade que existe entre essas duas perspectivas do meta design e do infra design, assim desvelando uma realidade de projeto que muitas vezes ela é negligenciada quando se foca apenas no design. Aqui estão as referências para as fontes acadêmicas que eu tenho para essa apresentação, para quem quiser se aprofundar e também existe no meu blog os habilidoido, várias outras aulas, vários outros textos que abordam esses assuntos. Também convido aqueles que quiserem colaborar transcrivendo as minhas aulas através dos links que estão lá dispostos nos podcasts. Eu agradeço bastante esse tipo de trabalho voluntário. Muito obrigado gente e até a próxima.