Estética da interação opressiva é uma aproximação, essa apresentação entre pensamento do design de interação e o pensamento do teatro do oprimido. Design de interação herdou a preocupação com estética formal e funcional, seja forma, segue função. Aquela coisa bonita, né? A epítome da estética da interação são os produtos Apple, né? Que são não só produtos físicos bonitos, considerados assim na nossa sociedade, como também interfaces gráficas consideradas bonitas. Então isso aqui é, digamos, hoje um padrão de estético relativo ao design de interação. Só que existe uma outra estética que ela não é visual e nem funcional, né? É uma estética que tem a ver com a estrutura das interações. Essa estética ainda é pouco conhecida, pouco estudada. Ela pode ser expressa aqui, por exemplo, o gesto que você faz para fazer zoom numa imagem, né? Que você faz o pinch e esse movimento que você faz, né? Muda o tamanho da tela, muda a exibição da informação. Isso já está se tornando um ato, um gesto estético. E não tem nada a ver com a forma, nem com a função, mas principalmente com a estrutura, o movimento desse gesto. Isso é um exemplo que eu tô dando de uma estética, a gente está falando, particular do design de interação, que é criada por essa área. Enquanto que já existia, por exemplo, a estética do produto, né? Estética da forma, estética funcional no design de produto, no design gráfico, o design de interação traz um novo tipo de estética que é a estética da interação. Apesar que o termo estética hoje, a gente não pode pensar muito em estética do ponto visual, que é uma estética bonita, etc. Estética, pelo menos na filosofia, ele diz, como termo filosófico, estética é um termo que diz como a gente se relaciona com as coisas, como elas se apresentam e como a gente busca elas, como a gente tem contato com as coisas, com as pessoas. Estética é um termo bem grande, mas que nos últimos anos, nas últimas décadas, nos últimos séculos, a gente se reduziu ao visual, mas estética tem a ver com o corpo todo, com o ser humano se relacionando com as coisas, como elas se apresentam e como a gente se engaja com elas. Um exemplo de estética que não é necessariamente visual, nem funcional, né? É a estética do teatro, por isso eu tô trazendo o teatro pra vocês. O teatro, ele tem uma estética visual sim na indumentária, no figurino, no cenário, mas isso não é a fonte principal de beleza ou de virtuosismo dos artistas, dos atores do teatro. No teatro é a ação teatral que é bela, as pessoas consideram bela a interpretação do personagem, a ação do ator ali no palco e muitas vezes também a interação do ator com a audiência, que é algo que não existe, por exemplo, na televisão ou no filme, né? Agora um detalhe importante é que essa estética da interação, assim como no teatro, e agora vem o motivo pelo qual a gente lê bastante coisas sobre teatro e eu me interesso bastante com teatro, é porque é muito parecido a situação do teatro com a situação do design de interação. Você pode, como um design de interação, criar um cenário, criar um script, criar um figurino pro seu usuário, mas você não sabe exatamente o que eles vão fazer. A beleza do ato, da interação, vai vir pela performance desse usuário, desse ator, assim como no teatro. Então quando a gente faz lá, por exemplo, o air flows, aqueles diagramas, sequências de telas, "ah, você clica aqui nessa tela, você vai pra outra tela", vocês já fizeram isso em outras disciplinas, certo? Já fizeram esse tipo de fluxo, diagrama de fluxo, né? Quando você tá fazendo isso é como se estivesse escrevendo um script, um roteiro de filme, que é uma coisa que vocês também fizeram em outras disciplinas ou vão fazer, né? Só que a diferença é, principal, que o roteiro do filme salva os casos de experimentais, de filmes interativos, o maio dos casos é linear. O roteiro vai dando linha por linha o que vai acontecer. Esse aqui é um roteiro não linear, porque ele tem bifurcações, escolhas, que o usuário pode fazer. Só que na prática, embora a gente crie esses roteiros, diferente do teatro quando tem um diretor que tá pagando, enfim, tá dirigindo a peça e o ator é obrigado a seguir o script, esse tipo de performance, o usuário não é obrigado a seguir o que o designer definiu. Tá? E o exemplo aqui dessa imagem paradigmático é a análise do fluxo de conversão do Google Analytics, uma ferramenta utilizada para verificar e tentar entender porque que os usuários, ao comprar alguma coisa num comércio eletrônico, por que que eles desistem? Em quais etapas do carrinho de compras, daquele fluxo de conversão eles desistem? Nesse caso aqui, temos vendo por esse gráfico que 70% das pessoas desistem ao cair na home. A pessoa entra, 30% dos usuários ficam, clica em alguma outra coisa, mas 70% já vai embora do site, ou seja, aquela home não tem alguma coisa interessante para o usuário. O que que os designers podem fazer para aumentar essa conversão? Algo chamativo, um clickbaitzinho na página inicial para que a pessoa clique e se engaje, mas isso não é garantido, não é todo mundo que vai clicar. Tá? E então, por mais que os designers de interação tentem controlar o comportamento do usuário, eles não conseguem fazer isso 100% das vezes. Então, se o funil de compra do site fosse um filme, o final desse filme seria o momento de frituação da compra, onde você paga e recebe o produto. O problema é que numa história multilinear com vários caminhos, e numa história onde tem interação e que a outra pessoa pode ou não seguir esse script, a própria usuária, a pessoa que está usando, ela decide onde que acaba essa história. E pode acabar na própria home, no meio do carrinho, ou até depois da compra, reclamando da compra. É um script que não consegue ser totalmente controlado, né? Porque esse filme está sendo montado ao vivo no performance. Existem vários tipos de estética da interação, tá? A gente é um tema novo, assim, pouco estudado. A gente está identificando aqui já um tipo de estética linear de interação, um tipo de estética não linear. A gente está identificando alguns elementos, né? Mas isso é um tema de pesquisa emergente. Um trabalho muito interessante etnográfico, Kyrs Rituals, demonstrou como as pessoas interagem com seus smartphones de diferentes maneiras. Então, pessoas que são... Ah, você já viu alguns, né? As pessoas que olham obsessivamente o seu celular, ou que ficam dando voltas. Eu faço muito isso quando eu estou atendendo o telefone, fico dando voltas, andando. Isso tudo são estéticas da interação que eu, enquanto usuário, também participo da construção desse modo de interagir. E também estou dando julgamentos de valor e definindo gostos ao executar certas ações. Então, o ponto aqui é que os atores também constroem a estética da interação. Agora, o Gonzáteo já tinha colocado essa levantada celebren mais cedo, ele falou que estética é um tema mais amplo. Realmente, a palavra estética contém a palavra ética. Não sei se vocês já perceberam isso, né? E isso não é por acaso. A raiz semântica dessas palavras aponta para um modo de viver, um modo de ser na sociedade, tanto ética quanto estética. Estética talvez possa ser uma manifestação poética desse modo de ser, enquanto ética pode ser considerada filosofia, a discussão a respeito desse modo de ser. Então quando a gente discute ética, a gente discute filosofia, mas quando a gente discute estética, também discute filosofia. Agora, a gente pode muitas vezes não discutir simplesmente reconhecer ou aceitar ou reproduzir uma estética sem saber que aquela estética implica uma ética. Como por exemplo, pessoas que se vestiam de punk por estilo, ou pessoas que se vestiam de emo, ou pessoas que se vestiam de hipster, mas sem conhecer a história do movimento e a ética que esse movimento social propunha. Mas mesmo sem saber, a pessoa estava reproduzindo os valores daquela ética. Ou se vestiam de nerd, de tarso. Ou outros exemplos interessantes. Então vamos ver o que tem a ver com o design digital. Animojis, eles permitem expressar emoções sem mostrar o rosto. Então a pessoa faz lá o movimento do rosto, o sensor capta esse movimento e isso é utilizado para mover um personagem, um bichinho virtual que tem as mesmas feições, faz os mesmos movimentos do rosto. Aí você fala "wow, foi apresentado no ano passado como um grande avanço da tecnologia, da comunicação pelos smartphones". Tem muita gente que comprou o iPhone X só por causa, gastou mil dólares só por causa dessa funcionalidade que queria ter o tal do Animoji, que é uma coisa que não tem nos outros smartphones, nem nos outros iPhones. Só que isso não é novidade nenhuma, esse tipo de interação, esse modo de interagir. Se você abstrair a tecnologia, abstrair o visual, você vai ver que isso já existia há muitos e muitos séculos. O Carnaval de Máscaras, e em particular em Veneza, é um lugar onde floresceu bastante o Carnaval de Máscaras, é uma tradição até hoje, mas que durante os séculos 15, 16, 17 era muito importante esse Carnaval de Máscaras, que era a época que as pessoas iam para a rua para fazer tudo aquilo que elas eram proibidas de fazer durante o resto do ano. Por que elas faziam isso? Por que a máscara permitia que a pessoa fizesse isso? Porque não tinha responsabilidade anonimato, protegia elas, ninguém podia saber quem era aquela pessoa que estava de repente fazendo sexo com qualquer outra pessoa fora do casamento, aquela pessoa que estava roubando, aquela pessoa que estava destruindo alguma coisa, aquela pessoa que estava se bebedando, enfim, fazendo todas as outras, quebrando todas as regras da sociedade, você podia fazer isso porque você estava com máscara. Aí você fala "nossa, então o Animoji serve para você fazer isso?" Sim e não, ele pode ser usado para você fazer ações negativas, enfim, só que o Animoji ele não quebra totalmente o anonimato, ele mantém o nome da pessoa que está se comunicando. O que ele quebra é a relação da expressão facial do rosto, porque no fundo, no fundo, por que as pessoas não pegam e simplesmente gravam um vídeo do rosto delas e mandam esse vídeo pelo chat? Por que preferem usar o Animoji para isso? Pelo mesmo motivo que muitas pessoas não gostam de falar no telefone hoje em dia e se existir, o próximo passo com certeza vai ser um Voiceimoji, que é alguém que vai pegar a sua voz, aquela mensagem de áudio que você coloca no WhatsApp, que muita gente não gosta de colocar, e vai transformar a sua voz e sua voz ficar diferente. É uma máscara que você vai querer interpor para não expressar de fato as suas emoções, para você expressar a emoção que você quer que a outra pessoa sinta, você quer afetar ela, mas você não quer ser afetado por essa interação. Isso é um padrão de comportamento geral de as pessoas se preservarem, de não se exporem tanto e ao mesmo tempo se exporem indiretamente através dos emojis. A Animoji mesmo quando ela não leva um animato, sabe quem é a pessoa usando a máscara, usando o Motico, usando o Animoji, ela permite abrir esse leque da identidade, você pode performar outras coisas, porque o outro já está vendo que você está com um artifício que está dizendo "eu sou eu, mas existe uma coisa entre nós", quando nesse espaço é permitido agir de forma diferente. Então um caso bem particular disso que o Gonzato falou é o bate-bola no Rio de Janeiro, alguém conhece bate-bola? Ou o Clovis? Não, ninguém nunca ouviu falar. Isso aqui era o terror da minha infância, quando chegava o carnaval começava a andar na rua, carnaval no Rio de Janeiro é bem diferente que aqui, realmente é um negócio que todo lugar que você vai, alguma coisa vai te lembrar do carnaval, as pessoas vão estar vivendo o carnaval. Então você saía de casa e você encontrava na rua uma criança, uma outra criança vestida de bate-bola, com o corpo completamente coberto, que é uma fantasia completa, o rosto você não sabe quem é essa criança, e ela tem uma bola que antigamente era de borracha, mas na minha época ela era de plástico, dura, e ele fica batendo assim no chão, e aí quando você chega perto não bate no chão, bate na tua cabeça, e dói, e dói, e isso é autorizado, isso é permitido. Ninguém, na minha época, ninguém, enfim, proibia às crianças de mais peraltas de fazer essa performance bate-bola e amendrotar outras crianças, inclusive machucá-las. E o bate-bola é uma coisa que acontece ainda até hoje no Rio de Janeiro, a polícia volta que me prende no carnaval, prenderam 100 bate-bolas que estavam destruindo coisas na cidade, ou estavam fazendo, atacando o bem-estar da sociedade, enfim, é uma controvérsia, porque bate-bola é uma fantasia que só usam as pessoas que vêm da região norte do Rio de Janeiro, não é a parte mais menos favorecida, menos privilegiada daquela cidade, então tem toda uma controvérsia relacionada, mas enfim, as pessoas que vestem bate-bolas podem agir como bate-bola, e não necessariamente como elas mesmas, e aí podem acontecer atos violentos ou não. Então aqui no caso da bola que eu comentei, não está muito claro na imagem, está um pouquinho emburrado, o Zé está aqui nessa ponta, então ele tem uma varinha, e essa varinha serve para aumentar a velocidade da bola, você tem vários símbolos aqui nessa imagem de que o bate-bola não tem moral, não tem pena, ele vem para aterrorizar mesmo, e uma característica é que eles vêm em grupo, em bando, batendo a bola, então você ouve de longe, e os bate-bolas chegam, e pode ser uma manifestação pacífica, às vezes, pode acontecer de encontros de bate-bolas de grupos diferentes também, e aí eles se confrontam, batem bola. Aí você fala, "ah, mas então quem criou a máscara, criou o bate-bola, existe alguma influência da máscara sobre o comportamento do bate-bola, as pessoas que vendem as máscaras e as fantasias de bate-bola podem ser responsabilizadas?" Parece meio ridículo você falar nisso, acreditar nisso, não tem nada a ver, a pessoa que está usando é que está completamente errada, ela que comete um crime usando a roupa de bate-bola é 100% de culpa para ela, mas se fosse o caso, se fosse esse o caso, por que os emojis de pistola teriam mudado em 2018, todos eles se tornaram emojis de pistola de brinquedo? Se não tivesse nenhuma culpa, por que eles teriam que ter mudado isso? Alguma porcentagem de culpa tem, porque o que eles estão dizendo? Nós não queremos estimular a violência através de armas com emojis realistas, mas eles não querem, mas eles já fizeram isso, de 2017 a 2013, quatro anos, os emojis realistas estavam lá disponíveis para as pessoas utilizarem nas suas conversas pessoais e eventualmente ameaçar uma ou outra pessoa, enfim, é uma das maneiras. Será que esse design não tem nada a ver ou ele influencia como que as próprias empresas percebem que é melhor a gente pegar e ao menos se ausentar de qualquer forma, mudando esse visual, tendo influência ou não? E assim, outro ponto, por que essas empresas estão fazendo isso? Porque para quem tem acompanhado a história dos Estados Unidos tem visto que nunca houve tantas atentados, atentados, qual que é a palavra? Não, aquele gun shooting que eles chamam, school shooting, mas não só school, em vários casos nas cidades americanas, em vários lugares, cidadãos que do nada pegam uma arma e começam a atirar uns nos outros, nunca teve tanto na história dos Estados Unidos e aqui estão as empresas de tecnologias principais fazendo a sua parte, digamos assim, para desincentivar o uso de armas, mas como eu disse, elas estão agora desincentivando, porém no passado incentivaram, se a estratégia de desincentivar funciona, a estratégia de incentivar tem que funcionar também, né? Se não a lógica não funciona. É quase como assumir uma culpa. Isso. E agora vejamos um caso mais forte aí de relação entre interações, pessoas e o tipo de emoji que elas usam. Lá em cima nós temos aquelas variações de cores, de pele que hoje tem nos emojis, que antigamente não tinha, era uma cor padrão amarelada para todo mundo e algumas pessoas que tinham a cor negra não eram representadas por esses emojis, as cores negras, né, que tem várias, não eram representadas por esses emojis amarelos. Então as empresas começaram a oferecer essa opção de você escolher a tonalidade de cor. Esse estudo científico é um pouquinho difícil de entender, mas basicamente é o seguinte, dois emojis a pessoa escreveu dentro de uma mensagem, o primeiro emoji foi qualquer um emoji de mão lá que tem essa opção de gesto, que tem essa opção de cor de pele. Então pode ser qualquer um desses. Aqui vocês podem ver que as pessoas que escolhem o emoji da cor de pele branca, enxergam esses emojis aqui, tá? E as pessoas que escolhem o emoji da cor de pele negra vão escolher esses emojis aqui. Então já dá para perceber aqui que o tipo de assunto que as pessoas estão lidando, ou o tipo de vida que as pessoas estão vivendo já é muito diferente, tá? Então só destacando algumas mudanças, umas diferenças drásticas, né? Enquanto que o emoji mais utilizado junto com o emoji de mão, de gesto para os negros que têm a pele bem negra mesmo, é esse negócio de gesto de força, de luta, para os que têm a pele branca mais clara, é o amorzinho, que é uma mensagem, provavelmente, relativa à paz, alguma coisa divertida. E também varia masculino e feminino, tá? Então enquanto que as mulheres falam bastante de gravidez, de, enfim, de utilizar esse, não estou falando de gravidez, mas utilizam o emoji de gravidez, utilizam o emoji de fazer a unha, enfim, são mais relativos a pessoas. Os homens utilizam mais relativos as atividades, ações, coisas que eles estão fazendo. Então a gente já vê aí uma preferência muito forte de grupos sociais por diferentes estéticas de interação. Então as escolhas que as pessoas fazem dos emojis têm a ver com os grupos sociais que elas estão inseridos, ou às vezes características pessoais como gênero. O problema da estética da interação que a gente quer enfatizar nessa aula é quando um grupo oprime o outro, às vezes sem saber, impondo aquela estética como sendo a bela, a mais bonita, a melhor. Isso parece meio uma briga de criança, a melhor mais bonita, a mais feia, mas no fundo no fundo se isso é feito de maneira implícita, constantemente durante a vida de uma pessoa, você pode ter um impacto na subjetividade dessa pessoa, de ela não se aceitar enquanto produtora de belezas também, de coisas bonitas, e jogar a moral dessa pessoa para baixo. Então aqui um exemplo no Tinder, você tem um problema seríssimo que as pessoas negras de origem asiática, enfim, que não sejam magras, estão sendo constantemente negadas, recebendo swipe negativo, e o que impede elas de conhecerem outras pessoas, porque elas ficam com ranking muito baixo, só porque elas são membros desses grupos sociais que hoje na sociedade não são considerados bonitos. E o Tinder não faz nada para aliviar isso. Por enquanto eles não sabem o que fazer a respeito. Você quer mostrar alguma coisa aí, Gonçalo? Esse site de relacionamento chamado OKCupid, ele analisou sua própria banda de dados e desperdiçou esse estudo sobre avaliações. Então homens avaliando mulheres, homens asiáticos avaliando mulheres asiáticas, mulheres negras, mulheres latinas e mulheres brancas. Você percebe alguns padrões, como por exemplo, homens latinos avaliando mulheres negras é a maior rejeição que você tem, enquanto tem preferência de homens brancos por mulheres brancas, e na verdade quase todos, tirando asiáticos, tem preferência por homens brancos e aqui também. Aí você fala "não, mas isso é uma escolha pessoal, cada um tem o direito de ter um gosto pessoal". Gente, essas estatísticas estão mostrando que consistentemente homens de determinada cor de pele preferem mulheres de outra cor de pele, ou mesmo cor de pele. Enfim, a sua escolha do seu gosto muitas vezes não é uma escolha meramente pessoal, é uma escolha influenciada pelo gosto de outras pessoas que você viu ao longo da sua vida ao seu redor. Então se você não vê com frequência um homem branco com uma mulher negra, você provavelmente não vai gostar dessa associação, porque você não vê isso com frequência. Então o que acontece? É uma parte de uma pressão sim, é uma manifestação de uma pressão que impede a reprodução biológica de certos biotipos de certos corpos de certas cor de pele e de certos grupos sociais. Então afeta muito fortemente as relações sociais. Só para ter uma noção, hoje em dia aproximadamente 70% dos casais nos Estados Unidos são formados através de redes sociais, incluindo Tinder e por aí vai. Então é muito impactante. E agora vem a parte também para deixar mais claro, que muitas vezes a pessoa que não se enquadra nessa estética do opressor, ela é indiretamente induzida a pensar que ela é feia. Ela olha aquelas imagens todas do que é bonito e não se identifica, não se vê naquelas imagens. E sem que ninguém diga nada para ela, ela se percebe e começa a se ver como uma pessoa feia, porque ela não está parecida com um ideal de beleza. Isso também acontece, enfim, já existe um debate hoje na sociedade sobre isso com relação à propaganda de cosméticos, a Dove até se posicionou mostrando mulheres com diferentes corpos e tal, mas e quanto à estética da interação, enquanto aos usuários de produtos digitais? Esse converse ainda não foi feito, é um assunto novo que a gente está trazendo à baila, mas que muitas vezes as pessoas se sentem burras, incapazes e culpadas das suas dificuldades em interagir com tecnologias, não porque elas realmente sejam isso, mas porque existe uma estética que faz elas crerem isso. Essa imagem por exemplo, é um gif do usuário burro, essa noção de que o usuário é burro quando ele não consegue fazer alguma coisa no computador, e isso aqui é o discurso, é a conversa, é o respeito, mas o que as próprias interfaces falam para elas mesmas? Qual discurso que a interface tem sobre o usuário burro? Você fala, não, a interface nunca falou "você é burro", mas ela fala através da estética gente. E olha só, "pan", esse "pan" é fundamental, o que significa "pan"? "Pan" significa alguém fez uma coisa errada, quando é com você mesmo, o "pan" você fala "porcaria de computador", mas quando é uma outra pessoa, já passaram nessa situação, você está passando perto de alguém, você começa a ouvir "pan", "pan", "pan" ou "uuh, uuh, uuh", no Mac, o que você fica pensando? Tem alguém se dando mouse, batendo com o computador, ou seja, o computador delata com esse "ear cone", com essa estética delata que a pessoa não está conseguindo executar uma operação. E quando você olha para a tela e vê a agressividade do uso das cores, do impacto, da imposição da mensagem que não deixa você fazer outra coisa, a não ser clicar na mensagem de diálogo, tudo isso aqui é estética opressiva, é uma estética que faz o usuário se sentir burro. E ainda mais, quando você vê essas telas que você só pode dar ok, tipo, você acontece uma coisa, eles te jogam na cara e todos ao seu redor dizendo "pan", todos olham para você, assim, tudo deve ser voltado para isso e você só pode dar ok ainda, você não pode nem contestar, você tipo, foi denunciado e você tem que concordar ainda, ao final. Tá, é isso que a gente está chamando de estética do opressor. Tá, esse conceito é novo, a gente está trazendo por essa associação com o teatro, então o teatro do oprimido especificamente é uma área que estuda esse tipo de estética do opressor e separa entre um tipo de teatro que é feito dos opressores para os opressores, ou seja, de uma classe social bem abastada para uma classe social bem abastada, eu assisti uma peça em 2017, não sei porque eu fui assistir essa peça, me arrependi a morte, mas enfim, era a proposta do Paulo Gustavo de fazer uma crítica à utilização de redes sociais em excesso, de excesso de smartphones em nossa vida, falei bom, vou lá ver né, mas a crítica era a crítica do opressor e a resultado da crítica do opressor é sempre a mesma, tudo vai continuar como sempre foi. E né, foi, ele tirou um sarrinho das pessoas que usam o celular, não se olham na frente, não querem se falar, preferem se falar para o celular, mas no final das contas, na peça não fez ninguém ali se levantar e parar de fazer isso, era uma peça que tinha aquela crítica cômica ali que simplesmente a pessoa dava uma risadinha e continuava mantendo os seus hábitos como sempre, ou seja, uma estética do opressor porque ela mantém o status quo. Outra coisa é que quem na peça do Paulo Gustavo é a grande estrela é ele mesmo, né, então ele faz a peça inteira, mostra que ele é realmente um artista multimídia e consegue fazer um monte de coisa diferente, vários papéis, várias cenas e uma produção magnífica que ele dirigiu e mostra que ele consegue manter um balanço entre vida digital e vida pessoal e presencial, mas a audiência que se lixa, mais ou menos essa é a mensagem que fica. Comparo isso com a estética do oprimido que é a proposta do teatro oprimido que é o grupo Maré 12, por exemplo, eu fui assistir uma peça deles na metade de seia nas férias, tive lá, achei magnífico, são jovens que moram na favela da Maré que resolveram fazer uma peça de teatro sobre um problema que eles veem no cotidiano deles. E o que eles mostraram na peça? A pressão social que a família faz para as mulheres casarem logo e saírem de casa e morarem com seus respectivos maridos, né, e quando casarem-se serem boas donas de casa. Então não existe, por incrível que pareça, né, isso para a nossa, nosso grupo social que a gente está aqui, isso parece estranho, não parece que a gente está, que faz parte da sociedade brasileira essa pressão para as mulheres serem donas de casa. Eu imagino que vocês mulheres que estão estudando aqui com a gente não estão estudando para serem donas de casa nem seus pais queiram isso de vocês, mas esses pais dessas adolescentes nessa região querem e esperam isso e tratam as filhas como se fossem donas de casa, já antes mesmo de elas saírem de casa. Então o pai já pede para a filha fazer o jantar para cuidar, para limpar a casa, né, e tudo isso está mostrado nessa peça. Então você tem ali a personagem que é a dona de casa, você tem o pai trabalhador que está dirigindo o carro e você tem aqui em cima a sociedade, essa personagem que está representando a sociedade com seus papéis de gênero definidos, do que que tem que ser, como é que é o bom comportamento, o que que é o mau comportamento, tudo isso são opções estéticas. E o legal é que eles constroem essa peça com recursos que eles encontram no lixo, como vocês podem ver, recursos muito simples, mas a peça tem um impacto muito grande porque você vê a peça e fala "alguma coisa precisa ser feita a respeito". E não é justo que essas mulheres sejam negadas às suas condições de desenvolvimento simplesmente por causa de um preconceito machista, enfim, que ainda está sendo mantido nessa sociedade, e que nem é bom para essa sociedade porque até do ponto de vista econômico essa opção não é muito boa. Então a gente está se perguntando, eu e o professor Gonzato, será que seria possível uma estética do oprimido no design de interação? Não estética do oprimido, vocês já viram aquele pam pam pam aquelas telas impactantes, mas como seria uma estética do oprimido no design de interação? A gente não sabe ainda, essa é uma pergunta que vocês vão ajudar a gente a responder e hoje a gente vai ter alguns exercícios derivados do teatro para a gente começar a desenvolver essa noção. Então vocês vão ter a oportunidade de desenvolver um projeto que a gente falou de tecnologia libertária, e essa tecnologia libertária a princípio vai estar do lado dos oprimidos. A gente espera isso. Pode explicar melhor então qual é a diferença desse para esse? Afinal, qual que é? Esse daqui também estava denunciando uma coisa e aqui está denunciando outra. Certo, ótimo, boa pergunta. A diferença é que aqui quem está fazendo a peça não são atores profissionais, começa por aí. São adolescentes que, enfim, se interessaram por teatro com uma maneira de expressar sobre seus problemas, a sua vida. Eles construíram a peça de teatro sem recurso financeiro externo, sem esse grande apoio financeiro que tem, por exemplo, Paulo Gustavo. Eles não estão cobrando pela peça, a peça é gratuita, a peça é aberta à população. As pessoas que vêm participar e assistir são convidadas a interagir com a peça e ocupar um lugar dentro da peça, que é uma coisa que a gente vai fazer com vocês mais para frente, chama Teatro Fórum. É parecido com o Teatro Jornal que a gente fez, mas tem uma interação com a plateia. E o objetivo dela é estimular as pessoas a tomarem uma atitude, a não ficarem simplesmente mantendo aquele status quo do jeito que já está. Acho que essas são as principais diferenças. Acho que um contato é que não existe uma resposta prévia ao teatro sobre onde que essa história vai dar e quais são as saídas que vão se encontrar. Enquanto numa outra haverá uma saída que o autor propôs, nesta daqui as pessoas que estão fazendo vão buscar saídas para essa condição. Ele não vai só mostrar a opressão, ele vai buscar como que pode superar ela. Então só para voltar para a discussão de design de interação, o teatro do opressor frequentemente ele é linear, é uma estrutura narrativa linear. O teatro do oprimido ele é uma estrutura narrativa não linear, porque vocês vão ver isso no nosso exercício e acho que vocês já viram também no artigo que vocês leram, você tem várias possibilidades de improviso, o que o improviso é de fins diferentes para a mesma peça. Por isso que a gente aproxima tanto o teatro do oprimido com design de interação, porque ele estruturalmente é muito parecido com a situação do design de interação. É isso, então vamos começar os exercícios.