Bom, gente, hoje o tema é design de espaços interativos. É uma apresentação que surgiu de uma apresentação anterior, né? Eu fiz uma atualização, uma palestra que eu dei muitos anos atrás no curso de design de interiores, refletindo sobre projeto e contra projeto. Essa apresentação, então, eu atualizei ela com novidades sobre os últimos experimentos que a gente tem realizado e o que eu fiz também no mercado na área de espaços interativos. Quando eu falo espaços interativos, na verdade, quando eu falo espaço, eu já tenho uma noção bem ampliada do que seria espaço. O espaço é um contínuo entre relações físicas, mentais e sociais. Então, você pode até falar de um espaço físico e você pode contrastar o espaço físico com o espaço mental. Por exemplo, nós agora estamos relacionados no espaço mental, mas não no espaço físico. Mas, além de tudo, nós temos um espaço social que une o mental e o físico, porque se a gente não tivesse em sociedade, usando uma linguagem, né? Se reconhecendo através dessas ligações mentais, a gente não poderia estar se entendendo. Isso é uma premissa bem ampla e básica da minha tese de doutorado que eu defendi em 2015 na Universidade Twente. Ela fala sobre como projetar com contradições e eu estudei projetos de arquitetônicos e projetos de design de serviços. Hoje eu vou falar especificamente sobre projeto de espaços interativos e minha definição também é ampla para essa área. É qualquer espaço que tem um constante movimento, seja movimento físico, movimento mental ou movimento social. Então agora nós estamos conversando através do Go Branch. Esse é um espaço interativo porque ele está em constante modificação, mais até do que outras ferramentas de videoconferência como o Zoom, como o Microsoft Teams, porque aqui a gente consegue mudar a posição das coisas. As pessoas podem mudar de lugar, você sabe que é legal que tem aqui, né? Trocar, sentar no outro lugar. Isso significa o quê? Que é um espaço interativo porque ele se modifica conforme a gente modifica as nossas relações, tá? Mas um espaço interativo não precisa ser digital. O espaço interativo pode ser físico também, né? Por exemplo, uma sala de aula com as carteiras, na verdade, sem carteiras, né? Uma sala de aula que você tem vários móveis de vários tipos, né? Um estúdio, um ateliê, é um espaço interativo também. Então, interatividade tem a ver com essa transformação. Só que qualquer transformação, ela tem fases e uma fase que é fundamental para a transformação é o conflito, né? Então, as coisas começam a se modificar e a partir de um determinado momento, há um conflito entre alguns elementos das coisas que estão ali constituindo esse espaço, né? Esse conflito, ele vai acumular forças até que explode, né? Na verdade, a contradição acumula força e explode como um conflito. E esse conflito é o que vai dar origem a uma transformação da realidade. E essa realidade, lembrando, ela é física, ela é social e elemental. Quando as pessoas mudam, às vezes, a maneira de pensar, a maneira de ver uma determinada situação por conta de um conflito, elas modificam as suas relações sociais. Pode ser de se tornar mais amigos, mais inimigos, pode ser de se tornar mais próximos, mais distantes, mas isso modifica a realidade social. E com o tempo, essa realidade social vai sedimentando no espaço físico. O espaço físico é o último a transformar, é o mais lento de todos. Por isso, o digital é até importante para nossa sociedade hoje em dia, que ele tem esse dinamismo, essa velocidade, mas ainda mais lento do que a maneira como as pessoas criam relações sociais. E mais lento ainda, né? A social é mais lento que o mental. O mental, uma pessoa só consegue, às vezes, repensar o mundo e a criatividade da arquitetura e do design provém dessa capacidade que nós temos de reconfigurar o nosso mundo. Agora, sempre que a gente pensa alguma coisa diferente, a gente vai ter que confrontar com outras pessoas que pensam diferente. E aí vai vir o conflito. E esse conflito vai ser necessário para uma ação. A questão que é interessante para o design, para arquitetura, é como mediar esses conflitos. Então, esse vai ser primeiro, a primeira parte eu vou falar como que se manifesta o movimento nos espaços interativos. Vou dar alguns exemplos, depois eu vou falar sobre a questão do conflito. Esses exemplos são contemporâneos, são vários exemplos de várias áreas em que a gente pode ver projetos de espaços interativos. E eles são alguns exemplos que eu selecionei do meu interesse, que eu achei que tinha alguma capacidade de expressar uma estética do nosso momento, ou tinha alguma relevância cultural. O primeiro exemplo está relacionado com uma transição que está acontecendo no nosso lar, que é a vinda da lógica das relações de trabalho, do ambiente de trabalho, da fábrica para dentro da casa. Isso, durante a pandemia, se tornou muito evidente. Mas durante a pandemia já existiam movimentos que não eram tão explícitos, que traziam linguagem de fábrica para dentro da casa. O principal movimento é o Smart Home ou casas inteligentes. Então, eu tenho vários produtos no mercado brasileiro já, eu estou destacando o positivo casa inteligente, que é uma série de kits para você fazer você mesmo, em casa, do it yourself, domótica. Essa é uma casa que a gente tem no português que traduz casa inteligente, domus, é uma casa, e ótica vem de robótica. Então, uma robotização da casa. Para que isso? Para você poder economizar energia, para você decidir o horário que as luzes acendem ou apagam automaticamente, para você ter sensores que identificam alguma configuração, ou seja, da luz, seja do refrigerador, de acordo com a presença das pessoas ou até mesmo o movimento delas dentro de um determinado espaço, que se torna, por conta, dessa estrutura interativo. Aqui tem um exemplo que consegue trabalhar essa nova funcionalidade dentro do espaço da casa como sendo uma nova mudança nas relações entre as pessoas que estão morando na casa. Então, veja que no exemplo da casa do positivo não existia uma imaginação sobre as interações. Como seriam as interações com aqueles dispositivos? O interesse da positivo era destacar os dispositivos, a tecnologia. Aqui, nesse projeto da Oury Design Studio, tem um interesse muito grande em destacar as interações novas que esses móveis, que se transformam nessa mobília articulada, o que elas permitem. Então, ela permite que num espaço diminuto, uma caixinha de concreto pequenininha, um microapartamento, uma kitnet, você tenha espaços reconfiguráveis. Você pode receber seus amigos para dar uma festa e aí você afasta o módulo. Se você quiser criar um espaço fechado, separado para você poder dormir, você pode. Você pode abrir o espaço inteiro para poder praticar a yoga. Então, são várias possibilidades de configurações. E o interessante do Oury Design Studio é a flexibilidade de se adaptar a diferentes estilos de vida e um estilo de vida que é dinâmica por si só, que tem muito movimento. Agora, numa escala um pouco mais ampla, nós temos as instalações interativas, que aparecem em museus, exposições, grandes empresas multinacionais quando querem fazer algum tipo de evento. Muitas vezes contratam designers para construir instalações interativas, como essa que mostra uma mistura de um espaço sensorial com alguma tecnologia de realidade conectada ou realidade virtual. Às vezes existem também dispositivos interativos, como aqueles que eu mostrei anteriormente. Nesse exemplo que eu estou destacando do Museu do Amanhã, que é um museu que tem várias instalações interativas no Rio de Janeiro, o Infusion é uma instalação com várias animações e vídeos que reagem à movimentação das pessoas dentro daquela sala. Eles tentam trazer uma atmosfera de imersão na natureza, uma reconexão com a natureza através da tecnologia, a tecnologia daí sendo uma ponte e não uma maneira de destruir a natureza. E o último exemplo é daqui de Curitiba, da onde eu estou falando, que é a B-Tools, é uma startup que surgiu alguns anos atrás para aproveitar e explorar as possibilidades da realidade virtual para o ensino de férias, em especial em inglês. A B-Tools tem vários módulos em várias abordagens pedagógicas, a realidade virtual e o mini intercâmbio que eles construíram em cima da realidade virtual são uma dessas abordagens. Então nesse exemplo da imagem vocês estão vendo uma pessoa que está fisicamente numa sala de aula da B-Tools usando óculos virtual e conversando com pessoas que estão em outras salas em outros lugares do mundo usando o mesmo óculos. Então elas estão tendo uma conversa em tempo real através dessa ferramenta. Esses exemplos são exemplos lindos, você olha e fala "Uau, que bacana né? Olha só o que dá para fazer com o design de interação na área de espaços interativos", mas existem conflitos porque as pessoas, como eu falei, quando elas são confrontadas com mudanças elas reagem, às vezes a favor, às vezes contra. Então existe uma mudança que não é só a física, não adianta só mudar os espaços físicos. Todo espaço físico é sempre entrelaçado com o espaço social e mental, o que as pessoas pensam, o que elas fazem em conjunto e como que elas fazem até a partir daquilo que o espaço físico oferece. Então agora vou falar sobre como se manifesta o conflito nesses espaços interativos. Vou contar algumas histórias rapidamente aqui. Uma delas tem a ver com as smart homes, as casas inteligentes e o rompimento de relações afetivas normalmente entre marido e mulher. Então o marido deixa a família, ele pede o divócio, se separa, ele leva o controle da automação residencial, ele leva o aplicativo com as senhas de acesso a todos os equipamentos da casa e ele passa a monitorar, a vigiar a ex-esposa dele sem autorização, muitas vezes. Ele começa a controlar algum tipo de dispositivo que tenha um atuador, além de um atuador, o sensor recebe informação. O atuador você consegue imprimir, executar algum tipo de ação à distância. Então quando ele está programando, por exemplo, o refrigerador para ficar mais frio do que o normal ou o ar condicionado para ficar mais frio do que o normal, ele está usando um atuador e ele está atuando sobre quem? Sobre aquela ex-mulher com a qual ele pode ter alguma rusga, ele pode estar querendo dar o troco por conta dela ter pedido o divórcio. Então já existem vários casos reportados nos Estados Unidos, no Brasil, nunca ouvi falar, mas é possível que na medida que essa tecnologia se espalhe, esse tipo de caso também se torne comum aqui. Isso gera novos desafios de privacidade, porque como que você faz para evitar que isso aconteça de uma maneira ampla, massiva na sociedade? Qual o papel do Estado também em proteger essa família desse tipo de conflito? E as empresas de tecnologia em geral não consideram esse tipo de cenário do conflito, uma vez que elas querem vender as tecnologias como sendo tecnologias perfeitas, que vão resolver todos os problemas. Quem é da área do design, da arquitetura, tem uma visão mais crítica e consegue perceber que sempre vão haver conflitos. O importante é saber como lidar com eles. Aqui tem um outro exemplo do Second Life, é uma rede social bem antiga, toda em 3D, que você pode botar, coloca lá e caminha por salas que podem ser criadas pelos próprios usuários e você pode viajar por esse mundo. Ele se tornou muito popular no começo dos anos 2000 e desde então ele tem perdido usuários, agora que a pandemia voltou a crescer e aí tem um exemplo de um conflito que aconteceu no Second Life, dentre muitos outros, que é um protesto contra a violência na faixa de Gaza. Esse protesto aconteceu lá no início de 2009, mas hoje em dia se fosse popular como era naquela época, certamente nós teríamos novamente algum tipo de protesto dado que a questão em Gaza não foi resolvida até então, até hoje. Então essas tecnologias refletem a maneira como a gente se relaciona, a sociedade, o espaço social aparece também dentro do espaço virtual, uma coisa não separada da outra. E muitas vezes as pessoas percebem a entrada desses espaços virtuais, dos espaços interativos dando seu dia a dia como sendo uma perda de autonomia, de privacidade, de capacidade para você se organizar politicamente. Aqui nós vemos manifestantes em Hong Kong destruindo um poste de luz inteligente, uma smart lamp que vigiava. Muitas coisas que são chamadas de smart parecem que trazem benefício para o usuário, mas por outro lado muitas vezes podem trazer também um malefício, como por exemplo evitar que as pessoas se manifestem num ato pacífico publicamente sobre uma questão política. Em Hong Kong existem leis que não permitem manifestações e elas são executadas através de câmeras de segurança escondidas dentro de smart lamps como essa. Os manifestantes descobriram que haviam essas câmeras escondidas e que estavam dedando elas para a polícia, com isso gerando prisões de manifestantes que não tinham nenhuma arma, nenhum interesse, não tinham feito nenhuma balbúrdia, mas só por estarem quebrando as regras do governo chinês, essas pessoas estavam sendo prejudicadas. Então essa tecnologia é anti-democrática e portanto os manifestantes destruíram ela, assim como várias outras tecnologias, como uma forma de protesto contra esse tipo de controle. Esses exemplos me ajudam a construir a ideia de que uma teorização em cima desses conflitos, que eu chamo de contraprojeto. Então todo projeto tem um contraprojeto. É um projeto que vai contra as intenções originais do projeto. Esquematicamente a gente pode colocar assim em duas tabelinhas. O projeto seria aquele que nos intenções do designer, do arquiteto, tem a ver com uma estratégia, tenta configurar todas as interações de antemão para mudar o comportamento das pessoas, se justifica com base numa necessidade racional, tem regras bem definidas, busca a construção de alguma coisa, enquanto que o contraprojeto é do usuário e ele busca uma tática, uma maneira de reagir à estratégia que está posta. Ele subverte o comportamento esperado, ele segue o desejo que as pessoas têm mais puro, mais forte, que normalmente muitas vezes não é racional, buscando prazer, a realização desse desejo e a desconstrução de estruturas que impedem a realização desse desejo. Então o contraprojeto pode parecer anarquia, pode ser chamado de destruição, pode ser chamado de algo que quer ser eliminado, que tem que ser proibido, mas isso é perspectiva de quem está do lado do projeto, quem defende que tudo aquilo que as pessoas têm que fazer é aquilo que foi projetado. Quem está do lado do designer não consegue se ver também como usuário, porque nós como designers ou arquitetos, nós somos usuários também, nem que seja do AutoCAD, do BIM, Beautiful Information Modeling, e a gente sofre com essas coisas da mesma maneira que alguém vai sofrer com as coisas que a gente criar com essas ferramentas. Então a minha maneira de ver o design e a arquitetura é uma maneira dialética, né? Eu vejo pro lado esforço de as coisas serem de um jeito, pro lado esforço das coisas serem de outro jeito e a partir desse embate é que a transformação acontece. Agora eu vou criar quatro abordagens para lidar com essa diferença entre projeto e contraprojeto e eu vou fazer algumas referências a história da arquitetura, que tem muita coisa discutida já sobre esse assunto e vou trazer também referências da minha área do design de interação. Desai modernista, muito cultuado pela arquitetura, pelo design de produtos também, um pouco menos pelo design de interação, mas também existe um design de interação modernista, ele tenta evitar o contraprojeto através de um perfeccionismo, tudo é perfeitamente simulado e previsto de antemão, para saber todas as interações possíveis e evitar conflitos. O resultado disso é um baixo grau de flexibilidade, às vezes pode até ter uma função de configuração, uma mudança possível, mas é dentro das considerações pensadas pelo projeto modernista. Os exemplos clássicos, Vila Savoy, do Le Corbusier, que de tão projetada nos mínimos detalhes, toda vez que o Le Corbusier visitava a família que morava nessa casa, que ele falou que era uma máquina para você viver, rapidamente as pessoas ouviu falar "o Le Corbusier tá vindo, o Le Corbusier tá vindo, bota os móveis tudo de volta no lugar", para ele não perceber e não reclamar com a gente, porque ele era megalomaníaco, ele falava "essa poltrona aqui tá no lugar errado, não tá pegando sol do jeito que eu tinha projetado ela para ficar", e ele ia lá e arrumava os móveis toda vez que ele ia lá, então quando ele ia embora, os móveis voltavam para os lugares que faziam mais sentido para aquela família. Isso é um dos exemplos dentre vários outros em que a arquitetura moderna chegou aos seus limites, digamos, do controle do comportamento humano. Existem outras abordagens mais flexíveis do que a do Le Corbusier, que ainda se encaixa dentro do design modernista, arquitetura modernista, que é por exemplo a casa Schröder, projetada pelo Herit Rietveld na Holanda. Ele fez uma casa que tem vários jogos de configurações flexíveis através de painéis reconectáveis, então você podia tirar, desconectar o painel e conectar em outro lugar e assim você mudava os cômodos que você tinha na casa. É uma casa que parece feita de Lego, na verdade o Lego é inspirado nessa casa, até o movimento dessas cores brilhantes do movimento digital, influenciou bastante a criação do Lego e de toda uma série de arquitetura moderna modularizada, que foi uma grande invenção. Mas no fundo o que a arquitetura modernista busca é a redução dos conflitos, evitar que os conflitos aconteçam. O exemplo mais explícito disso é o plano para uma casa funcional, para uma via sem fricção, essa planta abaixa que o Alexander Klein projetou e do lado esquerdo ele mostra um mau exemplo de uma comunicação entre cômodos que todas têm que passar pelo mesmo espaço, um corredor ali que inclusive tem a possibilidade de você se encontrar e sentar ali nas mesinhas. Isso é ruim para ele porque as pessoas vão ser obrigadas sempre a se confrontar no seu dia a dia e muitas vezes as pessoas não querem nem se ver dentro de uma família, então obrigadas é melhor elas não se verem se elas não quiserem, então a arquitetura pode obrigar as pessoas a se ver para evitar a fricção. E aí do lado direito ele mostra ali os caminhos possíveis, né, esses caminhos, linha espaguete, tem vários nomes para isso, né, mostrando que uma pessoa pode sair do seu quarto sem cruzar com outra pessoa se você fizer uma pequena modificação no plano. E aqui o último exemplo é o mais megalomaníaco de todos que é projetar um país inteiro com base nessa nesse conceito de planejamento, simulação, previsão, né, de todas as tendências de um país. Isso foi feito em 1972, entre 71 e 73 na verdade no governo do Chile com o Salvador Allende que era um presidente revolucionário de esquerda que trouxe uma política com medidas radicais para a mudança da política e economia no Chile, mas que sofreu um golpe de estados e foi assassinado pelo general Pinochet que instalou uma ditadura sanguinária depois desse momento e durante o, antes desse projeto ser lançado, né, ele foi só testado, simulado durante alguns meses, infelizmente não continuou, mas era o projeto de governo do único mais avançado que existia no mundo naquela época. Imagina, a internet ainda nem existia enquanto um fenômeno mundial, né, os primeiros computadores estavam sendo conectados nos Estados Unidos, nós já tínhamos aqui no Chile uma rede nacional que conectava todas as fábricas, todas as distribuidoras de suprimentos e fornecia informações para essa sala de controles aí que foi formada talvez em ficção científica, Jornada das Estrelas e outras coisas que os estadunidenses só tinham na televisão aqui no Chile já era realidade e o designer que fez esse projeto, o Guy Bonsip, ele não foi assassinado, sobreveu, conseguiu fugir e veio para o Brasil, se tornou professor da ESD e muito influente, escreveu vários livros sobre design de produto e gráfico que são muito importantes também para a literatura em design brasileiro. A segunda abordagem que eu vou falar é o design aberto, o design aberto ele tem um resquício modernista ainda, mas ele tem uma liberdade maior porque ele permite que o projeto se transforme em outro projeto, ele abre os seus módulos para serem combinados de maneiras inesperadas, então você pode fazer modificações radicais naquilo que foi aberto. Normalmente isso acontece através de arquivos do projeto, seja as plantas, seja o arquivo mesmo do AutoCAD ou da ferramenta que você utiliza para editar, fica disponível para download, o arquivo 3D, só que com isso também tem uma tentativa de terceirizar os conflitos, ao invés do projeto antecipar conflitos ou lidar com os conflitos dentro do projeto, você terceiriza para os conto-projetos, isso que resolve os conflitos que aqui estão todas as estruturas. Existe também uma linha muito forte de design aberto na arquitetura, derivada do estruturalismo dos anos 70, de você ter o open building, o prédio aberto que você pode reconfigurar, está muito ligado também à construção dos mercados, então você consegue mudar a disposição de um cômodo, de um espaço, apenas modificando as peças dele, assim como você faz com o Lego. E aí de novo, o Lego acabou influenciando essa nova geração de designers, de arquitetos, e aqui temos um exemplo de arquitetura estruturalista, que eu vou mostrar agora, um exemplo paradigmático é a Central Berrier, na Holanda, projetado por Herman Hertzberger, que é um arquiteto humanista, ele tinha um interesse muito grande nos usuários, entrevistava antes de projetar, queria saber tudo que as pessoas vão fazer ali, mas além disso, ele queria dar uma liberdade para que essas pessoas pudessem se desenvolver junto com o ambiente, e o prédio era quase como se fosse uma cidade, então ele inaugurou esse movimento dos ambientes que fossem como mundos, dentro de um grande espaço, ao invés de fazer uma arranha-céu vertical, a Holanda investiu muito nos arranha-céus horizontais, que são espaços que você pode andar com várias avenidas abertas, assim com Clara Boys, como você está vendo aí do lado direito, é uma espécie de uma espécie de espécie que você pode ir andando, ir embaixo e vendo, passando pelos vários átrios, e esses ambientes eram semi-abertos, eles tinham aberturas para essas avenidas, estimulando com isso alguma interação inesperada, como por exemplo, aquele rapaz que está ali se esgueirando para olhar a menina bonitinha do outro lado do escritório dela, talvez ele esteja conversando com ela, talvez esteja convidando para almoçar, alguma coisa assim, esse tipo de interação espontânea, algo que se dá por uma visibilidade compartilhada, era um dos objetivos desse estruturalismo, mas existiam outros, como por exemplo, você poder customizar, personalizar o seu espaço, colocar a sua própria decoração, tinha muita flexibilidade nesse sentido. Eu tive a experiência de morar num apartamento que tinha esse grau de flexibilidade, talvez um pouco menos, por conta do acesso aos móveis da IKEA, que é uma empresa de design de produto, uma empresa que produz móveis que fazem parte de uma mesma linguagem, ou de várias linguagens compatíveis de identidade visual, então qualquer móvel que você compra da IKEA combina com outro móvel da IKEA, é impressionante, e eu não tenho muita experiência de design de interiores, como eu falei, mas eu fui aprendendo de interiores pelo meu consumo qualquer, e eles têm guias, eles têm um showroom fantástico, que eles mostram várias configurações possíveis e combinações dos móveis, e uma coisa característica é que esses móveis você tem que montar eles. Quando eu tive que retornar ao Brasil, depois de quatro anos na Holanda, ele me deu um negócio no coração, saudades daqueles móveis que me acompanharam por quatro anos, eu quis levar comigo, mas não pude, né? Eu consegui só levar um deles, que é essa cadeira, não é da IKEA, na verdade essa aqui vermelhinha é a cadeira Balance, que é muito bacana também para você sentar ajoelhado, e eu tenho ela até hoje como uma lembrança, ela é super desmontável, cabe na mala, e eu acho que esses móveis eles têm essa característica, eles por serem configuráveis, eles têm uma relação, eles desenvolvem uma relação com a sua história, com a sua vida, porque eles se adaptam, eles se transformam assim como você se transforma. Mais recentemente, agora temos algumas empresas que estão investindo no design aberto, o OpenDesign, o que você quiser, o OpenDesk, por exemplo, .cc, é uma plataforma para distribuição de arquivos de móveis abertos, você pode fazer o teste do arquivo e imprimir em casa, ou cortar na sua CNC lá e fazer a cadeira valovinha, mas se quiser encomendá-la pronta, com as peças para você montar, você pode, esse é o modelo de negócios do OpenDesk. O último exemplo do design aberto é o Architecture for Dogs, da Kenya Hara, e vários outros arquitetos convidados, que são uma série de móveis que se adaptam, enfim, que são feitos para para cachorros de diferentes tamanhos e interesses e personalidades, e todos os projetos estão disponíveis para download, se você entrar no site deles, você pode fazer e produzir se você mesmo. E o legal é que eles são feitos pensando nos, nos, nos muito, tem um pensamento muito forte sobre como esses cachorros interagem, como aquele, qual o comportamento deles, se você assistir os vídeos vocês vão entender o que estou falando. O terceiro, terceira abordagem, que é uma das mais conhecidas dentro da arquitetura e do design, é o design participativo, ele tenta trazer o contraprojeto para dentro do projeto, então não é terceirização, vamos antecipar os contraprojetos, vamos trazer os contraprojetos que já estão acontecendo hoje no mundo, né, e vamos tentar incorporar para ter um projeto mais robusto, um projeto que seja flexível, mas também que ele tome decisões, que tenha uma negociação para sair do conflito, para chegar a um consenso, então aqueles usuários, o cliente, os chamados stakeholders, as partes interessadas são convidadas a participar do projeto e aí são utilizados o que eu chamo de meta objeto, que seria representações dinâmicas de como que esses espaços interativos serão no futuro. Então meta objeto pode ser desde um aplicativo como de Building Formation Modeling, como um modelo tridimensional, de como que vai ser aquele espaço interativo, ou como ele também pode ser uma maquete que você modifica, ou uma maquete praticamente um para um, que é uma tendência muito forte no projeto de hospitais lá na Holanda, de você fazer um protótipo, uma maquete gigante que seja modificável para que a equipe do hospital possa projetar o melhor ambiente de trabalho possível. Então a equipe junto com os arquitetos, os engenheiros vão lá experimentar diferentes configurações e testar as rotinas de trabalho nesses ambientes, porque é muito comum haver erros e falhas no projeto pela dificuldade de abstração dos processos de trabalho. Então quando enfermeiras, médicos olham para as plantas baixas, impressam ali no papel ou mesmo uma representação tridimensional no computador, elas não conseguem ter o pensamento espacial, se colocar dentro daquele ambiente e imaginar um processo muito complexo, sem falar que esses processos muitas vezes são emergentes, são emergências, isso significa que você não pode prever completamente o que vai acontecer. Então você reproduzir esse processo, fazer uma simulação no ambiente um para um, permite perceber detalhes que você não consegue perceber com outras ferramentas. Existem sim ferramentas tridimensionais para fazer isso, como as cavernas, as caves, só que são extremamente custosas, caras e não apresentam resultado tão prático na modificação. Você não consegue modificar tão rapidamente o layout assim como você pega uma prancha de papelão, tira ela, destaca e cola em outro lugar, como nesses protótipos LING, Hospital Linha Arquitetura LING, estão chamando isso. Eu tive a oportunidade de participar de um projeto que não foi tão radical assim na Holanda, que foi um centro de diagnóstico médico por imagem em Enschede, que é a cidade onde eu morei. Esse centro era para ter as tecnologias mais avançadas dessa área, para a universidade trocar informações e compartilhar as últimas novidades da pesquisa com os hospitais próximos. Então os hospitais foram convidados a participar do projeto e verificar, aí veio uma intervenção no projeto, verificar se os processos de trabalho estavam adequados com a planta. Então existia uma planta, os engenheiros, os arquitetos, os tecnólogos estavam todos felizes com a planta, estava tudo perfeito, mas quando chegaram os usuários, que seriam os médicos e enfermeiros do hospital, os técnicos do hospital, que operam essas máquinas, eles começaram a imaginar o caminho que eles iam fazer por essa planta e a gente foi amarrando esses fiozinhos para mostrar para onde que ia cada pessoa. E aí, por exemplo, você poderia perceber que nesse momento a enfermeira está numa sala acessando um equipamento, enquanto o paciente está em outra sala sozinho e o paciente está perdido, não sabe para onde ir, e de repente o paciente vai passar para uma outra sala recebendo um aviso, um sonoro, talvez até uma chamada por voz, e de repente ele passa para um corredor em que ele está semi pelado, semi nu, e tem outras pessoas nesse corredor. Isso não foi pensado, porque essa dimensão social do espaço muitas vezes é negligenciada pela arquitetura, pela engenharia especialmente, quando se foca muito no aspecto físico. Eu desenvolvi também um método de compilação desses dados coletados de maneira qualitativa e analógica, o método transforma esses dados em uma versão digital, então você consegue visualizar os diferentes caminhos que as pessoas vão fazer dentro desse centro médico, ou qualquer tipo de planta que você tenha, e você visualiza esses caminhos com intensidades e cores diferentes para demonstrar papéis, ou tempo de permanência, vários tipos de informação. Essas informações são inseridas num modelo que é lógico, um modelo que tem dados, não é só um modelo geométrico, então é um aplicativo de Building Information Modeling, é uma família, na verdade tecnicamente é uma família para ser importada dentro do Autodesk Revit, que é uma ferramenta de Building Information Modeling bastante popular, ou era bastante popular na época na Holanda. Essa ferramenta está disponível para download no meu site, quem quiser experimentar, conhecer o Revit, fique à vontade. E o último exemplo de projeto participativo é o Natuurhus, que é um projeto de um centro de amantes da natureza em Almelo, que vai ser construído numa praça e para ter um processo de conexão com a natureza dos habitantes, com as escolas, participando, a gente pegou a planta abaixo do arquiteto e fizemos um jogo, um jogo com alguns bonequinhos e ferramentas de pecinhas de jogos de tabuleiro, que representariam os requisitos das atividades que os usuários iriam executar, então tinha, por exemplo, o requisito de pegar os equipamentos para poder fazer as visitas técnicas, então os equipamentos eram os barris, colocava os barris nos lugares onde esses equipamentos estariam disponíveis e onde eles teriam que ser guardados, e aí já começou a surgir vários descompassos e conflitos, porque o que o arquiteto imaginava que era o lugar melhor para guardar os materiais, não era o lugar melhor para serem, na verdade, o arquiteto queria que os materiais fossem guardados do lado de fora, numa espécie de uma garagem, e os usuários queriam que fossem guardados dentro, porque os materiais eram pesados, e fazer esse trânsito de fora para dentro ia ser muito cansativo, sendo que isso era uma coisa recorrente, então esse tipo de simulação ajuda a antecipar requisitos que só depois que se começa a construir, que você percebe, aí tem que fazer modificações depois, durante a obra ou depois que a obra está pronta, o que sempre implica um prejuízo que poderia ter sido evitado. Por último, a abordagem design livre, que é a que eu mais gosto, que tenho investido bastante em fundamentar ela, é um foco de pesquisa, tem a ver com estimular o projeto a se tornar um contraprojeto, então o contraprojeto se tornar a regra, não a exceção. Então o design livre se baseia numa ideia radical de que todas as pessoas são designers, e quando eu falo arquiteto também é designer, porque todo mundo projeta o seu modo de viver no mundo, toda vez que você muda de lugar uma cadeira num espaço, você já modificou esse espaço, então você também já está sendo um designer desse espaço. Então o objetivo do design livre é dar liberdade para as pessoas discordarem, cada um vai querer fazer uma coisa diferente, não tem problema, pode fazer do seu jeito, você tem a liberdade para fazer do seu jeito, então pega aqui a parte da tua estrutura que você quer e leva para o seu lado, você vai ter uma coisa que é compartilhada, mas ao mesmo tempo você vai ter algo que você não compartilha. Então a diferença do design participativo para o livre, que no participativo tem a necessidade de consenso, vamos combinar o que a gente quer com o mínimo denominador comum, no design livre não, vamos combinar que a gente vai entrar em um acordo que a gente vai desacordar, e a gente vai se manter juntos porque a gente vai ter infraestruturas compartilhadas, então a gente vai ter infraestruturas que são modificáveis, é uma ideia que deriva lá do estruturalismo que nos influenciou lá desde os anos 70, tem algum exemplo também que está ligado ao estruturalismo, mas está mais uma linha mais anárquica, que é o escritório Burglanshaft criado pelo Kik Borneutin na Alemanha, que é um projeto muito interessante, que deu origem ao que hoje a gente chama de plano aberto nos espaços interiores, mas antes de existir o plano aberto como a gente tem hoje, você tinha o Burglanshaft, que era um espaço gigante, mas com vários tipos de configurações de espaços de trabalho, sem seguir uma padronização das baias. Para que isso? Para quebrar as linhas de visão dos gestores, para as pessoas não se sentirem vigiadas. Então existia já uma sensibilidade para a questão da vigilância, para o espaço social no Burglanshaft, que o plano aberto que vai ser todo padronizado, baseado numa lógica mais cartesiana, mais racional, que ele não vai conseguir trabalhar. Então outra característica importante é que a justificativa do Burglanshaft era dar liberdade para que as pessoas modifiquem os espaços, na medida que elas estão mudando as suas rotinas de trabalho. Então o fato de estar desalinhada é de propósito, para ninguém ficar se perguntando como é que eu alinho isso aqui de volta, como é que eu ponho de volta no alinhamento. Não, a ideia não é ficar alinhado, para todo mundo se sentir à vontade para mudar quando for necessário. Então com o plano aberto a gente vê problema seríssimo de que há uma flexibilização de quem está no lugar, quem está naquela baia, naquela estação de trabalho, mas há uma rigidez gigantesca de como aquele espaço se configura, porque ninguém é dono, ninguém pode mudar, quem tem o direito de mudar algum espaço aberto. E o resultado são espaços que às vezes, há exceções, mas muitos deles estão em total silêncio, ninguém fala nada, todo mundo com fone de ouvido isolado, mais isolado até do que se tivesse paredes de verdade, porque quando você tinha os escritórios antigos com as salas separadas de cada um, havia o hábito de as pessoas andarem de uma sala e outra para bater papo. Na planta aberta, se alguém começa a bater papo, já incomoda um, já incomoda outro, por causa da falta de barreiras contra o som, que é algo que o Burowland Schaff também resolvia com essa disposição anárquica, por isso tinha um fator acústico também, porque quebrava as ondas de som para não se espalhar tão rapidamente. Aqui tem um outro exemplo completamente diferente do Friesenfawella, projeto de arte interativa no Midiamatic, que é um centro interessantíssimo de experimentação e arte na Holanda, eles fizeram uma favela, eles criaram um espaço anárquico para que as pessoas pudessem trazer suas obras de arte dentro de um galpão que estava com defeito no ar condicionado, eles não tinham como consertar o ar condicionado, mas queriam fazer exposições, e eles criaram esse conceito de uma favela congelante, qualquer artista que quisesse trazer um método para esquentar uma parte daquela favela, podia construir o seu ambiente ali dentro, então uma exposição sobre métodos de geração de energia alternativos, tinha lá o espaço dos biodigestores, tinha o espaço da energia gerada através de você andar de bicicleta, tinha o espaço da energia gerada pela queima de combustíveis, e por aí vai, e cada artista ia mostrando uma maneira diferente de se relacionar com a energia. Então, um projeto interessantíssimo que deu liberdade de várias configurações possíveis para os artistas. Aqui é o Open Structures, é um projeto maravilhoso para quem trabalha com design de produto, ambientes, porque ele tem para download todas essas peças que vocês estão vendo aí, quem quiser produzir, mas são vários tipos de junções, estruturas padronizadas que você pode combinar e construir praticamente o que você quiser. E por último, é o projeto Surubá, projeto dos nossos estudantes aqui da UTFPR de design de produto, que estão querendo criar um, na verdade, criar um protótipo já, dos móveis modulares, chamado Surubá, mas eles querem tornar isso um projeto de design livre, então querem disponibilizar os códigos-fontes, os modos diferentes de junções, e criar uma comunidade de pessoas que vão transformar isso em outras coisas, inclusive criando os novos módulos, um projeto que ainda está no começo, mas com uma proposta bastante ousada de combinar design de produtos, com design de interiores, com comunidades virtuais, com, enfim, processo político também de afirmação de que todos são designers. Então, se todos são designers, é melhor que os usuários projetem seus ambientes e seus espaços de vida, desse modo tendo uma relação menos consumista com o seu ambiente de moradia, seu ambiente de trabalho e por aí vai. Então, para concluir, qualquer projeto de interação trabalha com possibilidades, e não certezas. Os espaços sem conflitos, eles não são interativos, a interatividade não leva ao conflito eventualmente. E esses conflitos podem emergir em qualquer momento, você não tem como prever exatamente todos os conflitos, e qual a natureza do conflito. O conflito pode ser destrutivo, mas pode ser construtivo também. E, em qualquer caso, eles vão promover mudanças. Então, cada projeto precisa ter uma abordagem diferente para que esses conflitos sejam geridos da melhor maneira possível e alcancem um resultado satisfatório para as pessoas que forem interagindo.