Uma nova ideia, um novo conceito de design que a gente tem desenvolvido na Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Eu sou professor de lá desde o início deste ano. E muita gente me conhece pelo blog Usabilidoido, que lá em 2003, quando a internet ainda era discada e fazia aquele barulhinho esquisito quando você se conectava, você precisava entrar na internet naquela época. Hoje em dia você está na internet o tempo todo, tanto é que você respira a internet e você nem percebe que você está conectado através dessa coleira virtual que são os nossos smartphones. Nessa época a gente vislumbrou a partir desse blog, discutimos bastante sobre esse paradigma da usabilidade, da arquitetura da informação. Posteriormente essa área ficou conhecida como experiência do usuário. Mas desde então, quando se começou a falar da experiência do usuário, eu já comecei a perceber que existia algo além disso, que a experiência era só a ponta do iceberg. E agora finalmente na Universidade Tecnológica, junto aos meus colegas do Departamento de Desenho Industrial, a gente está conseguindo formatar o que viria a ser o próximo passo dessa profissão do design. A nova fronteira, digamos assim, do projeto seria o projeto prospectivo. Essa é uma proposta bastante ousada que a gente desenvolveu lá no começo deste ano. Caminhamos para CAPES no formato de um programa de mestrado em design prospectivo, que caso seja aprovado, a gente irá abrir para a primeira turma já no ano que vem, na modalidade distrito censo, programa de mestrado gratuito como todo mestrado e doutorado em universidade pública. Então o que eu vou apresentar aqui para vocês é uma prévia da temática que a gente vai trabalhar nesse mestrado, tentando vislumbrar como vai ser o mercado da profissão de design daqui a 5, 10, 50 anos. Esse é o horizonte de especulação que a gente trabalha no design prospectivo. Vamos então voltar um pouquinho no passado e ver como o design já tem uma história de prospecção muito forte. Raymond Lewis, que é considerado um dos fundadores do desenho industrial, dizia que design é igual a "most advanced yet acceptable", MAIA para o acrônimo. MAIA significa o quê? Que o design está sempre buscando trazer uma forma que traga um significado novo, mas que as pessoas consigam entender, por isso que seja aceitável. Por outro lado também, a forma é uma maneira de trazer novos sentidos, novos significados para as coisas que já existem, de maneira que não haja um rompimento com o que as pessoas já conhecem, já sabem. Por isso que é "most advanced yet acceptable". A inovação no desenho industrial, no seu início, a prospecção de novas formas, ela acontece nessa perspectiva do estilo. O design vai se desenvolver de diferentes maneiras, criar várias vertentes depois dessa fase inicial de estilo. E mais recentemente, a partir do século XXI, começa a surgir a ideia mais clara e assumida de que design não é só forma, design também é conteúdo. Design também pode trazer novos conteúdos e não só novas formas para conteúdos antigos, conteúdos que são definidos por outras profissões. O designer também pode falar alguma coisa. Falar sobre o quê? Sobre os rumos da nossa sociedade, discutir questões polêmicas que envolvem o design da nossa sociedade. Por exemplo, a engenharia genética, ela traz uma série de funcionalidades e tecnologias. Qual vai ser a forma da engenharia genética? Como é que ela vai mudar a nossa vida, no nosso dia a dia? O que que isso muda no nosso corpo? Então esse projeto que vocês estão vendo no fundo, criado pelo Anthony Dunn e Fiona Rebic, que são dois pioneiros do que é conhecido hoje como design especulativo, eles imaginaram como seria um futuro em que a engenharia genética se torna tão disponível e acessível que as pessoas começam a criar soluções para uma sociedade mais sustentável a partir da engenharia genética. Ao invés da gente criar tecnologias baseadas em minerais, por que não criar tecnologias baseadas na ciência biológica, na mudança do nosso corpo? Não tem coisa mais sustentável do que o nosso próprio corpo. Então, ao invés da gente investir em motores elétricos ou motores de hidrogênio, vamos investir em potencializar o corpo humano através da combinação de genes retirados de um cavalo. Então você retira os genes do cavalo, da coxa do cavalo, coloca esse gene num trabalhador humano e esse trabalhador humano se torna um trabalhador especializado em dirigir bicicletas, pedalar bicicletas gigantescas que podem carregar pessoas como se fosse um ônibus. Aí você fala que bizarro. Pois é, isso já existe, esse tipo de trabalho, isso aqui é só um dos exemplos de projetos que o Anthony Dunn e a Fayan Arabi, que é uma dupla muito interessante, que trabalhou por muito tempo no Royal College of Art, hoje eles estão na Parsons nos Estados Unidos, desenvolveram. Existe uma série de projetos ao redor do mundo, vários lugares, inclusive no Brasil, que fazem pesquisa desse tipo, especulativa, mas na UTF-R a gente tem percebido que esse tipo de projeto especulativo é muito bacana para abrir a nossa cabeça, ver possibilidades novas para o design, porém ele não nos leva a querer implementar aquilo que a gente especula. Ele não coloca o atrito necessário, as contradições que vão ser inerentes ao processo de tentar implementar uma especulação dessas e dessa maneira tornar essa especulação também mais relevante para a sociedade. Então a gente começou a discutir que nós não iríamos fazer um mestrado em design especulativo, e sim em design prospectivo, que é esse conceito novo que a gente está desenvolvendo. O design prospectivo ele visa criar novas relações, ele foca em prospecção de novas relações. E na medida que eu for avançando com a minha fala eu espero que isso fique um pouquinho mais claro. O paradigma do design por muitos anos esteve focado em coisas, porém agora com o design prospectivo a gente quer focar em relações entre coisas. Então o foco do design prospectivo não é a forma e a função, a estrutura de um objeto, de uma coisa ou de uma pessoa, mas sim na relação dessas coisas, várias coisas, várias pessoas, várias pessoas. Então qual o objetivo de pensar em relações? É para a gente pensar naquilo que impede essas relações de se transformarem. Por mais que você tenha um objeto ou uma pessoa muito inovadora, muito diferente, se as relações desse objeto, dessa pessoa não forem também habilitantes, essa inovação ela pode morrer na praia, ela pode nem chegar a ser implementada. E de fato não se configurar como uma inovação. Quando você pensa em relações você percebe que existem redes que impedem essas novas relações de surgirem. As relações muitas vezes elas são conservadoras, então você tem tabus, tecnologias, legislação que vai impedir que novas relações sejam implementadas, sejam prospectadas. E o design prospectivo ele vai tentar justamente ampliar esse horizonte de relações que pode ser considerado uma caixa. Então o que eu vou usar é a metáfora da caixa, que muita gente fala de pensar fora da caixa, na nossa opinião é pensar com a caixa e expandir essa caixa. Então ao você detectar e perceber o que é possível, você começa a expandir para o que é provável e comparar o possível com o provável. Se você forçar mais um pouquinho você vai ultrapassar a fronteira, um umbral que separa o possível do impossível, no meio do caminho passando pelo improvável. Mas se você for mais além ainda você vai chegar no impensável. Esse é o sweet spot, é a parte mais interessante do processo prospectivo que raramente é considerado nos outros abordagens futuristas, como por exemplo o planejamento de cenários, o design especulativo que eu mencionei anteriormente. O impensável é muito difícil de você pensar a respeito daquilo. Mas qual que é a proposta então do design prospectivo? É pensar no impensável, no improvável, no impossível, trazer para o presente, criar pontes entre o que é possível e o que é impossível através de cenários que sejam realistas, construídos visando provocar a expansão dessas caixas. E quando uma coisa que era impossível, ou improvável, ou impensável, as pessoas começam a acreditar que é possível, então ela se torna o que a gente chama de o novo possível. O novo possível são aquelas relações que já estão pairando no ar, que já existem na nossa sociedade, só que ainda não estão bem distribuídas. Ao detectar, ao prospectar essas relações, tal como se você prospecta petróleo, você percebe que existe ali uma nova fonte de inovação, uma nova fonte de transformações que só precisa ser potencializada. Para você fazer esse tipo de prospecção, você precisa juntar pessoas com diferentes perspectivas. Você precisa ter uma pessoa que seja imediatista, uma pessoa que seja pé no chão e outra pessoa que seja visionária. Esses perfis são importantíssimos, não adianta você ter só um tipo de perfil, porque mesmo o visionário que consegue enxergar possibilidades lá na frente, que são, por exemplo, impossíveis, ou improváveis, ou impensáveis, ele vai ter uma dificuldade grande de perceber aquilo que é provável de acontecer e também aquilo que já é possível, que já está acontecendo, porque ele está olhando lá na frente. Quando você junta pessoas diferentes, acontece o fenômeno que a gente chama de prospecção coletiva, e essas pessoas começam a combinar as suas perspectivas de médio, curto e longo prazo e também as perspectivas de disciplinas diferentes, as perspectivas de raça, gênero, etnia e tudo mais, todos os diferentes aspectos que trazem a diversidade, contribuem para que a nossa prospecção seja mais ampla e expanda essa caixa de possibilidades. Vamos ver um exemplo de um projeto que ainda pode ser considerado como sendo um piloto do que viria a ser o design prospectivo. Trata-se de um trabalho de conclusão de curso de design da UTF-TR, uma estudante que está sendo orientada por mim. Ela está, nesse momento atual que a gente ainda está definindo o que seria design prospectivo, executando na prática algo que é parecido com a nossa proposta. Não executa, digamos assim, toda a ideia do design prospectivo, mas serve para conectar com aquilo que já é possível nos dias de hoje. Então, a Rafaela Pérez, ela tinha uma história muito interessante de uma família que tinha cafeicultoras, mulheres que produzem café, e são as mulheres que produzem café e não os homens, porém os homens é que levam os créditos. E ela ficava a vida toda revoltada com essa situação, pensando "puxa, as mulheres não estão sendo reconhecidas pelo seu trabalho" e ela queria fazer algo a respeito no TCC dela. Então, ela viajou para Pinhalão, no norte do Paraná, onde morava essa parente que era cafeicultora, ela conheceu as amigas dessa parente, ela ficou lá por alguns dias visitando as diferentes propriedades, conhecendo a rotina do dia a dia dessas cafeicultoras, entendendo as dificuldades que elas sofriam para serem reconhecidas na sociedade. E aí, então, ela organiza, junto com essas cafeicultoras, um movimento para aumentar a visibilidade do trabalho das cafeicultoras. São várias oficinas de prospecção de novas relações que essas cafeicultoras poderiam ter com os mercados de consumo, em especial na capital do Paraná, Curitiba, onde a UTFPR está localizada. A partir da prospecção que essas pessoas fazem coletivamente, essas mulheres, surgem relações novas a serem trilhadas com as mulheres que estão vendendo café em Curitiba, as mulheres que estão torrando café em Curitiba, as mulheres que estão promovendo o cenário cultural na cidade. Então, ela organiza um encontro entre essas diferentes mulheres, tanto as que produzem café quanto aquelas que comercializam. Existe uma troca de ideias muito bacana nesse grupo, mas, principalmente, novas relações. Relações comerciais, porque essas mulheres cafeicultoras passam a vender diretamente para as cafeterias de Curitiba, mas também relações de troca de conhecimento, relações afetivas e, principalmente, o empoderamento feminino de mulheres juntas tentando buscar, lutando pelo reconhecimento do seu trabalho. Isso se materializa, essas novas relações se materializam, dentre outras, no formato de uma exposição de fotos retiradas por uma pessoa que colaborava com o TCC dela, uma pessoa que também estava fazendo seu TCC, só que na área de fotografia, uma outra mulher, claro. E essa exibição foi feita nas cafeterias de Curitiba para chamar a atenção para o trabalho dessas mulheres, conscientizando o consumidor de que ele está ajudando essas mulheres, fortalecendo a identidade delas, se eles estiverem conscientes de que elas são mulheres e que elas enfrentam todas as dificuldades e preconceitos na nossa sociedade, do tipo "mulher não pode fazer trabalho pesado". Essas mulheres cafecutoras mostram nessas fotos, claramente, que elas estão ali, sim, puxando peso. E isso não é nada de estranho, não é nada anormal, porque isso já é feito há gerações nessa região do norte do Paraná. O que não se sabia na capital é que essas pessoas, essas mulheres existiam. E ao ver essas mulheres fortes do campo, as mulheres da cidade podem também se inspirar e se tornar mais fortes para enfrentar uma cultura do machismo que a gente, infelizmente, ainda vive no Brasil. Isso aqui é um mapa de relações que foram estabelecidas ou fortalecidas pelo trabalho da Rafaela Pérez, que durou oito meses. São várias novas relações, transações financeiras, trocas de conhecimento, construções coletivas e outras relações que a gente não tem ainda mapeado nesse mapa, porque a cada semana que passa, ele se torna desatualizado. Porque essa rede de relações que essa designer, a Rafaela Pérez, articulou, ela é viva e não depende só dela. Se ela sair dessa rede, a rede continua e essas pessoas vão continuar desenvolvendo novas relações e mantendo as atuais. Esse projeto, ele me faz pensar bastante no horizonte desses quase 20 anos de profissão de que a gente hoje está passando por uma mudança de paradigma. Se no começo da profissão, começo do século XXI, a gente estava muito preocupado na área do design com a informação e a gente tinha essas duas áreas, especialidades, o design da informação e a arquitetura da informação, que era focada na questão de quantos segundos demora para você consumir uma informação, quantos segundos demora para carregar uma página, até quanto tempo o usuário está disposto a esperar para o sistema responder. Tinha todos esses estudos baseados na unidade de análise do tempo do segundo. Porém, conforme a nossa profissão foi evoluindo, as tecnologias mudando, a sociedade se transformando, a gente teve a mudança do paradigma para as interações. O design de interação surgiu lá pelas meadas da primeira década desse século como um novo paradigma de design que era focado na maneira como as pessoas interagiam através das tecnologias e não tanto mais na maneira como a forma que era dada para essa tecnologia. Informação, a palavra forma está dentro. Então, a gente não pensava em interação quando pensava em arquitetura da informação. Hoje, com o design de interação, melhor hoje, já está ficando passado isso, a gente pensa na tecnologia como uma mídia para interagir. Porém, a gente continuou essa discussão na profissão e lá a partir de 2010, 2011, a gente começa a falar de experiências que conectam vários canais de interação. Que você interage por diferentes canais, você pode interagir com uma mesma experiência, com uma percepção de marca, com um tratamento similar, e aí surge o paradigma do design para a experiência do usuário que ainda está em voga até hoje, crescendo cada vez mais. Porém, se na experiência do usuário a gente foca em projetos que duram meses ou se focalizam em meses, agora a proposta do design prospectivo é focar em relações que duram anos e projetos também que vão durar anos. Quando termina o projeto da Rafaela Pérez lá com as cafeicultoras? Não termina, é um projeto que continua, mesmo que ela saia, o projeto de fortalecimento de identidades continua. Então, eu estou provocando a audiência a pensar justamente nisso. Podemos trabalhar com design focado em relações de longo prazo? Bom, primeiro a gente vai precisar ter uma mudança epistemológica, ou seja, o que a gente considera como sendo valioso e conhecimento válido, ou seja, o cerne da nossa profissão. Se no design gráfico, design de produto, o nosso foco eram os objetos estáticos, eles encerravam todo o nosso conhecimento, eles materializavam o nosso conhecimento, no design de experiências, design de interação, a gente já tem uma abertura, uma ampliação de foco para as relações. Porém, a gente não utiliza esse nome e a gente ainda não percebe essa dimensão do longo prazo, mas a gente já vê o objeto como sendo um meio para isso acontecer. A experiência, a interação não estão no objeto, mas elas perpassam o objeto. Agora, no design prospectivo, atenção, porque isso aqui não é mágica, isso aqui é ciência. Nós queremos ver as relações. O objeto desaparece e a gente ganha o campo das relações. Não é que os objetos vão desaparecer da nossa vida, eles vão continuar ali, mas ao olhar para um objeto a gente vai ver um ponto numa rede, a gente vai ver as relações antes de ver os objetos. E é essa provocação que a gente está tentando fazer nesse programa de mestrado. Que tipo de relações você está falando, Fred? Bom, a gente tem pensado em várias relações, mas algumas são mais importantes para o momento, que precisam ser transformadas na nossa sociedade, são urgentes, em principal delas é relações ecológicas. Então nós precisamos repensar nossas relações com o ambiente, porque nós temos um problema seríssimo, que é o aquecimento global, que é a destruição dos nossos recursos naturais, a utilização de combustíveis que não são renováveis. A gente está correndo risco de chegar a um colapso econômico por conta da gente não pensar nas nossas relações ecológicas. Mas existem outras relações que estão entremeadas com as ecológicas e precisam ser pensadas juntas, como as relações de produção, como a gente produz na nossa sociedade, como a gente consome na nossa sociedade, como a gente descarta, reutiliza, repensa. Isso não envolve somente objetos físicos, mas envolve conceitos e ideias também. Neste momento eu estou fazendo uma reciclagem de conceitos para uma profissão, isso são relações de produção. E aí a gente vai ter relações de poder também, que vão impedir muitas vezes que essas novas relações se implementem na nossa sociedade. A gente precisa pensar também em políticas públicas. O design precisa incidir sobre relações de poder através de políticas públicas que vão distribuir o poder e permitir esse tipo de inovação surgir e se ampliar na nossa sociedade. E aí a gente vê que existem certos grupos que vão ser privilegiados, já estão sendo nessas mudanças, e outros grupos são desprivilegiados. Relações de opressão também precisam ser pensadas nesse processo de transformação da sociedade. E por fim, relações internacionais. Design Prospective é brasileiro, é uma inovação que está surgindo numa universidade pública, nós precisamos mostrar isso para o mundo. Então a gente também tem a perspectiva de mudar as relações internacionais para que a gente no design pare de importar conceitos vindos da Bauhaus, da UMI, das universidades que estão fora do Brasil, das empresas que estão fora do Brasil, inverter essa lógica e a gente exportar design. Então a gente quer também repensar relações internacionais. Exemplos práticos extraídos de várias diferentes atividades prospectivas que mostram que design prospectivo não é só uma teoria, não é só um conceito interessante, mas ele já é uma vivência atual na Universidade Tecnológica Federal do Paraná. A gente tem oficinas de prospecção de futuros, utilizando aquele modelo de caixas de possibilidades que eu mostrei anteriormente. A gente tem oficinas em que a gente mapeia relações em grandes visualizações criadas coletivamente, prospectadas coletivamente. A gente também transforma essas visualizações em dados, colocamos em banco de dados, depois visualizamos em larga escala para perceber padrões, como por exemplo, a tendência, curiosamente, ao conservadorismo das tendências digitais. Identificamos isso após mapear duas mil tendências digitais. A gente fez as relações entre elas e percebemos que a tendência das tendências digitais, elas se conectarem com as tendências que já estão estabelecidas no mercado. Ou seja, novas tendências se conectam a velhas tendências. Ao invés de elas gerarem ruptura com as tendências anteriores, elas tentam confirmar as tendências que já estão aí, revelando um aspecto muito curioso que tem relação, com certeza, direta com as eleições de governos conservadores impulsionados por meios digitais nos últimos anos. Também podemos montar novas relações utilizando o legacy display e outras ferramentas baseadas em metáforas. O que é uma metáfora, se não uma relação entre uma coisa e outra coisa? A gente pode usar o teatro, ensaiar novas relações. Teatro do oprimido é uma ferramenta fantástica para discutir relações de opressão, mas também outros tipos de relações que tem por aí, a gente consegue vivenciar no corpo e ao usar o corpo inteiro para prospectar relações, a gente percebe o peso, a materialidade dessas relações, o impacto em nossas vidas que essas relações têm. A gente pode também prototipar relações. Isso já é uma tradição do design de interação, de experiências, mas agora com a perspectiva das relações, o protótipo não é um fim em si mesmo. Ele é apenas um meio para habilitar novas relações a longo prazo. Então, o protótipo precisa ser levado para casa, utilizado durante muito tempo, meses, e a partir daí você tem uma aprendizagem que é muito, mas muito mais rica do que um teste de usabilidade feito em alguns segundos num ambiente artificial voltado para a dimensão do segundo da informação ou da hora da interação, mas o que a gente quer com o design prospectivo é pensar em anos. E aí a gente percebe que é uma vivência necessária e você precisa vivenciar essas novas relações. Eu, como professor de uma universidade pública, estou podendo finalmente experimentar uma pedagogia mais aberta para os estudantes, uma pedagogia que os estudantes definem para onde eles querem ir. É uma pedagogia em que o professor é um mero mediador do processo de aprendizagem. E nessa foto maravilhosa que as estudantes tiraram junto comigo, a gente está materializando essas novas relações de professores e estudantes, de estudantes para estudantes. Elas estão querendo manifestar as coisas que elas aprenderam nessa disciplina para os outros colegas da faculdade e construíram para isso um manifesto vestível, um parangolé que a gente vestiu e saiu pelo campus mostrando com novas ideias. Por fim, relações precisam ser cultivadas e cultivar relações leva tempo. Essa horta urbana em Curitiba, chamada Cajuru, ela já tem gerado vários alimentos para a população em volta, mas o principal benefício de uma horta urbana não é o alimento, não é a produção de alimentos, é principalmente a produção de novas relações entre a vizinhança, novas relações com o mercado de consumo, mercado de produção. Você perceber e entender de onde vem a sua comida e quanto tempo leva para ela ficar pronta. Tudo isso faz parte do cultivo e cultivo talvez seja a palavra-chave para entender como você faz para projetar novas relações. Você não projeta do jeito que a gente fazia tradicionalmente desenhando no papel e mandando para alguém implementar e executar. Você cultiva e isso quebra essa divisão entre projeto e execução. O projeto passa a ser algo, a ser cultivado coletivamente. Agora vem a dimensão do futuro, que é importantíssima para o design prospectivo. Quando você começa a falar de futuro, de novas relações, imediatamente você está alterando e mudando o presente. Falar de futuro é falar de presente. O futuro se altera quando você fala do presente. A gente precisa, para entender isso na prática, deixar de lado a ideia ingênua de que a história é uma decorrência de fatos em sequência linear. O passado é a fase mais primordial, digamos assim, da nossa história e o futuro é onde a gente ainda não chegou. Então, se a gente pensa dessa maneira, a gente vai ver a história como um progresso linear, como um único caminho. Mas, se você abrir um pouquinho mais a perspectiva de história e perceber que existem passados que continuam presentes e que continuam representando futuros, e por outro lado, futuros que nunca se realizaram no presente e hoje já são passado, mas são mantidos no futuro, ou seja, essa confusão toda é mais realista do que a ideia de história como sendo algo linear e progressivo. E aí você entende também por que várias ideias que foram deixadas para trás no passado voltam das cinzas e se estabelecem como novos paradigmas futuristas. Por exemplo, a ideia de futuro do Brasil ser a sociedade que a gente tinha em 1970 no Brasil. É uma coisa muito curiosa que está hoje estabelecida no Brasil como um desafio para a gente pensar a prospecção de novas relações. Uma prospecção realista vai ter que considerar que existem vários futuros, vários presentes, vários passados, cada um deles sendo uma alternativa possível para ser prospectada, para ser vivida. Então, a ideia de que o progresso é linear e só existe um caminho possível e que a gente hoje está no topo da nossa possibilidade, que a gente é o mais avançado hoje, não, não diz respeito ao design prospectivo. No design prospectivo as possibilidades são abertas e você pode, ao invés de utilizar o carro como a ferramenta de morabilidade, você pode ter bicicleta, você pode ter patinete, você pode ter a propulsão humana, que é uma das mais sustentáveis, projetando cidades para que as pessoas possam caminhar. Isso é um presente alternativo, já podemos fazer isso, basta a gente considerar que isso é o nosso futuro, isso que a gente quer para o nosso futuro, cidades que são andáveis. Então, a gente, para chegar lá e perceber essas mudanças, a gente precisa de projetos de transição. Eles vão tentar semear esses futuros, através da consideração de passados e presentes alternativos. Projetos de transição é uma categoria nova de projeto que a gente não inventou, a gente simplesmente está reproduzindo no nosso programa, mas que foi pioneirizada ou divulgada bastante pela Universidade Claring-Mellon, nos Estados Unidos. Eles têm um programa de doutorado em Transition Design, que a gente resolveu não chamar a nossa proposta de design de transições, porque a gente queria fazer algo nosso, brasileiro, repensar o Transition Design a partir das nossas perspectivas culturais, da nossa matriz brasileira. Mas a gente traz algumas técnicas e transforma e adapta para a nossa realidade. Por exemplo, o Backcasting, que é uma ferramenta fantástica. Você provoca um grupo, uma prospecção coletiva de um futuro daqui a 50 anos, visualiza, materializa esse futuro, é difícil, demora um tempo, depois você vai materializando uma década após outra década, anterior àquele futuro. O Backcasting, então, é você voltar atrás e ver quais são os passos necessários para a gente chegar lá naquele futuro desejável daqui a 50 anos. E o projeto de transição é isso. Ao invés de você projetar algo bizarro, como o design especulativo faz, que você não consegue visualizar aquilo sendo possível, você primeiro pensa no impossível para depois voltar atrás e pensar quais são os próximos passos para isso se tornar possível. Então, o Backcasting é uma ferramenta que a gente utiliza bastante lá no design prospectivo. Isso aqui é um exemplo de um Backcasting aplicado para uma igreja, a Igreja Ágape, onde o estudante faz parte da UTF-PR. Ele foi lá, estudou quais eram os perspectivos de futuro, diferentes futuros que as pessoas tinham nessa igreja, consolidou uma ideia para aquela igreja, um plano que ela não tinha. Como vai ser essa igreja daqui a 50 anos? E esse plano inclui questões de sustentabilidade muito importantes para algumas pessoas, não tão importantes para outras, mas a partir do momento que se torna parte de um plano estratégico de futuro, aquilo ali é uma questão da comunidade. Aqui é um exemplo de um grupo de estudantes que foi no acertamento do Contestado, no MST, para verificar projetos de transição para a agroecologia. Para quem não sabe, o MST é uma das organizações mais importantes para a promoção da agroecologia no Brasil. Tem vários desses assentamentos que muitas vezes as pessoas acham que é simplesmente uma invasão de terras. Não, é uma transformação de terras em produtivas e improdutivas, visando gerar economia para uma agricultura familiar e ecológica, que tem um impacto ambiental muito menor, demonstrando que isso é possível de ser feito se a gente tiver a tal da reforma agrária que o MST defende. Essa estudante pensou, então, como será possível para que as pessoas mudem essa perspectiva negativa que elas têm em relação à agroecologia, em relação ao MST, e ela pensou em uma série de etapas visando a educação das crianças para aquelas tendências problemáticas do impacto que a gente tem hoje da agroindústria. E aqui um projeto, voltando àquela horta do Cajdu, que eu mostrei agora há pouco, um projeto de transição para essa horta. Como que essa horta pode ser sustentável, tanto na produção quanto no consumo? Vocês podem ver que o mapa tem vários elementos, não dá tempo de ler todos esses elementos, mas perceber a complexidade de um projeto desse porte. O projeto de transição não foca em uma única coisa, ele foca em várias, porque o foco da transição são as novas relações. O último projeto que eu vou mostrar para vocês é um projeto de igualdade de gêneros na moda. Então, as estudantes estavam interessadas em mudar essa relação de gênero que coloca as mulheres normalmente em posições subservientes ou desconfortáveis. No caso da moda, especificamente, a imposição do sutiã como um adereço importantíssimo para a mulher, obrigatório. A mulher não pode socialmente deixar de usar sutiã. Se alguém perceber isso, isso pode voltar contra ela, ser uma característica negativa na interação social. Para tentar provocar novas relações com a moda e com os gêneros, essas estudantes criaram o escrotiã, que é o equivalente ao sutiã. Assim como as mulheres são obrigadas a utilizar sutiã para evitar que as mamas caiam no futuro, assim, da mesma maneira, os homens serão obrigados a utilizar o escrotiã para evitar que o escroto caia ao longo do tempo. Então, esse projeto tem uma pegada um pouco especulativa também, como a gente viu anteriormente, mas diferente do projeto especulativo, não existe absolutamente nada que impeça que a gente produza o escrotiã hoje em dia. Nós temos toda uma série de experiências, de tecnologias, de materiais e de hábitos para incorporar o escrotiã a partir da experiência do sutiã, promovendo, assim, uma igualdade de gêneros, inclusive na nossa intimidade. Então, se os homens, se as mulheres têm as vantagens e as desvantagens do sutiã, por que não os homens deveriam ter vantagens e desvantagens do escrotiã? E o escrotiã, elas criaram de uma maneira muito convincente, tem até a versão dry fit para fazer exercício, para você não ficar suado, não ter coceira, ficar com aquele hábito horrível de coçar o escroto e tudo o que vai. Então, o escrotiã resolve vários problemas práticos, mas o foco dele são as novas relações. Esses projetos que eu mostrei para vocês, eles estão focados em qualidades que não são intrínsecas aos objetos, são qualidades relacionais. Então, elas não emergem de um objeto individual, elas emergem na relação entre vários objetos. É o que a gente chama de qualidades relacionais, qualidades de relações entre coisas que só são possíveis de ser percebidas quando você tem essas várias coisas em interação. Então, a rede é a base para você entender essa transição que a gente quer provocar dentro do design, parar de pensar em usabilidade, acessibilidade, durabilidade, utilidade, beleza e clareza, que são todas características do design do passado, esse design de experiência, interação, informação que a gente falou anteriormente, e começar a pensar no design prospectivo, que é focado em qualidades relacionais, sustentabilidade, igualdade, resiliência, solidariedade, a convivialidade e a mobilidade. Todas essas são propriedades de redes, não são propriedades de coisas individuais. E aí você começa a pensar, puxa, isso aqui é uma ampliação gigante de escopo de um projeto de design. Se a gente começa a pensar nessas qualidades relacionais, a gente sim vai ter que se ver com muita complexidade. E aí entram novas ferramentas para a prospecção. Então, aqui tem várias ferramentas que a Carnegie Mellon desenvolveu no transition design, que a gente está incorporando e a gente está desenvolvendo novas. Mas percebam que não adianta você fazer uma mudança em um sistema sociotécnico, essa rede que eu estava mencionando, tecnicamente é chamada de sistema sociotécnico, mistura tecnologias com relações sociais. Não adianta você mudar um elemento só para que haja uma mudança na qualidade relacional. Por exemplo, a sustentabilidade da mobilidade não depende só do carro elétrico. Se você só troca o carro elétrico, beleza, você vai andar uma, duas quadras, acabou a energia, como é que você recarrega? Aí você vai recarregar na sua casa, cai a energia da casa, o disjuntor não aguenta, você precisa ter infraestrutura para carregar carros elétricos. Se você for viajar, como é que você vai fazer? A Copel, que é a companhia de energia elétrica do estado do Paraná, desenvolveu um posto de eletrocarga e espalhou pelo Paraná apenas uma rodovia a título de teste, e você pode viajar de uma ponta a outra do estado utilizando um carro elétrico. Porém, isso ainda não é suficiente, é preciso ter uma intervenção completa no grid da distribuição do sistema de energia elétrica para que a gente mude a nossa matriz. Então, esse sistema só vai mudar quando houver pressões de todos os lados, já existem pressões ambientais, mas tem que ter pressões políticas também, é fundamental para que mudanças no nível de sistema sociotécnico aconteçam. A gente fez um projeto lá na Copel de prospecção de futuros, utilizando várias técnicas que eu já mostrei aqui, mas outras que eu não mostrei também, que visaram coletivamente imaginar como fazer essa transição para um sistema de distribuição mais sustentável. Então, a gente pensou, a gente precisa de startups, a gente precisa de empresas que tragam novas relações, porque nós, Copel, não vamos conseguir dar conta dessa inovação necessária. Então, o Paradigma para Copel se tornou inovação aberta, ela lançou um programa chamado Copel+ convocando startups do Brasil inteiro para participar desse desafio que é fazer as transformações necessárias, mudar as relações nesse sistema conscientes das dificuldades que o sistema enfrenta. Então, corajosamente, a Copel publicou vários vídeos e animações explicando quais são hoje as pressões mais fortes, mais tensas dentro do sistema de distribuição de energia elétrica, que a própria Copel não consegue resolver sozinha. Imagine a coragem da Copel se relacionar com públicos dessa maneira aberta e transparente. Foi bastante difícil fazer essa transição, mas o segredo foi envolver os diferentes stakeholders, os diferentes atores dentro da Copel, fora da Copel, que colocassem pressão sobre esse projeto para que ele realmente acontecesse. E ele está aí, o projeto ainda não acabou, as startups estão neste momento construindo suas provas de conceito e a gente espera que novas relações sejam inauguradas no setor elétrico muito em breve. Então, resumindo a minha fala, no design prospectivo, o designer, ele toma um outro papel, ele se torna não mais um criador isolado, mas um facilitador de várias criações, de vários processos, criações focadas em novas relações, focadas em facilitar transições para horizontes, novos futuros, novas possibilidades, inaugurando aí o que eu chamei de novo possível. Isso aqui é uma visualização mais completa de várias ideias que a gente tem discutido no nosso PPG Design. O que eu apresentei aqui é apenas a ponta do iceberg das nossas agendas de pesquisa. A professora Fernanda Botta, que fez esse maravilhoso infográfico mostrando as diferentes possibilidades de pesquisa que a gente pretende abordar nesse programa, caso ele seja aceito pela Capes. Então, a gente está muito otimista que nós vamos enfrentar uma série de novos problemas de pesquisa que ainda não foram trabalhados no Brasil na pesquisa e também podem vir a ser trabalhados não só com uma pesquisa isolada na academia, mas com uma pesquisa engajada com empresas, com governos, com entidades da sociedade civil organizadas e também com entidades que não são organizadas como movimentos sociais espontâneos que surgem por aí. Então, resumindo, principais diferenciais do design prospectivo para outras abordagens de design que existem por aí. Primeiro lugar, possibilismo ao invés de probabilismo. Nós nos concentramos em qualidades e não em quantidades. Previsões baseadas em números estão fadadas a darem errado, porque vão perder a consciência da qualidade. Veja no Chile, por exemplo, todos os índices socioeconômicos são perfeitos, são ótimos. Parecia um país que estava dando muito certo, tanto é que era referência para o nosso ministro da Economia. Porém, agora o Chile explodiu em vários manifestos que aconteceram por todo o país e o governo está sendo reconstruído do zero praticamente por conta da falta de foco em qualidade. Perdeu-se a noção de qualidade de vida, mas que qualidade de vida? Qualidades relacionais. Então, ao invés de olhar para coisas como produto interno bruto, nós precisamos olhar para, por exemplo, a felicidade da população. Isso é uma questão qualitativa e não quantitativa. Por isso, probabilidades não vão tirar a gente das relações atuais. Pelo contrário, o que a gente tem que fazer é continuar mantendo as relações atuais. Se queremos novas relações, precisamos de possibilismo, acreditar que é sempre possível alternativas, acreditar firmemente que é possível prospectar novas relações se a gente se unir e focar em relações de longo prazo. Desenvolvendo, então, projetos com escopo amplo voltados para qualidades relacionais. Muito obrigado. [aplausos] E aí, temos tempo para perguntas? Que massa, Pedro. Eu achei muito legal o nosso arduino. Eu trabalho com o MyOT. Nós temos espaço para perguntas, pessoal. Vocês querem fazer perguntas? Alguém está fazendo pergunta aqui. Dá para ligar as luzes? Fica melhor. Pode ligar. Bom dia, eu queria saber, como artista de graça básica, o que difere o design perspectivo do design estratégico e do design sintético, basicamente? Do design estratégico, qual foi o outro nome que você falou? Design sintético e design estratégico. Tá, muito bem. O design sintético e o design estratégico são... Desculpa, o microfone... Giovanni, por favor, obrigado. Design thinking... Opa. Você ligou? Oi. Design thinking e design estratégico são abordagens de design focalizadas em gestão de alto nível. Focalizadas em diretorias, focalizadas em pessoas que estão no topo da organização, mas lógica top-down. O design prospectivo é bottom-up e ele não é necessariamente focado em uma organização. Hoje existem algumas tentativas de fazer design thinking entre organizações, principalmente feitas por organizações de representação de classe, organizações governamentais. Estão começando a experimentar isso. Mas aí eu já diria que é design prospectivo, já não é mais design thinking. O design prospectivo foca em prospecções coletivas, que é uma coisa que o design thinking não está focado, ele está focado em solução de problemas atuais, isso é o design thinking. E por outro lado, diferente do design estratégico, que está focado em visualização de cenários, planejamento de cenários para a diretoria, para a estratégia de uma organização, no design prospectivo estamos interessados em sociedade, em sistemas sociotécnicos. Então, existem sim, similaridades e diferenças com o que já existe no design prospectivo, do design estratégico e do design thinking. Respondido? Parcialmente. Parcialmente porque realmente a gente precisa discutir e pensar mais a respeito dessa questão por conta de design thinking ser uma palavra importada no Brasil, que a gente nem traduz. Eu gosto de traduzir com pensamento projetual, eu acho muito ruim a gente não fazer essa tradução. E acho também pior ainda a gente ficar reproduzindo um modelo estadunidense, que às vezes não tem a ver com a nossa realidade aqui no Brasil. E por isso que às vezes parece que o que a gente está fazendo no design prospectivo é similar, mas é completamente diferente, porque a gente está tentando trazer das nossas bases culturais e ao fazer isso dar a nossa cara, a nossa apropriação para essa abordagem de design. Lá atrás? Está chegando, está chegando. Eu queria perguntar qual é a diferença entre prospecção de cenários e projeção de cenários? Bom, eu não falei de projeção de cenários, mas... Não, eu falei. É. Você falou prospeção. Isso. A projeção de cenários é baseada em probabilidades, é baseada em cálculo de a probabilidade de algo acontecer, ela é baseada em conhecimentos que você já tem, então você vai projetar a partir do que você já sabe, você tem certos números hoje, por exemplo, a nossa taxa de vendas hoje é X. Se continuar crescendo da maneira como cresceu nos últimos três anos, vamos projetar que o nosso futuro seja parecido com o que tem hoje. E aí você entra no problema que aconteceu no Chile. As projeções para o Chile é de ser o país mais desenvolvido da América Latina, porém acontece algo inesperado, que é uma ruptura nas relações, uma ruptura no modo de governar o país por conta de uma organização inesperada da população. Então a prospeção, a diferença delas é que ela tenta antecipar esse tipo de movimento, focalizando não só no que é provável, mas no que é improvável e também aquilo que é impossível e impensável. Então a prospeção tem uma abordagem muito mais coletiva do que a projeção e muito mais qualitativa. Ajudou a responder? E tem mais um ponto também, que é a materialização dessas relações, que é algo que quando você faz projeção de cenários, você materializa através de planilhas gráficas e tudo mais, a gente materializa relações através de teatro, de Lego, através de protótipos, como eu mostrei aqui nas imagens. Isso é algo que tem na projeção de cenários. Eu gostaria de te fazer uma pergunta. Onde? Levanta a mão. Ah, beleza. Quando você fez a relação de prospeção de relações e essa questão de acertamentos, você entra num viés público de um cenário que tem duas formas de ser visto. Tem um lado político, que pode ser negativo, inclusive como o GMSP está envolvido, e também tem um lado social e coletivo, que é super rico dentro desses acertamentos. Que também tem a ver com o GMSP estar envolvido. Exatamente. Só que essa ideia de prospeção de relações, ela pode ter um viés de comunicação futura na forma de melhorar a visibilidade sobre um projeto ou alguma ideia em que tenha só um lado de visibilidade na rede mídia, digamos assim? Com certeza. O MST sofre um problema seríssimo, que é a história única. Então só existe uma história. O MST é uma organização que promove balbúrdia, que invade propriedades, que mata pessoas e que come crianças. Às vezes isso só circula nas redes sociais, na grande mídia, mas existe uma outra história. Existem as histórias desses assentamentos maravilhosos como o do Contestado. Existem também histórias de desastres que aconteceram no MST e que vale a pena realmente a crítica. Qualquer movimento social está sujeito a apropriações idêbitas e líderes corruptos. Mas, se você for olhar na história do movimento Sem Terra, existem várias coisas muito bacanas, principalmente a estabelecimento da rotina da agroecologia e a necessidade de comunicar isso para as pessoas, elas perceberem que o MST não é só invasão, mas ele também é produção de, por exemplo, alimentos orgânicos. O MST é pioneiro na produção orgânica no Brasil, gerou várias técnicas que se espalharam ao redor do Brasil e hoje você tem várias propriedades que não são de ocupação, utilizando técnicas desenvolvidas pelos assentamentos do MST. Então, acho que essas novas relações vão ser desenvolvidas quando coletivamente a gente se organizar e envolver não só o MST, mas esses outros grupos que estão trabalhando com a agricultura orgânica e também os grupos de consumidores nas grandes cidades. Acho que isso é fundamental. Mais alguém? Primeiro, acho que é muito bacana essa pauta. Acho que hoje temos tudo como sempre. O que o professor já usava, as relações entre as pessoas a partir dos conhecimentos, eu acho que são pautas que a gente também precisa. Eu só tenho dúvidas em relação à entrega que o MST não se propõe. Em alguns momentos parece mais provocativa. Tem uma pauta mais provocativa, uma pauta mais grotiana, você tem aquela disposição da área de casa mulher. Então, é a entrega que vocês esperam? É um produto ou é uma arte? O que vocês pensam que faz? Não tem entrega. A proposta do design prospectivo é não entregar objetos. A ideia de entregáveis, que é uma ideia muito forte hoje no design de experiências, no design de serviços, eu acho que é uma péssima ideia, porque é o oposto da ideia de você cultivar uma relação. Você entrega um resultado e te vive com esse resultado. Quando você quer projetar uma relação, você vai cultivar ela a longo prazo. Então, não vai ter uma entrega, vão ter ações. Claro que eu estou entendendo a intenção da sua pergunta. Que ações concretas vão ser feitas a partir do design prospectivo? Eu acredito que a gente está bem no começo ainda das experimentações, isso aqui é um conceito que surgiu no começo deste ano. Então, a gente ainda tem poucos projetos concretos para mostrar de fato como é que é o design prospectivo. Mas eu acredito que a tendência é gerar políticas públicas, gerar estratégias de organizações, estratégias de multiorganização, ou seja, arranjos produtivos locais. A Abrade, por exemplo, pode ser uma promotora de prospecção coletiva para as agências digitais visualizarem qual o futuro desse mercado. Ela já deve fazer isso, mas talvez com o design prospectivo ajude a materializar isso, por exemplo. E novos serviços, novos produtos que vão permitir que essas relações se mantenham. Então, a gente não está negando a ideia de você produzir serviços, produtos e tudo mais que a gente já fazia. A gente está colocando isso dentro de uma perspectiva mais ampla. Pessoal, me permitam fazer um anúncio. Às 11h15 aqui nessa sala nós vamos ter o Augusto Macedo da Dobra, sim, aquela cadeirinha fininha que já virou um gesto de desejo de toda a galera. O Auditório 2 de Verônica Souza, da faixinha da Hipster, da faixinha boa, e do Teatro, e a grande jardã Ubix, quase tudo de conteúdo digital. A gente tem que manter bem pronto, mas vamos organizar. Porque nós vamos fazer um intervalo de 15 minutos, quem quiser trocar de auditório fica à vontade, e quem quiser ouvir mais perguntas aqui fica à vontade. Eu queria saber qual que é o índice, por exemplo, que você atinge com a economia solidária. A economia solidária é uma proposta muito interessante para reinverter a lógica de extração de mais-valia a partir do trabalho. Ao invés de você trabalhar para você pagar o seu aluguel e tudo mais, você vai trabalhar para manter a sua vida coletivamente. Então, as pessoas que... Para você fazer isso, você vai precisar organizar uma rede de outras pessoas que também queiram se manter solidariamente, baseada na solidariedade e não nas transações financeiras. Então, existe um potencial, e já existem vários grupos de economia solidária no Brasil, mas que eles não estão se apropriando de novas tecnologias, de novos serviços que permitem que isso aconteça em maior escala. Então, o designer prospectivo pode ajudar esses grupos de economia solidária a se conectarem para que essas relações se tornem mais sustentáveis a nível nacional, a nível regional e por aí vai. Então, eu vejo um grande potencial de dar escala para esse movimento pequeno que já existe de economia solidária no Brasil. Mais alguém? Eu queria parabenizar a Dela Rabe, mas vou ativar. Só uma curiosidade, você é professora, você cresceu no futuro na Universidade Federal, no Rio Grande, e você já trabalhou com outros professores, Pedro, mas aí eu complemento, né, porque eu acho que a gente precisa também, acho que dar um pouquinho fora do que a gente tem que trabalhar na educação nas universidades, de uma forma geral. Faça essa colocação, sei que você já trabalhou aqui. Eu como coordenador de uma partezinha lá, se chama Rio do Frio e tal, me dá vontade de trabalhar com isso também, com as maneiras de ver se a gente consegue mudar as nossas perspectivas. Você fala especificamente no design ou qualquer outra área? No mesmo que você trabalhou hoje, né, esse design de prospectivo, cara. Bom, a gente vê que os professores, eles têm uma tarefa muito importante, que é estar formando as pessoas que vão fazer parte do futuro da nossa sociedade. Porém, o professor muitas vezes ele sofre pressões de vários lados para ensinar questões que a sociedade acha que tem que estar na cabeça do estudante. Ou seja, o professor ele passa a ser apenas um depositário de conhecimentos na cabeça dos estudantes, como dizia o Paulo Freire, né. A educação bancária é aquela que coloca um dinheirinho na cabeça do estudante, como se conhecimento fosse uma espécie de capital que você pode ser que use, pode ser que você não use, mas a sociedade diz-se que você tem que usar, porque está nos currículos mínimos da educação, porque é uma demanda de mercado. Mas eu acho que o papel do professor prospectivo, se a gente pode fazer essa analogia, é ajudar os estudantes a perceberem não aquilo que está vindo, digamos assim, das legislações, ou está vindo dos currículos, ou está vindo de pessoas que estão, digamos assim, no poder na sociedade. Mas sim aquilo que está vindo de baixo também. As transformações que a gente não está percebendo, que estão ali potenciais e que podem ser muito mais transformadoras, podem ser muito mais importantes para novas relações do que aquelas que vêm de cima para baixo. Então o professor prospectivo é aquele que abre a sala de aula para ser um laboratório de investigações de novas relações. Tal como eu mostrei com os nossos estudantes aqui, a gente deitado no chão em roda, né. Aquilo ali é um processo de baixo para cima, né, que não tem um currículo na disciplina pré-determinado. Os estudantes a cada aula decidem o que eles vão querer fazer na próxima aula. Isso inclui fazer um estudo, ler alguma coisa, apresentar um artigo, ou então realmente produzir alguma coisa, fazer uma ação concreta. Eu acho que o futuro da educação é se tornar um processo sob demanda, né, um processo coletivo em que o professor é apenas um facilitador de transições, trazendo aí a analogia entre designer e professor. Obrigado pela pergunta. Mais alguma provocação, pessoal? Muito obrigado pela sua presença. Muito obrigado vocês pelas perguntas. Até mais. Qualquer coisa eu estou por aí para conversar mais.