Design expansivo, pensar o possível para fazer o impossível, isso aqui é uma reflexão de todas as coisas que me aconteceram e que eu fui aprendendo, que eu fui mudando de perspectiva, tentando coisas e acrescentando novos elementos para o que na minha tese de doutorado eu chamei de design expansivo. Aqui eu estou resumindo, então design expansivo seria pensar o possível para fazer o impossível. Então vou dar um padrão geral mostrando várias experiências desses últimos anos, especialmente aqui na UTF-PR, em que a gente tentou pensar o possível e fazer o impossível. Vamos começar a partir da visão mais ingênua que existe sobre criatividade, que é o tema dessa disciplina psicologia 1. Aqui a gente vai dizer que é o mesmo que pensar fora da caixa ou fazer mais com menos. Bom, e se a caixa que você está falando for o capitalismo? E se for o material para você fazer com menos, for o recurso humano? Será que é possível pensar fora do capitalismo e fazer mais com ainda menos recursos humanos do que a gente hoje utiliza? Então essas são as questões que têm motivado o design expansivo, que seria uma abordagem para a gente acreditar que é possível repensar o capitalismo. O Mark Fischer, que é um sociólogo que já falecido, escreveu um livro muito interessante chamado Realismo Capitalista, ele analisa como depois da queda da União Soviética teve um impacto muito grande sobre o imaginário, em especial das futuras gerações e jovens, pessoas como vocês que estão começando as suas vidas e acredito que tem muitas coisas estranhas nessa sociedade, muitas contradições que poderiam ser superadas. A sociedade poderia ser diferente, só que o capitalismo se impõe como uma única alternativa ou como não há nenhuma outra alternativa ao capitalismo. E aí ele vai concluir, ou vai perguntar, melhor levantar o debate, será que é mais fácil imaginar o fim do mundo do que imaginar o fim do capitalismo? Tem gente que vai citar esse trabalho dele como se ele estivesse afirmando isso, se ele simplesmente estivesse aceitando que não é possível pensar no fim do capitalismo, mas ele coloca como uma pergunta para a gente continuar tentando pensar que o fim do capitalismo é possível. Aqui no Brasil nós temos pensadores que vêm de outras matrizes culturais, como os indígenas, o Ailton Krenak escreveu um livro fantástico, na verdade vários livros interessantes, falas e palestras, mas esse livro eu destaco porque ele fala sobre o fim do mundo e a perspectiva de que para os indígenas um homem branco, o caraíba, ele estaria destruindo o seu próprio mundo na medida em que ele não se preocupa, por exemplo, com os impactos ambientais das suas ações, da sua atividade econômica. E aí ele propõe, já que nós estamos caminhando para o fim do mundo, que tal a gente fazer algumas coisas que possam adiar? Se um fim do mundo é inevitável, o que a gente pode fazer para adiar? Uma delas é a gente conter e limitar o capitalismo. Ele também se junta ao Mark Fisher nessa perspectiva de que, ok, é difícil imaginar o fim do mundo, mas a gente pode adiá-lo pelo menos. Quer dizer, é fácil pensar no fim do mundo, mas a gente pode adiar. Então para pensar esse fim do capitalismo e ao mesmo tempo adiar o fim do mundo, é preciso produzir o que eu chamo de "alter/nativas". Eu separo a palavra alternativo para enfatizar que se a gente quiser mudar alguma coisa em relação ao capitalismo tem que mudar de dentro para fora, ou seja, de dentro do nosso próprio país, da nossa própria comunidade, da nossa própria matriz cultural. Então eu não estou aqui defendendo uma alternativa que viria de fora, como um socialismo importado de fora, um socialismo stalinista, por exemplo, um socialismo iuguslávio, baseado na autogestão, ou socialismo coreano, do norte, ou socialismo cubano. Eu não acho que nenhuma dessas abordagens deveria ser importadas para o Brasil. A alternativa significa o quê? Que o capitalismo vai precisar ser combatido e criado, ou melhor, superado em cada nação, em cada espaço, em cada construção social. Então nativo aqui quer dizer que vem de dentro, nato, nesta terra, neste ambiente, nesse território. E aí que entra o design. As áreas são muito bons em produzir alter/nativas, porém, às vezes, devido a um fenômeno que eu chamo de colonialidade do fazer, que seria uma das ranças do colonialismo, que ainda nos, embora a gente tenha se libertado da colonialidade do poder, talvez em larga medida, e hoje nós não tenhamos que obedecer a Portugal, na verdade Portugal muitas vezes tem que seguir a gente. Por outro lado, nós ainda temos que seguir modos de fazeres, que são importados de fora, e as universidades e os cursos superiores de design têm um papel fundamental em manter essa colonialidade do fazer, que se consubstancia, por exemplo, em você ter que aprender a desenhar usando o compasso, como a colega ali está fazendo nesse momento agora. E por causa dessas ferramentas estrangeiras, o compasso é uma ferramenta que não vem, não surgiu no Brasil, não é uma alternativa, ela vem para colonizar mesmo o nosso desenho, e aí o que a gente acaba fazendo com essas ferramentas é produzir o que eu chamo de alter/gringas, então o gringo é oposto ao nativo, aquele que vem de fora. E aí o que acontece, se você tentar imaginar o fim do capitalismo e adiar o fim do mundo usando uma inteligência artificial como mid-journey, como eu tentei aqui, meu prompt foi imagine/sudo a sociedade utópica de design socialista brasileiro baseado em economia solidária, autogestão, desenvolvimento autônomo, agroecologia, tecnologia livre, educação popular, pessoas diversas. Várias ideias e propostas e conceitos que a gente tem desenvolvido ao longo dos anos nas nossas pesquisas, e o resultado das imagens é uma, claro, alter/gringo, porque você olha para isso e você fala "meu, se essa sociedade é assim, eu não quero ir para ela", uma sociedade em que a alternativa ao capitalismo é um livro, vermelho e preto, que a alternativa é um professor dando aula para um monte de plantação de repolhos, quer dizer, pessoas que estão apenas olhando, observando, quer dizer, não questiona o modo de produção da educação, a educação continua sendo centrada num professor que detém o conhecimento e os outros vão ouvir, e esses diagramas que não dizem nada com nada, que é uma coisa misturada, quer dizer, essas alternativas não são alternativas, são alter/gringas, não são reais, não são concretas, não tem sentido, não tem relevância para o nosso contexto social histórico. O que seria uma alternativa? Seria você entender que o mid-journey tem um bias, tem um viés em que a língua inglesa ela por enquanto vai permitir você ter um controle maior sobre o tipo de imagem que você vai produzir, se você usa a língua portuguesa ele funciona, mas ele não dá uma amplitude muito grande de espaço, de possibilidades, porque a quantidade de textos e de imagens que o mid-journey engoliu para poder treinar a sua base de dados em português é muito pequena, isso é porque os treinadores dessas bases de dados estavam localizados majoritariamente em países de língua inglesa, então você tem um viés contra os brasileiros, contra quem fala português, que se o brasileiro perceber, ok, se o viés é "a minha língua vale menos" eu vou se me apropriar da língua do colonizador e usar a língua do colonizador contra ele, tal como a Bell Hooks nos ensina. Então se você digitar no mid-journey, quer dizer, eu digitei lá no mid-journey, imagine/Brazilian socialist, socialist design, utopias society-based, on solidarity, economy, self-management, autonomous development, agroecology, liberal technology, popular education, diverse people, você pode conseguir uma imagem que tem bastante relevância para o nosso contexto. Esta imagem aqui tem, por exemplo, na frente a música e a música popular, que é uma característica muito interessante da educação popular, da economia solidária, da autogestão, no Brasil essa alternativa vem do campo, os grupos mais fortes que mantêm o aspecto popular da nossa cultura estão fora dos grandes centros, o movimento social, o movimento do Sem Terra, por exemplo, é um movimento que articula muitos desses outros movimentos, em manutenção das culturas originares, tradicionais, ou também culturas novas que estão surgindo também como, por exemplo, as culturas dos subgrupos dentro das favelas, dentro das periferias, isso tudo está aqui dentro dessa imagem. Então aqui você tem inclusive até a possibilidade de um prédio em formato de uma guitarra, que eu achei fantástico, então o mid-journey faz umas coisas assim que é muito louca. Então aqui nós temos uma visão de futuro, uma utopia, uma possibilidade de superação dessa sociedade capitalista que não nos oferece muita perspectiva de futuro, as perspectivas atualmente de econômicas, políticas, são bastante preocupantes do ponto de vista da instabilidade que foi testada até os limites com a pandemia Covid. Então para a gente transformar essas altergringas que as inteligências artificiais, outras ferramentas de design nos trazem, essas importadas, a gente precisa da curadoria e o improviso de uma inteligência artificial de carne e osso. E com isso eu quero dizer que vocês também são inteligências artificiais, porque a sociedade de uma certa maneira está produzindo a inteligência de vocês. E este momento aqui é um momento cruciais, em que vocês estão se engajando com a produção de inteligência no design, artificialmente, porque isso aqui é uma política pública de educação pública gratuita de qualidade em design. Então a inteligência de vocês é uma inteligência também artificial. Existe a inteligência natural? É claro, não estou negando o aspecto biológico, que inclusive pode resultar muitas vezes em severidades, deficiências, mas a inteligência artificial sobrepõe-se ao biológico e vai muito além. Você pode ser muito mais inteligente se você souber e conscientizar-se dessa inteligência artificial de onde ela vem. Por exemplo, para negar burrices artificiais, que seria reproduzir padrões estéticos vindos do exterior no Brasil. Isso não tem nada a ver com pensar fora da caixa nem tampouco fazer mais com menos. Isso é o que a gente vem chamando aqui nessa disciplina de metacreatividade. O realismo capitalista é esse que diz que é mais fácil você pensar o fim do mundo do que pensar o fim do capitalismo. Ele bloqueia o desenvolvimento dessa metacreatividade. Você acha que não tem alternativa? Metacreatividade a gente tem definido e usado bastante esse diagrama nas aulas passadas. Seria essa interação entre cria-corpos em diferentes cria-espacios. O conceito de pensar fora da caixa seria equivalente a essa modificação que eu fiz na imagem. Eu coloquei a criatividade extravasando, vazando para fora do cria-espaço. Seria o equivalente a pensar fora da caixa. No caso dessa imagem a caixa seria o cria-espaço, essa bolinha preenchida, enquanto que a criatividade seria esses movimentos circulares em volta dela. Pode parecer interessante a princípio, só que pensar fora da caixa significa também pensar fora desse cria-espaço, ou seja, fora do que é considerado possível. Isso tem várias consequências. Quando a gente fala impossível e impossível a gente pensa muitas vezes em conceitos, em palavras, mas a gente pode pensar também como espaços. Então se você pensar o possível como um espaço de possibilidades, que a gente acha que dá para fazer, e o impossível como espaço de possibilidades, que a gente conhece, a gente imagina, mas a gente sabe que não dá para fazer, ou acha que não dá para fazer, e aí você tendo gratações, espaços intermediários, como o provável, o improvável, e além do impossível o impensável, seria muito mais difícil ainda de você atingir. Então fazer mais do menos, por outro lado, que vem junto com pensar fora da caixa, significa restringir-se algo menor do que é possível, que seria o equivalente a você fazer o medíocre. Você sabe que é possível fazer melhor, mas você não quer fazer, você faz uma coisa mal feita, ruim, tosca, inútil, só para passar na disciplina, ou só para você receber o pagamento logo. Isso é medíocre. Isso é menos do que o possível. Só que o possível ele não é fixo, ele é uma construção histórica, ele pode ser transformada. Então por isso que é possível pensar o impossível para repensar o possível. E aqui eu não estou fazendo um mero jogo de palavras, visualmente vai ficar um pouco mais evidente isso. Você sair do possível e buscar o impossível para você chegar num outro possível, que seria o provável, que daí já larga, já vira o novo possível, um possível repensado, um possível alargado. Pensar fora da caixa também implica em pensar fora do corpo. Eu já falei como é pensar fora da caixa, pensar fora do espaço é essa compreensão mais comum, mais de pensão comum. Agora no ponto de vista mais científico e crítico, pensar fora da caixa significa também pensar fora do criacorpo, fora dos nossos hábitos, fora das posições sociais, enfim, última análise, fora de lugar. Isso me remete a um mito muito antigo, talvez um dos mitos da filosofia mais antigo, o mito da caverna. O mito da caverna é o seguinte, o Platão vai escrever sobre ele e falar que é um mito só. Imagine que um grupo de pessoas, seres humanos foram criados dentro de uma caverna e o outro grupo de seres humanos representados aí, talvez que formam uma espécie de um secto religioso, eles vão nutrir, vão dar alimento e vão também proteger essas pessoas que estão aqui dentro com uma visão deturpada da realidade, reduzida da realidade. Como é que eles vão fazer isso? Eles vão colocar um fogo no fundo e esse fogo vai gerar luminosidade com a qual eles vão interceder com esses bonecos de sombra, não sei como é que chama isso aqui, essas marionetes para projetar silhuetas de sombra na parede, no fundo da caverna onde as pessoas que estão presas na caverna podem ver. Elas estão presas lá desde que nasceram, ou seja, elas nunca viram a luz do dia e quando elas veem essas luzes para elas isso aqui é tudo que elas conhecem sobre a realidade. Então o mito da caverna é Platão alertando sobre a possibilidade de a gente viver num mundo de ilusões, num mundo em que existe alguém que está manipulando a realidade para que apenas uma parte pequena da realidade chegue até nós e ele vai denunciar tanto os religiosos, vou fazer isso, a religião, ele acha que a religião impede a gente ver a nossa realidade, seria o equivalente a esses marionetes, mas também ele fala dos políticos e dos militares, como sendo essas pessoas que eventualmente vão promover a demagogia, um discurso político alinhadante. Agora, se a gente pensar, do ponto de vista crítico, a proposta do Platão, ela propõe assim um privilégio, uma espécie de privilégio, quem é que tem esse privilégio de poder pensar fora do corpo, pensar de forma abstrata e universal, tal como o Platão sugere, pensar além da caixa, pensar além dos pensamentos, pensar além, quem pode fazer isso é o próprio Platão. É por isso que ele vai escrever, falar sobre o semento da caverna, um livro chamado "A República", que é uma utopia de uma sociedade governada por filósofos, porque para o Platão só o filósofo tem o nível de liberdade necessário para poder levar a sociedade para um futuro melhor. Os políticos e os religiosos, líderes religiosos, líderes políticos, líderes militares, eles não conseguem ver essa verdade, porque eles estão presos ali, manipulando essa realidade e o filósofo é aquele que questiona, aquele que não aceita aquelas imagens que estão sendo projetadas, eles querem chegar na essência do verdadeiro conhecimento, a verdade. Bom, o problema dessa visão do mito da caverna é que os desprivilejados não conseguem sair da caverna só pensando, assim como fizeram os filósofos na época de Platão. É questionável se realmente os filósofos estavam fora da caverna, mas de qualquer forma o que os pobres reles mortais como nós precisamos fazer é fazer uma saída. Se a gente quiser sair da caverna, a gente precisa fazer essa saída. Ela não está garantida, ela não está dada. Então aqui tem só um exemplo na história da humanidade como que, por exemplo, os trabalhadores saíam da sua condição de alienação, numa época em que o capitalismo era muito mais severo e explorador do que é hoje em dia. Nessa época, no começo, na metade do século XIX, em plena febre da Revolução Industrial, os trabalhadores tinham uma média de jornada diária de trabalho de 18 horas. Crianças começavam a trabalhar aos 4, 5 anos dentro das minas de carvão, porque só elas conseguiam chegar nos buracos apertados onde estava o carvão, e claro, muitas acabavam morrendo. A média, a expectativa de vida, assim, na história da humanidade, a única época em que a expectativa de vida caiu abriutamente foi nessa época da Revolução Industrial. Caiu da média que era mais ou menos 60 anos para 40 anos. Então muitas pessoas morrendo e os burgueses, que eram os donos do meio de produção, lucrando com isso, começou a surgir movimentação, grupos de trabalhadores que se revoltaram contra essa exploração. E a primeira das maiores revoltas contra os burgueses, contra os capitalistas exploradores foi a Comuna de Paris, em 1871, analisada pelo Karl Marx, no livro A Guerra Civil na França. Essa revolução durou apenas alguns meses, ela não teve o sucesso a longo prazo, mas ela foi uma espécie de balão de ensaio para a Revolução Bolchevique, que foi acontecer na Rússia, que deu origem à União Soviética muitos anos depois. Os erros foram cometidos durante essa revolução, que depois o movimento dos trabalhadores resolveu corrigir. E uma das maneiras-chave foi através desse livro, que é a reflexão de um filósofo engajado com a causa, inclusive ele visitou a Comuna de Paris, e por isso que o trabalho do Karl Marx tem esse diferencial em relação ao do Platão. Embora o Marx, ele também vá usar conceitos de alienação e ideologia para falar de que as pessoas estão iludidas dentro da caverna, a proposta diferente do Marx é "vamos levantar a mão e vamos fazer uma saída desta caverna, vamos se unir, porque o pensamento por si só não é suficiente". Então ele vai ter a famosa Tese 11 sobre o trabalho de Feuerbach, que não cabe discutir agora, mas a Tese 11 diz o seguinte "os filósofos até hoje, eles se ocuparam em descrever como é a realidade. A tarefa mais importante agora é pensar como transformar essa realidade". E é por isso que o Marx vai ser um filósofo engajado com o movimento, vai ajudar a fundar o Partido Comunista com aquele manifesto famoso e bastante polêmico, depois ele vai ser perseguido. Mas enfim, é uma outra abordagem para se pensar e se fazer a transformação dessa realidade. Para nós aqui no design, o que interessa dessa discussão é de que adianta a gente pensar fora da caixa se isso é possível fazer algo dentro da caixa, se a caixa vai continuar a existir. No caso das empresas capitalistas tem um problema seríssimo que até leva à falência dessas próprias empresas. E as empresas capitalistas têm a tendência a, uma vez que elas encontraram um projeto que deu certo, que gera lucro, elas tendem a fazer aquele mesmo tipo de projeto, fazendo pequenas modificações incrementais e raramente vão fazer o que se chama na literatura de inovação, de inovação radical ou disruptiva, que é transformar aquele produto, aquele serviço, ou muitas vezes transformar um produto em serviço. Então a Kodak é uma empresa que dominou o mercado de filmes e máquinas fotográficas durante muitas e muitas décadas, ela desenvolveu a primeira máquina fotográfica digital nos anos 70, mas ela não soube e não deu atenção, ela achou importante colocar esse produto no mercado de maneira viável. Então o que aconteceu quando, quem foi fazer isso, foram outras empresas que conseguiram superar os trajetos, quer dizer, que não tinham os mesmos trajetos trilhados com os outros processos anteriores, conseguiram sair daquele caminho sem volta que a Kodak estava seguindo. A Kodak perdeu o time de entrar no mercado de câmeras digitais, ela entrou, mas entrou mal as câmeras digitais da Kodak que não eram muito boas. E ela acabou se tornando uma empresa muito, mas muito menor do que ela era naquela época. Então vejam que essa discussão que eu estou fazendo aqui não é uma discussão apenas sobre como que a gente destrói o capitalismo, ou desmantela, ou supera o capitalismo, mas como que a gente pensa nas nossas vidas antes de tudo, e na sustentabilidade do nosso meio ambiente, porque a Kodak não estava nem aí em jogar milhões e milhões de rolos de filme, que é um material bastante tóxico, fora os líquidos utilizados para a revelação, não era uma preocupação. Então essa mudança para a digital teve muitas vantagens econômicas de sustentabilidade para nós. Hoje a fotografia é um recurso popular, é acessível para praticamente qualquer pessoa que tem acesso a um telefone celular, coisa que nessa época, quando você tinha o sistema do filme, era caro para caramba tirar foto, então era um evento especial quando você tirava foto. Então para a gente desenvolver os tais projetos alternativos é preciso também considerar o que a gente chama de trajetos alternativos. Então a palavra trajeto é o oposto de projeto. A gente pensa que design tem muito só a ver com o futuro, tem só a ver com o que ainda não existe, mas design tem muito a ver também com o que já existiu e o que está existindo, o que a gente precisa se conscientizar se a gente quiser fazer algo diferente, alternativo. Então uma das maneiras muito interessantes de se inspirar para criar alternativas é ver as alternativas passadas, que foram esquecidas, que foram negadas, que foram canceladas, proibidas, perseguidas. Uma das alternativas ao capitalismo mais incríveis que existem no mundo não foi a Neon Soviética e sim o quilombo dos palmares, e é mais antigo. Então o quilombo dos palmares antes mesmo da revolução da comuna de Paris já imaginava uma maneira da gente se relacionar que não dependia da acumulação de capital. Então não existia ali dentro do quilombo dos palmares pessoas ricas e pessoas pobres, não existia diferença racial, não existia diferença étnica. Então você tinha indígenas, você tinha pessoas negras e você tinha brancos também que tinham saído das colônias portuguesas porque queriam experimentar uma sociedade melhor. Então era uma espécie de utopia que foi severamente destruída e a história dos quilombo dos palmares também foi apagada. Então hoje a gente sabe pouco, mas sabe muito mais do que a gente sabia alguns anos atrás, que está tendo um movimento muito forte de ir atrás da história do quilombo dos palmares. Então por exemplo já tem vários estudos que mostram que muitos dos conceitos de economia solidária que a gente usa hoje, que foram desenvolvidos na Inglaterra no século 19, como uma reação socialista ao excesso de exploração dos trabalhadores, o quilombo de palmares já tinha desenvolvido isso no século anterior. Então a gente tem, por exemplo, aqui nós vemos nessa imagem um sistema de autogestão de uma fábrica, de um engenho, um engenho da cana de açúcar, ele era o centro, digamos, do sofrimento das pessoas escravizadas aqui no Brasil, porque ali você tinha o capatais ali chicoteando o africano escravizado que estava ali empurrando a moenda. Agora no caso do quilombo de palmares não precisava fazer isso, não precisava do chicote, você conseguia ter produtividade sem precisar da violência, o que é ela em termos de, isso aumenta a qualidade de vida, aumenta até mesmo a perspectiva de vida daquele trabalhador, ele vai viver mais tempo, então a longo prazo dá maior produtividade também. Então é muito interessante como a gente normalmente esquece, ou a gente na verdade é esquecido, existe uma produção ativa para a gente não valorizar esse tipo de história e a gente prestar mais atenção na história dos países que vêm de fora, ou a gente, por exemplo, dá mais atenção para a comuna de Paris do que para a revolta que gerou o quilombo dos palmares, por exemplo. Enfim, a gente tem desenvolvido um design, uma abordagem chamada estilo futurô, que é para recuperar os trajetos necessários para a gente libertar nossos projetos oprimidos, isso aqui tem a ver com um trabalho que eu já fazia quando eu estava dando aula na PUC do Paraná, e a gente trabalhava com essa distinção entre ficção científica e ficção projetual. A ficção científica, ela vai falar de cenários que são impossíveis devido a tensões que estão acumuladas na nossa sociedade. A ficção projetual vai falar do possível, sempre focando nas tensões para isso se tornar possível. É possível, mas vai dar conflito, vai dar nebu, então a ficção projetual vai focar nisso. Porque a realidade, ela é, digamos assim, se continuar do jeito que está, o possível vai continuar sendo o mesmo possível, quer dizer, não vai ter uma expansão. Então o design especulativo e a ficção projetual no estilo futurô vai tentar mostrar que é possível a gente fazer algo diferente do que já foi feito. Então por exemplo, nós tivemos aí um documentário especulativo, um exemplo de projeto dos nossos estudantes chamado "A Crise do Tempo", produzido em 2017, e ele foi uma revisão crítica numa história recente do Brasil, que foi o episódio do golpe perpetrado contra a presidenta Dilma Rousseff. Eles imaginaram que a razão deste golpe, o meio pelo qual ele foi implementado seria a importação, a crítica de uma inteligência artificial que fazia a gestão do tempo das pessoas. Um pouco parecido com o que hoje a gente usa a Siri ou o assistente da Google e a Alexia e outras, Cortana. Eles imaginaram isso, imaginaram que a Dilma tinha feito um contrato, uma licença para que essa inteligência artificial estivesse disponível para todos os brasileiros e brasileiras, e todo mundo começou a utilizar aquilo ali. E aí de repente a própria Dilma começa a usar isso e aí a inteligência artificial começa a gerir o país. E aí a inteligência artificial comete as tais as pedaladas fiscais. Então não é a Dilma que comete, mas quem leva a culpa é ela, porque o Congresso Nacional vai culpar ela e vai dizer "bom, você usou a inteligência artificial, você é responsável pelo que a inteligência artificial faz sobre a sua batuta". E é bem interessante como eles vão trazer assim um elemento que depois a gente vai descobrir, na época eles estavam jogando verde, a gente vai descobrir e pegar evidências mais provas de que houve interferência assim estrangeira no golpe que derrubou a Dilma Rousseff, principalmente na colaboração entre o FBI e a Lava Jato, oferecendo informações privilegiadas sobre o suposto escândalo de corrupção na produção de algumas refinarias no exterior, enfim, eu não conheço muito bem os detalhes, mas o fato é que a Dilma Rousseff tinha um programa que não era alinhado aos Estados Unidos e com a mudança de governo que veio depois do golpe o país começa a se alinhar mais aos interesses dos Estados Unidos, importar mais tecnologia estrangeira. Isso vai ter uma série de consequências que eu não vou entrar em detalhes aqui, mas esse documentário já trazia isso. Então aqui eles mostram, por um lado, a tentativa dos brasileiros de se organizarem e fazer o que eles chamavam da greve dos usuários, dessas ferramentas, quando a população percebe que está sendo manipulada pela inteligência artificial, eles fazem uma greve, ninguém mais usa a ferramenta, daí também ninguém mais chega no trabalho, no horário, perde todas as agendas, fica uma zona, então é muito interessante como o design pode ser também uma ferramenta de deliberação pública sobre os fatos que estão acontecendo no nosso país, ajudando-nos a interpretar e transformar a nossa realidade. Esse estilo futrô, ele vai pensar dentro da caixa algo que está fora da caixa, então ele não é pensar fora da caixa, você vai entrar na história do teu país, a história daquela comunidade, para tentar discutir e trabalhar uma questão que está vindo de fora, uma questão nova, futuro, que ainda não chegou. Eu vou mostrar um pouquinho agora como a gente tem feito isso aqui na UTF-PR. Então em 2019 eu tive a oportunidade de dar essa descanso de design e cultura e a gente experimentou várias técnicas de teatro oprimido, vocês experimentaram também, psicologia 1, uma das técnicas é chamada teatro forno, é apresentado uma peça de teatro e a novidade que a gente introduziu é que o produto criado especulativamente, quer dizer, o design especulativo ele é encarnado numa pessoa e aí você tem uma entrevista, uma conversa com esse produto e daí ele fala sobre a experiência dele, porque ele existe, porque ele foi criado com a intenção, quais são as suas vantagens em relação a outros produtos e por aí vai. Então nessa entrevista do programa Rafael 11 e meia a entrevistadora conversa com a criadora do produto e o produto que no caso se chama escrotean. O escrotean ele é uma alternativa ao sutiã numa sociedade futura em que a igualdade de gênero é uma prioridade, então se as mulheres usam o sutiã porque não os homens usaram o escrotean para manter os seus devidos escroto na posição correta, saudável, sem cair ao longo do tempo, ficar firme e adotar e também assumir todo o desconforto que isso implica. É claro que o escrotean é um projeto de design, entendeu? É um design, tem um projeto de ventilação, transpiração e estética muito mais, porque a cueca é frouxa, o escrotean não, firme, entendeu? Ele deixa no lugar certo e com a forma correta, biologicamente correta, entendeu? Para não haver deformações no saco escrotal. Então isso aqui é um projeto que tem um viés crítico, é um viés humorístico também, mas é o que a gente chama de um design especulativo que está baseado nas tendências e nas discussões da nossa sociedade atual, que é a questão sobre igualdade de gênero que em última análise hoje na política nacional está sendo debatida sobre a questão de você ter paridade salarial entre homem e mulher, o Congresso recentemente aprovou uma política nova inclusive com o apoio da direita, então é um debate importante com a nossa sociedade. Agora especular é interessante, porém transformar a realidade exige algo além de pensar diferente, a gente precisa também fazer diferente, isso é algo que eu tenho me dedicado mais nos últimos anos, quando eu estava na PUC eu pensava muito em pensar diferente, agora eu tenho pensado muito em fazer diferente e feito coisas pensando diferente também. Enfim, um trabalho muito interessante que a gente conseguiu realizar essa integração muito pensar em fazer é o famoso TCC Suruba, os primeiros bachareis em design que é aprovado em fazer suruba, não, TFR, suruba não é o que vocês estão pensando, suru apostrophe, ba, que significa entupir uma coisa boa, e é um projeto de um sistema de móveis modulares de código aberto para fazerem distribuídos, para você produzir móveis que podem ser refeitos e transformar em outras coisas, eles inclusive expuseram o trabalho deles recentemente aqui no Algures, vocês tiveram a oportunidade de ver? Na época eles testaram a ferramenta surumaque, quer dizer a máquina surumaque, que é uma máquina de produzir surubas, é uma máquina que faz mais módulos e eles ainda não terminaram essa máquina, é um projeto longo, um projeto muito audacioso, é uma semi sem, imagina, o que eles mesmo estão fazendo, isso é o que a gente, em última análise, talvez um exemplo muito interessante de meta design e também de infra design, que eu não vou discutir com vocês exatamente o que é, mas quem quiser ver o TCC deles, eu posso mandar por e-mail, já tá, não tá publicado na biblioteca ainda, mas já foi defendido com sucesso no ano passado, eles continuam aí desenvolvendo o projeto. Então eu acho que uma coisa legal do trabalho deles com o Rádio de Tarran, é que eles não estão pensando fora da caixa, pelo contrário, eles estão fazendo dentro da caixa, das possibilidades que o espaço deles, que é Curitiba, que é Paraná, oferece. Isso é uma oportunidade sim para repensar para a caixa. Por outro lado, fazer menos, quer dizer fazer menos móveis com mais pessoas envolvidas, que é mais ou menos a ideia deles, pode ser uma oportunidade para repensar o capital. Agora eu vou pular para um outro projeto que é bem complexo de explicar, que é a plataforma Corais, que eu venho desenvolvendo há mais de 10 anos, lá a gente desenvolveu um módulo de economia solidária que permite que uma comunidade, sua própria autogestão, imprime o seu dinheiro e dê limite para o endividamento e a acumulação desse capital. Então aqui vocês estão vendo um painel de saúde de uma economia que tem dentro dessa plataforma e essa economia está saudável porque os indicadores estão na sua maioria na parte verde, quer dizer, as pessoas estão com crédito na economia. Quando a maioria das pessoas estão com um débito, com um devendo, você tem uma economia que não está saudável, que está prestes ao colapso, a crise. Mas também você tem uma economia prestes ao colapso, a crise quando tem excesso de acumulação, né? Muita gente ou pouca gente com muito dinheiro guardado que não gira. Então, impor limites para acumulação, imagina você chegar, hoje nós temos no capitalismo limites certamente para o endividamento, mas não existe limites para acumulação. Você pode ter quanto dinheiro você quiser, bilhões, se não trilhões. Quando você limita o capital e fala "o capital só vai crescer até esse tanto" ou "ele só vai se perder até esse tanto", você cria a oportunidade de ter um outro princípio básico de desenvolvimento da sociedade. Se o objetivo da sociedade não é mais desenvolver o capital eternamente até o limite, ou muita gente está dizendo que isso vai levar ao fim do mundo porque vai chegar uma hora que não vai ter mais recurso natural para transformar em capital. Se esse não é o objetivo, então o objetivo vai ser o quê? E aí as sociedades indígenas, de novo, têm uma alternativa muito interessante, aí é bem a alter/nativa mesmo, que é o conceito de bem viver. Originalmente nas línguas andinas, sumac-calcaussei, que é um princípio que a economia solidária no Brasil vai se basear muito, que é o seguinte, nós vamos trabalhar o necessário para a gente viver bem e não viver com muito consumo, não viver ostentando, não viver como os outros vivem. Nosso conceito de bem é a gente que vai definir comunitariamente. Isso é bem viver. Então é uma alternativa, o que a gente chama de consumismo capitalista, isso pode ser aplicado no design, os coletivos que estavam na plataforma Corais, que criaram aquelas moedas, usam o conceito de bem viver porque o bem viver ajuda a gente a olhar para o nosso território e ver as abundâncias. Em vez de a gente olhar para a nossa terra, para o nosso país, para a nossa cultura, olhando aquilo que está faltando, a gente pode olhar para aquilo que está sobrando, que é a lógica da abundância. Então, no caso desses coletivos da plataforma Corais que imprimiram suas próprias moedas, antes deles começarem suas atividades e pensarem como é que a gente vai criar uma economia, eles pensaram qual é a nossa riqueza. E a riqueza principal numa sociedade do conhecimento é o conhecimento. Então eles fizeram esse mapeamento de quem são as pessoas que estão envolvidas com essa comunidade, com esse coletivo e quais são os conhecimentos que a gente quer oferecer para a sociedade numa economia. Então, por exemplo, filmagem e edição de vídeo é um conhecimento abundante nessa comunidade. Logo, uma das atividades serviços econômicas que eles podem vender é a atividade de fazer a produção de um filme, por exemplo, ou de um documentário para uma entidade com qual elas querem se relacionar economicamente. Olha só que interessante, imagina você começar um empreendimento, uma empresa, com essa lógica do que a gente pode fazer junto e fazer bem. Então, repensar a caixa é o primeiro passo para refazer a caixa. Fazer menos com mais recursos humanos, quer dizer, bem viver, é o primeiro passo para a gente repensar o capital. Então, agora eu vou voltar para o design com um exemplo, um exemplo bem... a questão que deve estar na cabeça de vocês, que está na minha cabeça, que é uma pergunta sulhadora e não norteadora, como expandir as caixas e os fazeres do design, para a gente ir além do que já tem sido feito. E eu vou pegar o design de sobrancelhas para provocar vocês, porque é um assunto que costuma causar uma polêmica, incomoda você incluir o design de sobrancelhas num curso de design, e eu estou fazendo isso justamente para incomodar mesmo. Então, uma das maneiras de você expandir essas caixas e mudar os fazeres é investigar a história dessa caixa. Então, de onde surgiu a caixa do design de sobrancelhas? Em que momento na história humana alguém olhou para uma atividade de fazer a sobrancelha e falou isso é design? Por que falou? Com que intenção? Com a vantagem? Com o impacto social? Qual o propósito? Bom, a gente olhando para essas caixas vai encontrar muitas coisas, eu vou resumir bem rápido aqui, você vai encontrar outras caixas dentro dessa caixa. Dentro da caixa do design de sobrancelhas tem um monte de padrões de beleza impostos sobre o que é uma sobrancelha bonita, o que é ser bonito, o que é um rosto bonito, aí vai entrar, por exemplo, régara de ouro, todos aqueles padrões lá da Grécia antiga, ah, um rosto simétrico, é mais bonito do que um rosto assimétrico. Isso são caixas. Se a gente quer mudar essas caixas a gente precisa identificar as tensões. Como é que se estabeleceu como um padrão o design de sobrancelhas? E por que que pode certas coisas no design de sobrancelhas e outras coisas não podem? Então a gente fez um trabalho lá na PUC, muito tempo atrás também, de redesenhar o design de sobrancelhas, então perguntamos quais são as funções sociais da sobrancelha, chamar atenção, expressar, comunicação, entrar em um grupo, passar a imagem de uma pessoa, transentir elementos, sentimentos, emoções, autoestima, depois de pensar na função social e se a função social fosse diferente, e se sobrancelhas fossem como bigodes, uma proteção dos olhos, aceitar os seus pelos, fazer variantes, outros estilos, enrolar a sobrancelha, moda caipira, resgate histórico, pessoal, vai longe, né? E aí a caixa começa a ser refeita, quando a gente começa a fazer, ou melhor, a caixa começa a ser refeita e o fazer começa a ser desencaixotado a partir do tensionamento dos limites da caixa. E aí eu vou fazer referência a uma artista bastante controversa também, que é a Frida Kahlo, feminista latino-americana, que fez questão de afirmar sua monocelha perante um padrão de design de sobrancelhas que já no começo do século 20 já impunha às mulheres a necessidade de cuidar da sobrancelha. Não tinha nem o nome design de sobrancelhas, mas uma mulher monocelha não podia se apresentar assim para a sociedade e ela vai fazer questão e inclusive vai até pintar um quadro em que ela coloca o marido dela ali naquela testa acima dessa monocelha, o que é uma afirmação ali de um peso que essa cultura machista exerce sobre a auto-imagem que as mulheres têm. Então esse homem é um homem que aceita a atitude feminista dela e mantém com ela um relacionamento aberto, o que é um pouco conflituoso, mas que vai, por exemplo, permitir que ela seja, tem um caso com um dos mais famosos comunistas do século 20 que é o Leon Trotsky. Diga-se de passagem, história muito doida. A Frida Kahlo, ela nessa imagem, ela está tensionando os limites da caixa, os limites da apresentação da mulher na sociedade, está questionando a ideia de que a mulher tem que se apresentar como uma europeia, então ela vai afirmar ali essa mexicanidade, essa latino-americanidade, essa origem indígena dela. Recentemente a Sofia Radipanteli, que é uma modelo grega, vai tentar fazer uma coisa parecida e vai ser muito mais perseguida do que foi a Frida Kahlo. Ela vai receber ameaças de morte públicas nas redes sociais porque ela resolveu assumir e resaltar esse visual unibrow, que ela chamou. Muitos homens vão ficar revoltados ao ver isso e falar limpa essa sobrancelha, porque que você não foi em uma design de sobrancelhas e por aí vai. Então vejam que o design de sobrancelhas junto com outros movimentos como o feminismo que eu coloquei aqui e outros, eles vão expandir a caixa e os fazeres do design. A gente tem que repensar o design. A gente já tem feito isso aqui no Brasil, muitos antes dos gringos. A gente escreveu um livro, isso antes mesmo do Dr. Tanapur, antes de fazer o doutorado chamado Design Livre. É um livro que fala muitas coisas que a gente vem discutir nessa disciplina sobre a importância de pensar o design quando é feito por todas as pessoas, um design que é para liberdade e não para opressão. A gente vai ter uma resposta a esse livro que é o Designs and Designs, um tratamento mais filosófico e psicológico do assunto, escrito pelo colega colaborador nosso da UF UFES, Universidade Federal do Espírito Santo, o Hugo Cristo, isso em 2013. Em 2014 que vai sair o primeiro livro dos gringos discutindo o assunto em propriedade, que é o Designs, quando todos fazem design pelo Wessie Manzini, que é um livro razoável, não é um livro ruim, mas é um livro que vem depois. A gente já estava discutindo essas questões aqui. Então a gente diz no livro Design Livre que a caixa do design deixou de ser uma caixa preta e passou a ser uma caixa transparente para quem quiser se participar. Então muitas pessoas que não são formadas em design também estão interessadas em fazer design. Beleza, vamos estimular isso. Então desde então, desde que a gente escreve esse livro, começa a refletir e fazer novas formas de fazer design, a gente começa a acumular, a guardar esses kits, essas caixas de ferramentas, esses baralhos que eu trago em sala de aula para a gente trabalhar e aprender a fazer design, a ser criativo em conjunto, coletivamente. Isso é um dos elementos estratégicos do design expansivo para incluir pessoas diferentes que não são designers no design. Cada uma dessas caixas, veja bem, contém em si um cria espaço. Quando a gente abre essas cartas na mesa ou abre a caixa e põe os materiais para fora, a gente está vendo um espaço de possibilidades, de diferentes, por exemplo, valores humanos que você pode focar no design. Quando você começa a misturar essas caixas, sobrepor esses cria espaços, surgem novos espaços, possibilidades de criar novas coisas. Nesse caso, nossos estudantes estão querendo criar um novo baralho, um baralho para lidar com as crises existenciais que eles estão vivendo no final da graduação, que é algo que possivelmente vocês vão passar. E aí esses estudantes vão entregar esse, passar para frente esse projeto para uma outra equipe de estudantes que acabam desenvolvendo esse projeto como um TCC, que é a Alânez Zukovsky e a Maria Vitória Kosak, elas recentemente defenderam esse TCC, que é um baralho de cartas para lidar com crises existenciais que jovens designers passam. É um projeto de design livre que outro grupo de estudantes colocou, disponibilizou para quem quiser mudar e elas continuaram mantendo essa licença, até por uma obrigação. Então se vocês quiserem imprimir e modificar e até criar novas cartas, vocês podem, isso é uma das prerrogativas do design livre. Mas atenção, tá gente, é preciso estar atento e forte. Nem todo projeto de fronteira é expansivo, tá, pois lá também existem projetos redutivos. E aí a inteligência artificial é o primeiro exemplo, né, a gente já viu esse exemplo lá atrás nessa mesma disciplina, que máquinas de projetar automáticas reduzem drasticamente o que pode ser design e aí o design de sobrancelhas vira essa piada, essa tosquice, essa falta de compromisso com a arte, né, que é um design de sobrancelhas inadequado para o meu rosto, né, feito pelo Benefit Brown Jeans App. Isso é uma brincadeira que eu estava fazendo ali, né, agora essa outra aqui é uma brincadeira muito mais séria, muito mais tensa, que foi o Teatro Forum que a gente fez sobre a substituição do trabalho de design para uma inteligência artificial que contrata designers precarizados, que utiliza o design para pessoas, designers como vocês do Sul Global que estão desempregados, de repente, podem trabalhar para a Fantástica Fábrica de Design por módicos R$ 5,00 por logo, tem que entregar daqui a 15 minutos porque o cliente não pode saber que é uma pessoa que está fazendo e sim ter a impressão de que foi uma inteligência artificial que fez. Parece bizarro, mas é muito parecido com o que as inteligências artificiais hoje fazem em outros campos que já foram automatizados, como o trabalho de advocacia, como o trabalho de consultas médicas e vários outros. Então refazer a caixa e repensar o capital requer coragem para enfrentar as suas contradições internas e externas, é complexo mesmo, é difícil, é denso, né, e a gente tem feito, tentado fazer isso também e aproveitado as ferramentas do design para isso, durante a pandemia, acho que talvez seja uma época recente que a gente enfrentou contradições do capitalismo de maneira muito intensa, eu tentei fazer um mapeamento de todas as contradições que estavam emergindo no cenário, no debate público, coloquei todas as notícias que saíam no jornal que eu conseguia ler a respeito, fui relacionando, fui colocando, usando uma técnica que eu chamo de Issue Based Information Systems, originária da minha tese de doutorado e última análise do trabalho do Horst Rittel, que é um dos teóricos do design. Então aqui no meio vocês veem uma contradição, esse mais e menos é uma contradição que é, uma contradição não é uma coisa necessariamente ruim, um problema, às vezes a contradição dá a oportunidade de mudança também. Então nós tivemos aí um enfrentamento entre o sistema de saúde e o sistema econômico e a gente tinha, por exemplo, pessoas defendendo que se a gente priorizasse o sistema de saúde e a saúde das pessoas a gente teria uma crise econômica, a gente não podia fechar as portas dos comércios, se não a gente não iria ter como alimentar a população. Por outro lado, outras pessoas defendendo que se a gente não tivesse trabalhadores disponíveis para trabalhar, a gente não teria como manter uma economia, então perder. Trabalhadores era a última coisa que a gente poderia fazer. Então isso vai assim nos limites, a China talvez seja o país que mais evitou a perda de trabalhadores e por isso enfrentou um monte de problemas também porque não se arriscou, política de seceamento total da liberdade. Já países como os Estados Unidos e até mesmo o Brasil foram no oposto do liberar e por outro lado conseguiram superar a contaminação mais rápido do que outros países que ficaram no meio do caminho. Apesar da gente ter tido uma perda de um número de pessoas gigantesco, talvez o maior contingente populacional de mortes do Brasil nos últimos séculos. Mais de 600 mil pessoas já morreram por causa do Covid e estão morrendo ainda. Então essa contradição estava ali no centro, isso aqui é só uma delas. A gente mapeou muitas mais contradições, elas foram encaminhadas para vários órgãos públicos, a gente mandou para o Comitê de Enfrentamento Nacional. Mas acabaram não utilizando, quem utilizou mesmo? Mandei para alguns deputados. Quem realmente se interessou foi a vereadora Maria Letícia e ela utilizou esse mapa para separar quais as contradições que o mandato dela iria focar. Ajudou ela a organizar, porque ela estava fazendo várias ações emergenciais e esse mapa ajudou a ter uma visão mais estratégica, quais eram as principais. Então ela focou, por exemplo, nessa contradição em ficar em casa e pessoas que não tinham casa para ficar, a contradição entre a mobilidade urbana e as aglomerações que a mobilidade humana gera. E por aí vai, ela fez várias ações de política pública para atacar essas contradições em diálogo com as nossas pesquisas aqui, que também é uma outra área de atuação muito pouco explorada, diga-se de passagem, o design para políticas públicas, o design no governo, isso que eu acho que tende a crescer muito. Então para fechar essa minha fala, na praxis do design expansivo, o pensar é um meio para o fazer, que é o que eu chamo também dessa maneira meio confusa de fazer pelo pensar. E o fazer é, por outro lado, um meio para o pensar, eu também chamo de pensar pelo fazer. Então fazer pelo pensar e pensar pelo fazer, uma coisa integrada na outra. Isso é para destacar, em última análise, apesar de todo esse trava-línguas, que nem pensar e nem fazer é o fim disso. Não adianta você pensar pelo pensar e nem fazer pelo fazer. Arte pela arte, design pelo design. O importante é ter em mente qual é o fim. O que a gente quer transformar? O que a gente quer fazer com tudo isso, com esse pensar e fazer? Então um dos trabalhos aqui da disciplina de metodologia da pesquisa, o estudante resolveu pesquisar a experiência de pessoas negras que defendem e apoiam o ex-presidente Bolsonaro. Como que pode apoiar um ex-presidente que fez manifestações racistas diversas em público, como por exemplo, utilizar uma medida usada para medir animais para se referir ao peso de uma pessoa negra. Quantos @ pesa um quilombola, disse o ex-presidente. Que é uma fala extremamente racista, agressiva, desnecessária, ao qual ele foi criticado, mas que ele continuou mantendo essa mesma atitude. Então como é que uma pessoa negra pode apoiar e votar e defender? Esse estudante está fazendo uma teoria para explicar isso. Estou até curioso para ver o resultado final dessa pesquisa, porque ele vai mostrar que faz sentido sim para essa pessoa negra apoiar o Bolsonaro, porque ele defende algo mais importante até mesmo que é a identidade racial para essas pessoas, que é a moral e os bons costumes que a família tradicional cristã defende e tem como base da sociedade brasileira. Então essa união entre nacionalismo e religiosidade é algo muito importante para as pessoas terem sentido na vida delas. Sem isso, mesmo uma pessoa negra nesse caso não vê sentido na vida. Então o Bolsonaro produz sim algo que é interessante e útil para essa pessoa. Pelo menos é isso que ele tentou mostrar com essa teoria, a contradição que existe ali entre você defender uma ideologia que é contra alguns dos seus interesses, mas a favor de outros. Então o fim da praxis transformadora em final de contas é transformar a realidade, ainda que isso pareça impossível. O Laboratório Design Contrapressões, o lado, é um espaço dentro da nossa universidade que conduz experimentos de transformação da realidade através do design, vocês podem conferir no Instagram, tem alguns dos experimentos que vocês podem ver agora nessa imagem. Então quando vocês ver evento, oficina ou ação em comunidade de extensão, a gente pode considerar como um experimento de transformação da realidade que pode se expandir para outros experimentos. Mas o mais importante que eu queria dizer para vocês é que esses materiais, essas abordagens, esses métodos que eu tenho mostrado nessa disciplina estão lá disponíveis. Se vocês quiserem participar, experimentar, testar e fazer as suas atividades extensionistas lá, estão mais do que convidades. Professor, sabe o que responde por essa caixa de teclados com os sonhos? Sim. Quem? Nós. Eu estava lá na instalação dela. Eu queria denunciar que o senhor de uma dimensão ia estar se mal. Ah, então foram vocês que responderam e acrescentaram sobre a caixa lá? Não, eu cresci. Eu estava o férurio sentado, mais ou menos, em baixo disso aí, e ele voltou para apresentar os trabalhos dele, na aula de comunicação, e o negócio saiu isso. Eu estava tentando chamar de assassinato no outro sentido, mas procuro o férurio. Olha... Mas procura com um segundo, o férurio. Eu chamaria isso de homicídio não doloso, né? Como é que é quando não é intencional? Sem dolo, né? Doloso. Não. Quando não é intencional é doloso? Não é doloso, porque não havia intenção de que ele ficasse fixado, mas o nível da gambiarra ali foi muito fraco. A gente precisa de gambiarras melhores. E não amarramos direito, infelizmente os nossos sonhos caíram. E isso é um exemplo muito interessante de uma contradição, né? A tentativa de a gente fazer, realizar os nossos sonhos através de meios que não são eficientes para isso. De qualquer forma, tem umas ferramentas melhores do que essa lá no lado. Basicamente vocês podem experimentar esses materiais. Por fim, eu queria mostrar o resultado de uma oficina em que a gente discutiu especificamente pensar o possível para fazer o impossível em parceria com o Instituto Democracia e Cidadaria, o IDP, que é um instituto associado a um escritório de advocacia trabalhista. Esse instituto faz um trabalho, a organização do terceiro setor apoia movimentos sociais e defende as suas causas. Uma delas é a mobilidade popular, ou seja, a necessidade que população e baixa renda tem de se mover na cidade. E a dificuldade de fazer isso, por exemplo, com uma tarifa de transporte público alta como a nossa, sem muita infraestrutura cicloviária e para e vai. Então a gente fez uma oficina com todas as pessoas envolvidas nessa aliança de mobilidade popular e fizemos mapeamento usando legacy e de quais eram as ações possíveis e as ações impossíveis. E a gente começou a estabelecer uma ponte entre essas ações dentro desse cenário, dentro desse cria espaço para que os criacorpos se organizassem melhor e pudessem promover uma criatividade que realmente transformasse o espaço dessa cidade de Curitiba que é tão desigual, mas que pode ser menos desigual se a gente tiver, por exemplo, maior mobilidade popular. Então, por fim gente, design expansivo é isso, é pensar o possível para fazer o impossível assumindo todas as contradições que isso implica. Então obrigado gente e até breve. Beleza! [PALMAS]