Então, design expansivo é uma abordagem para pesquisar contradições de design. Isso aqui é uma síntese da parte metodológica da minha tese, mas antes de entender a metodologia vocês têm que entender um pouquinho do objeto de pesquisa. Então eu vou introduzir rapidamente o conceito design expansivo. Ele foi proposto por Iriel Engström quando na conferência de fechamento do Instituto Ivré de Design de Interação, que foi uma organização que existiu do final dos anos 90 até o começo dos anos 2000, muito pouco tempo, mas que teve um impacto muito grande porque mostrou que a criação de novas tecnologias e interações deveriam ser uma questão não só para pessoas que trabalham com computação, mas pessoas que trabalham com arte, pessoas que trabalham com design, com linguística. Então foi um grupo bastante multidisciplinar que gerou várias inovações hoje para cocriação de tecnologias inovadoras, como por exemplo Arduino, surgiu aqui, o wiring e várias outras tecnologias que depois de prototipação foram espalhadas para outras áreas. E o Engström no artigo que ele apresenta o design expansivo, ele define esse design expansivo como uma tendência de transformação do design de interação, que era o tema desse instituto, para estar selecionado não só a produtos, mas também relações, processos, serviços, organizações. Expansivo porque ele expande o escopo de atuação de um designer ou de um grupo de designers para não estar preocupados apenas com a parte tecnológica do produto, mas as relações sociais, os processos, os serviços e questões mais organizacionais que envolvem uma complexidade obviamente muito maior. Na época esse artigo teve muito pouco impacto, foi pouco discutido, o próprio Engström eu conheci na Finlândia, que perguntei para ele se ele tinha escrito mais algo a respeito, ele teve um estudante de doutorado que começou o doutorado, mas acabou desistindo no meio do caminho e esse termo ficou esquecido essa pesquisa. E eu acabei pegando como gancho da minha tese. Então eu defini ela em 2015, é uma tentativa de evoluir esse conceito do design expansivo focalizando na questão da contradição, que eu já vou explicar mais um pouquinho, explicar o que é. Eu não posso explicar o que é design expansivo, que é a contradição, sem antes explicar essa teoria que está por trás do conceito. Então o Engström, ele é muito conhecido na área de educação de adultos, de aprendizagem organizacional e outras áreas que estão relacionadas à inovação e organizações. Ele criou um modelo chamado modelo sistêmico da atividade, que é esse famoso triângulo, que relaciona tecnologias, pessoas, regras, comunidade, visão do trabalho e o objeto de motivação da atividade. Esse modelo é muito utilizado para analisar várias situações, desde a maneira como as pessoas trabalham dentro de um hospital, até a maneira como um grupo compõe uma música colaborativamente. Os três principais pontos dessa teoria são esses que estão do lado esquerdo. A atividade é a origem da consciência humana. Essa atividade se transforma por tensões que geram conflito, problemas e confusão. Então é uma teoria que focaliza muito em processos de mudança e explica esse processo de mudança através de conflitos, problemas e confusões, mas vai além disso e busca a origem desses problemas, conflitos e confusões, que é o conceito de contradição. Então através de uma análise histórica, como é que essa atividade surgiu, como é que ela se desenvolveu, quem fez parte, o que mudou, como é que as regras mudaram, como é que as pessoas mudaram, como é que as tecnologias mudaram, você pode encontrar essas contradições. É um conceito um pouquinho mais difícil de capturar do que simplesmente falar de problemas, porque ela não é um problema. Esse aqui é um exemplo de uma contradição na obra de arte. O René Magritte fez esse maravilhoso quadro pintado a óleo e aqui está escrito "isto não é um cachimbo", mas tem uma imagem de um cachimbo. Por que ele fez isso? Se não é um cachimbo, é o que então? É uma imagem. É o quê? É o que? É o oito setinta num quadro, não é um cachimbo, mas ao mesmo tempo é um cachimbo, porque a gente reconhece que é parecido com cachimbo. Por outro lado, quando ele fala "isto não é um cachimbo", também ele está negando a frase, porque na verdade o texto não tem ligação nenhuma visual com a forma de um cachimbo, é uma maneira abstrata de se falar de cachimbo. Então, na verdade o cachimbo está aqui, mas não, está aqui no texto. Onde está mais cachimbo? Aqui ou aqui? Ou em nenhum lugar? Quer dizer, não tem solução para isso aqui. Não existe uma pessoa que chegou e falou "descobri o segredo dessa pintura" e recebeu o diploma do solucionador do "Grande Enigma de Magritte". Não, por quê? Porque isso aqui é uma característica inerente a qualquer representação. Toda representação representa uma coisa que não está presente, mas essa coisa se torna presente na sua ausência. Quer dizer, essa contradição entre ausência e presença é o que está na origem e no desenvolvimento de qualquer representação. Sempre vai ser assim. - Tá de conta lá que você vai cair ainda. - Tá bom, obrigado. Então, por mais que as pessoas digam que encontraram a solução, vamos dar uma solução científica. "Ah, isso aqui são luzes que estão saindo do projetor, batendo aqui na tela e chegando nos seus olhos". Você tenta reduzir ao máximo o fenômeno físico da descrição, mas aí a gente não está mais discutindo essa luz, está totalmente fora de tópico. O nosso ponto, nossa discussão aqui é o cachimbo. Se está representado o cachimbo, não está. Quer dizer, não tem saída. Isso é uma característica, uma contradição. No design, já foi pesquisado esse tema, mas ainda de maneira bastante esparça, eu fiz um levantamento de literatura e encontrei nove contradições descritas de maneira clara na literatura de design. O Pelehen, que é da literatura de design de interação, que trabalhou muito na área de computação também no início do movimento chamado design participativo, na Escandinávia, ele falava o seguinte, "Um artefato precisa suportar as práticas atuais, tanto quanto contribuir para mudar essas práticas". Então, quando você implementa uma tecnologia numa Smart City, para usar um exemplo do Eduardo, numa cidade atual ele vai ter que apoiar a maneira como a cidade trabalha, mas também vai ter que impor ou tentar propor ou seduzir as pessoas a mudar a maneira como elas se organizam, como elas trabalham, como elas vão ao parque, por aí vai. E isso é uma contradição, porque você tem que, por um lado, transcender, por outro lado manter a tradição. Já na arquitetura, fala-se de contradição de uma maneira até mais tangível, por exemplo, combinações inconsistentes entre estilos e formas. Aqui nós vemos o exemplo do Robert Venturi, que é conhecido como arquiteta com tradição, em que ele utiliza um modelo bastante moderno para o entorno desta casa, que ele construiu para si mesmo, mas aqui ele quebra essa linha, e aqui ele coloca uma decoração que não tem utilidade nenhuma, num prédio totalmente funcional, que você pode ver, ele também quebra aqui e não tem porta para frente, quer dizer, você não vê onde está a porta de maneira muito clara. Então, este prédio tem várias formas que se contradizem umas às outras, por exemplo, esta janela aqui não tem o mesmo tamanho que esta janela aqui, que é um erro clássico, digamos assim, na arquitetura, de você fazer coisas fora do padrão. E ele fala que isso é o que traz, digamos assim, a variedade, o senso de surpresa na arquitetura, e ele vai criar uma nova, ou melhor, ser um dos precursores de um movimento chamado Pós-Modernismo na arquitetura que deu origem a várias construções, aqui no Brasil não teve muita influência ainda do pós-modernismo, mas você vê esse tipo de construção forte na Europa, por exemplo, nos trabalhos do Frank Gehry, aquele museu de Bilbao, aquelas coisas muito estranhas, novas, todas derivam desse trabalho original do Venturi, de dizer que a contradição é uma coisa bacana e estimulante de um projeto arquitetônico. Então, eu não vou mencionar as outras sete contradições para a gente ser mais breve, só estou dando exemplos, só que agora a gente vai ter que falar de um outro ponto importante da minha tese, que é essas contradições que existem nas atividades, elas acabam sedimentando e se tornando contradições do espaço. Quem traz esse insight é um Henri Lefevre, ninguém nunca tinha percebido, feito essa distinção, de que existem contradições nas atividades e também contradições no espaço, elas são diferentes. Ele escreveu um livro chamado "A produção do espaço", que é um livro bem difícil de entender, mas é muito forte, muito influente na área de urbanismo, e um exemplo que ele dá, não é, não, ele não dá esse exemplo, ele dá um exemplo parecido com esse, mas eu vou trazer aqui para a gente ficar mais claro com a nossa realidade, Salvador, né, Salvador é uma cidade que foi planejada urbanisticamente pelo modelo colonial, a cidade cresceu muito, mudou, a colônia desapareceu, quer dizer, hoje nós não somos mais uma colônia oficialmente, porém a estrutura colonial da cidade ainda incomoda as pessoas, e uma das bases do trabalho colonial era o trabalho escravo, então tinha pessoas que não eram consideradas pessoas, essas pessoas não tinham acesso a certos benefícios, tinha que ter uma vida muito sofrida, então um exemplo aqui claro de que esse ranço, digamos assim, do colonialismo ainda estava presente no urbanismo da cidade é a ligação entre a cidade alta e a cidade baixa, o famoso elevador Lacerda, que até os anos 1920 você não podia entrar se não tivesse vestido com roupa social, e daí as pessoas mais pobres não tinham roupa social, e principalmente os negros acabavam sendo alijados à utilização desse elevador, hoje em dia já não existe mais essa barreira, mas a cidade alta acabava ficando desconectada do mar, enfim, da região do porto aqui, então criando uma certa conexão, mais uma conexão só para alguns na cidade, tal qual foi compensado o urbanismo colonial, priorizando os senhores de engenhas, pessoas que tinham mais condição financeira e despilhorizando todos aqueles outros que não tinham que viver em cortiços, então até hoje o nosso cenário urbano está permeado por essas contradições do espaço, e por mais que a gente tenha uma sociedade muito mais progressista, muito mais igualitária, a gente não consegue evoluir na sociedade porque toda hora o nosso espaço físico está nos incomodando, e Brasília talvez seja uma das maiores contradições do espaço que nós tenhamos no nosso país, agora só, já que discutimos o Smart City, eu tenho uma teoria de que a corrupção é em partes estimulada pelo urbanismo de Brasília, por quê? Porque em Brasília você não precisa ser visto na rua, você pode circular de um lugar a outro de carro, você bota o seu filme ali, você não é visto na rua nem, você praticamente entra dentro de um prédio e sai dentro de outro, para qualquer lugar que você quer ir, então se você estiver fazendo algum tipo de negociação estranha, estiver visitando pessoas que você não deveria visitar, - Negociação estranha? - É, você consegue fazer isso em Brasília perfeitamente sem deixar rastros, né? - Não, tem a placa do carro, as bombas eletrônicas... - É, isso depende de quem está... - O seu celular está se conectando na liga... - Depende de quem está tentando olhar, basicamente uma sociedade democrática pode ser... os políticos, eles ficam em evidência por qualquer um, não quem tem os equipamentos especiais, por exemplo, eu vou comparar com a AIA, na Holanda, onde é a central do governo holandês, o centro do parlamento ele é numa região sem ruas, de propósito para que os políticos tenham que andar até o parlamento e nesse andar eles sejam pegos pelos jornalistas e pelos cidadãos que quiserem falar com eles, então começa por aí, não tem como ele estacionar o carro dentro do congresso para trabalhar, então todo dia tem um jornalista acompanhando na caminhada o político lá, é clássico, é muito difícil fazer isso no Brasil. Então a lacuna da minha tese, voltando para o tema, não há estudos empíricos, ou não havia naquela época, estudos empíricos que mostrem como a contradição da atividade se torna uma contradição do espaço e vice-versa, o Lefevre ele dá alguns exemplos, mas são estudos empiricamente fracos, e não há estudos empíricos também que mostrem o papel do design, nessa reprodução e transformação de contradições de espaço e atividade. Acho que vale a pena, só dizer a tua área de doutorado, o Pledi não fez doutorado na área de ciência da confusão. A minha área é meio indefinida, porque na Holanda você não tira um doutorado numa área específica, você tem o título de doutor e basicamente as áreas que você vai ser referência, as áreas que você quiser trabalhar. Então você não importa muito o departamento em que você fez o seu doutorado, importa onde você publicou, com que pessoas você trabalhou no seu doutorado. No meu caso, na Universidade de Twente, eu trabalhei na Engenharia Civil e na Engenharia Desenindustrial, que lá o design é uma engenharia também. Mas tem alguns projetos de computação na minha tese também, e a gente já vai chegar lá. Então os requisitos metodológicos considerando esse objeto de pesquisa, ou melhor, o fenômeno, o fenômeno que eu quero entender que é a contradição não é diretamente observável, não é uma coisa que eu possa botar o dedo e falar que está a contradição. O fenômeno tem múltiplas determinações, tem várias causas, então não é só uma única pessoa que causa uma contradição, é uma sociedade com várias pessoas agindo de diferentes maneiras. O fenômeno se manifesta diferentemente em cada situação, então cada pessoa experimenta essa contradição de maneira diferente, uns vão gostar, outros vão odiar. O fenômeno está implicado na formação da própria situação, quer dizer, tem uma espécie de recursividade aqui, isso é característico de fenômenos culturais. Você fala, então não dá para estudar esse negócio, porque de um ponto de vista de engenharia, isso aqui é um caos, você não consegue encurralar o seu objeto de pesquisa se você definir ele dessa maneira. Isso foi, obviamente, um embate que eu tive com os meus orientadores, que tinham uma orientação mais de engenharia, mas eu acabei conseguindo defender que era possível, sim, estudar contradições de uma maneira empírica objetiva, e eu vou mostrar como. Primeiro ponto foi trazer a experiência da etnografia, que é um método utilizado na antropologia para o estudo de fenômenos desse tipo, que foi extremamente bem sucedido em demonstrar que o ser humano pode ser diferente do que um hétero branco calcasiano, seguindo o American Way of Life. Uns antropólogos mostraram que existem diferentes maneiras de viver, de ser humano, e isso está ligado à cultura, e a cultura é multideterminada. Então, como é que os antropólogos entendem uma cultura que não é a deles, quando eles vão para uma tribo exótica? Eles fazem várias coisas, e eles fazem essas coisas de maneira bastante caótica, seguindo o fluxo das interações que eles têm com as pessoas daquele local. Então, eles vão entrar a campo com perguntas, hipóteses, interesses, esses interesses vão levar eles a observar certos rituais, a participar desses rituais, a entrevistar as pessoas, ou, eventualmente, até promover alguma atividade, organizar para poder ver o fenômeno acontecer. A partir dessas observações vão surgir insights, necessidades, ideias, conceitos, que vão ser melhor trabalhados ou vão ser confrontados e rejeitados através de uma interpretação mais rigorosa dos dados. Vai haver momentos em que o antropólogo vai escrever um artigo, vai publicar esse artigo, vai receber comentários, vai receber críticas, vai mudar de ideia e vai refazer a sua interpretação desses dados. Quer dizer, todas essas atividades aqui acontecem de uma maneira bastante caótica, um leva a outra, elas estão ligadas, elas tendem a se tornar cada vez mais próximas e recorrentes conforme a etnografia progride, mas existe a possibilidade também da etnografia ser interrompida e o antropólogo se tornar um nativo e não querer mais estudar aquele povo porque ele quer fazer parte daquele povo. Essa é uma outra descrição que eu não vou entrar aqui, mas eu acho que é um pouco curioso, é bom mencionar isso que a gente não tem muita noção desse tipo de abordagem de pesquisa nas engenharias. Muitos se falam sobre estudo etnográfico, mas poucos se fazem de leitura das etnografias, por isso eu estou trazendo aqui rapidamente essa visão que não é nada fácil de entender, justamente porque não é fácil de entender uma etnografia. Eu estou citando só alguns autores aqui que já me inspiraram em etnografia, mas tem muitos outros, Suchman, ela trabalha na computação uma época, Crabtree é da computação, Peirana da antropologia cultural, Estúdios de Rituais e o Reertz que também é da antropologia cultural. Bom, na minha tese eu fiz o seguinte, inspirado nessa abordagem etnográfica, eu não fiz a etnografia como a antropologia propõe porque eu estou na engenharia civil, engenharia do design industrial, então eu tive que fazer adaptações. Então eu tive que trazer um método experimental para complementar a observação etnográfica, porque a gente precisava ter algum tipo de, uma situação um pouquinho mais bem definida para poder estudar, do contrário, meus orientadores ficavam maluscos, não ia ter um fim essa pesquisa nunca. Então eu descobri um método chamado dupla estimulação e já vou explicar como é que é, mas eu fiz observações etnográficas em projetos de hospitais, em projetos de construção civil, depois eu vou mostrar alguns exemplos, a gente criou alguns instrumentos, alguns deles computacionais, a gente experimentou com esses instrumentos, interpretamos os dados desses experimentos, fizemos entrevistas depois do experimento com as pessoas que tinham participado, ou pedimos para elas escreverem relatórios e pegamos as evidências que saíram dessas entrevistas e fizemos uma análise histórica da atividade. Essa parte não está na minha tese porque meus orientadores julgaram muito complicado, muito de humanas, muito missangas basicamente, eu vou mostrar para vocês daqui a pouco, mas ele está disponível no meu site, quem quiser conhecer mais como é que se dá esse método. E um ponto importante é que esse método ajudou a rever as interpretações que tinham sido feitas nas entrevistas, ajudou a bolar as perguntas para as entrevistas, as entrevistas ajudaram a bolar novos experimentos e os experimentos ajudaram a fazer novas observações em outros contextos. Então é um método um pouquinho mais linear do que vocês tinham visto anteriormente na etnografia, porém ainda com bastante interação e volta, e vai e volta, como eu tinha falado, que é a característica principal da etnografia. Como é que se dá isso no dia a dia? Na maneira bem concreta, aqui tem a minha pessoa em vários lugares aqui fazendo, uma das características da etnografia é você estar consciente, principalmente de quem você é e de quais são os privilégios que você tem, qual é a sua cultura, então você começa a partir daí, percebendo uma cultura a partir daquilo que te incomoda em você e aquilo que incomoda você é parte da sua cultura. Então eu fui estudar a utilização de um parque na Holanda e queriam construir um centro de amantes da natureza e eu fiquei lá um dia inteiro observando o parque, sentado no banco. Então eu fiquei um dia inteiro na praça. Então a gente percebeu que nesse parque havia várias atividades acontecendo, desde idosos fazendo caminhada matinal até adolescentes fazendo tráfico de drogas ilegal e essa praça, o tráfico que eles estavam fazendo era ilegal. É que por exemplo, se você quiser vender drogas na Holanda de maneira legal tem que ser dentro de um coffee shop, de uma loja registrada, mas eles estavam vendendo de maneira informal, como acontece em vários lugares na Holanda, não é só lá. É um tráfico bem de bom, ninguém anda com fuzil e tal, não é o que estão pensando. É good vibes, inclusive a polícia faz vista grossa, mas não vamos entrar nesse detalhe. Isso aqui é uma visita a um prédio que estava em construção e eles estavam fazendo a arquitetura desse prédio em construção, que é uma coisa bem bizarra, então a gente encontrou na visita, eu fui com um colégio naquele engenheiro, a gente encontrou uma viga aqui com um buracão no meio da viga, estava passando um cano, alguma coisa assim, eles quebraram a viga no ponto de sustentação mais forte, que é o meio da viga, botaram um caninho no meio, sei lá por quê, e a gente descobriu que esse projeto tinha vários problemas, vários erros. A nossa intervenção, que eu vou mostrar daqui a pouco, acabou provocando o cancelamento desse projeto pela desafeto do gestor, que é esse cara que está aqui. A gente também estudou nesse mesmo projeto uma oficina com os stakeholders desse projeto, os médicos, queriam trabalhar nesse centro diagnóstico por imagem, colaborando com os arquitetos, engenheiros e os gestores, e a gente viu várias contradições, quer dizer, melhor dizendo, a gente viu vários conflitos que levaram a gente a descobrir contradições do projeto e por último eu coloquei esse pratinho de comida aqui só para mostrar que etnografia não é só você ir lá e olhar quais são as tecnologias que a pessoa usa, porque você tem que entender a cultura com várias perspectivas e uma delas é a comida. Então isso aqui é o almoço holandês. É muito ruim, é muito ruim, mas eu tive que comer para sentir, né? Claro, se você for carnívoro, eu tenho carne todo dia, mas como eu não sou, era o que sobrava. Então é um país onde se você não come carne você está numa roubada. Quando você faz essas observações etnográficas é fundamental que você tome nota de tudo que você está vendo, porque você vê tanta coisa diferente e você fica ligado... Porque você tome nota em holandês. É, e se você estiver escutando em inglês ou escutando em holandês é melhor você tomar nota na língua, porque essa tradução em tempo real vai provavelmente te fazer perder o foco da atenção. Então eu tive que aprender holandês dois anos para aprender holandês para poder fazer estudos etnográficos decentes na Holanda. Isso é o primeiro passo, qualquer estudo etnográfico é aprender a língua. Você fala "ah, eu vou estudar no Brasil". Se você vai estudar uma comunidade um pouquinho diferente da sua provavelmente você vai ter que aprender o linguajar, o jargão da área, ou a gíria daquele grupo de pessoas. Essas são características bem clássicas da etnografia. E outra coisa que eu faço, gosto de fazer muito é fazer desenhos esquemáticos. Aqui eu estou analisando a posição das pessoas numa reunião lá, como é que elas estavam reunidas em grupos e tal, outra sala onde eles entraram depois e os grupos se desfizeram. Eu estava analisando no texto aqui algumas dinâmicas sociais que eu observei na negociação dos stakeholders de um projeto, daquele projeto daquela praça lá, tinha gente que era conta, de gente que era a favor e tal, eu nem me lembro o que eu anotei aqui. Mas o ponto principal é Moleskine. Moleskine. Por que Moleskine? É o melhor amigo de um etnógrafo. Porque ele é pequenininho, ele cabe no bolso, você tira rapidamente, você faz anotações na mão sem precisar de uma mesa, porque ele é durinho, você coloca a caneta ou lápis. Olha aí, parabéns, olha aí, olha, André, está chique aqui, olha. E você pode ter uma caneta ou uma lapiseira, porque eu prefiro uma lapiseira, dentro do Moleskine, e você não precisa ter nada mais a não ser o Moleskine. E obviamente um smartphone para tirar foto também, que é o segundo melhor amigo do etnógrafo. Quando eu chego no escritório e eu vou passar essas anotações, eu tenho que sistematizar elas. Aí entra o primeiro papel da computação no meu trabalho, que é formalizar essas anotações de maneira a extrair algum tipo de insight mais robusto do que simplesmente uma mera interpretação de uma observação. Buscando fenômenos que são mais perenes do que simplesmente uma manifestação pontual. Como eu estou buscando a contradição e esse fenômeno não é observável, eu só vou encontrar essa contradição quando olhar para a história de alguma coisa. A história significa que eu tenho que ver processos acontecendo em uma escala maior de tempo. E aí eu utilizei um sistema do tipo Issue Based Information System, IBS, que foi inicialmente proposto no campo do urbanismo, pelo um cara chamado Rost Retail, que foi o criador do conceito Problema Capsuoso, Wicked Problems, que é um dos principais conceitos de urbanismo hoje. Ele criou o conceito desse sistema, ele não implementou o software. Os pesquisadores da Open University criaram um software chamado Compendium NG, que é o que eu estou usando aqui para fazer essas anotações. Então nesse caso, isso aqui são a transcrição e a organização das anotações daquela reunião que vocês viram anteriores. E aqui você tem uma ideia que alguém propôs, que é utilizar straw bays como material de construção, que são tijolos feitos de feno compactado com barro, uma coisa assim, isso é pelo que eu entendi. E aí as questões que foram levantadas para o arquiteto, se isso aí teria algum risco de pegar fogo, por aí vai. Então essas questões, colocando dessa maneira como mapa, eu consigo visualizar e ter muito mais rapidamente a estrutura da discussão visível para poder analisar. Então basicamente issue based system é você organizar entre questões, perguntas, issues que são problemáticas ainda não problematizadas, muito parecido com o conceito de contradição ainda, mas não exatamente a mesma coisa, prós, contras e decisões. Eu uso essa anotação para esse mapa e tem algumas outras funcionalidades nesse software que eu vou mostrar daqui a pouquinho. O mais importante de colocar no software é poder ter uma visão geral constantemente do que está acontecendo no IBS, então esse aqui é o meu ambiente de trabalho na Holanda, e esse aqui sou eu trabalhando no dia a dia, uma parte do tempo eu trabalhava dessa maneira, como eu recomendo que os pesquisadores aqui do PPG trabalhem. Eu acho que essa maneira é muito adequada para trabalhar. É, mas que se não é, é só lembrando, lembrando, lembrando. A primeira coisa que eu tenho que é antes de fazer é olhar o material, fazer uma censura. Então aqui... aqui o que eu estou fazendo? Eu tenho algumas evidências, olha, uns documentos que eu coletei na minha mão aqui, tenho outros documentos na minha barriga, tenho alguns documentos colados aqui em volta, e estou olhando para esses mapas no computador e tentando entender a relação entre as coisas. Eu esqueço de todo o resto, mas olha a cara de filhinho do Doutor André. Que está bronzeadinha. Uma das coisas que depois de fazer essas notações eu comecei a ficar interessado é analisar de maneira minuciosa as gravações em vídeo das oficinas de colaboração entre engenheiros, matemáticos, gestores e pessoas que estavam incluídas naquele projeto de centro de diagnóstico por imagem. E aí eu fiz algumas experimentações usando um software chamado Anvil, que é um software de codificação de vídeo, que você consegue dividir cada turno de fala e classificar esse turno de fala de acordo com uma taxonomia que você customiza. Então nesse caso aqui eu estava olhando para atividades, lembro que aquele modelinho lá do Engstron, eu comecei a aplicar algumas dessas categorias para algumas falas, e depois a gente começou a fazer alguns levantamentos estatísticos a partir dessa mostra bem pequena. Esses levantamentos, o escopo de generalização dele é somente para aquelas pessoas que estavam ali. A generalização mais importante acontece nesse tipo de estudo através de conceitos e teórias que você solidifica nessas observações. Isso aqui foi um conceito que a gente começou a perceber que a liderança dentro desses workshops ela era muito fluida, ela passava de uma pessoa para outra. Então aqui a gente tem uma evidência de que o médico e o matemático eles tiveram muito mais falas e eles se sucederam um ao outro, foi se complementando durante a discussão, muito mais do que o gestor conseguiu interagir com eles. Então a bolinha do gestor está menor porque ele não foi precedido numa conversa. Se por exemplo eu falo uma coisa, daqui a pouco o Guilherme me corrobora, começa a ter uma ligação de liderança, provavelmente se toda vez eu falo, o Guilherme fala depois, eu estou liderando ele. Se ele começa a falar mais e eu começo a continuar ele, ele está me liderando. Quer dizer, a gente começa a perceber evidências de que a liderança se torna fluida e a gente colocando num grafo, melhor dizendo num plano cartesiano, vendo esses três perfis, o número de falas ao longo do tempo, a gente percebe que o gestor no começo fala muito pouco, ele ouve, ele escuta a problematização que o médico e o matemático fazem. A partir de um determinado momento o matemático começa a discutir e de repente o médico começa a tomar a liderança, de repente o gestor começa a tentar pegar as rédeas de volta, o matemático adquira a liderança de novo e por fim o gestor fecha a reunião e deixa um monte de problemas em aberto. Foi uma reunião considerada catastrófica pelo gestor, mas foi um prenúncio de algo que viria a acontecer depois, que seria o cancelamento do projeto por conta da falta de participação dessas pessoas que são técnicas e conhecem por exemplo a rotina de um centro diagnóstico médico, no caso esse médico aqui não é algum médico qualquer, é um médico especialista em medicina nuclear, quer dizer um médico extremamente capacitado, que deveria ter sido consultado anteriormente porque aquele projeto arquitetônico não fazia sentido nem acabar direito as máquinas que eles queriam colocar lá dentro, então esse projeto acabou sendo cancelado. Agora vamos falar sobre o método experimental que eu utilizo na minha tese. Na psicologia existe esse método clássico no estímulo e da resposta que dá origem a vários estudos do comportamento humano em outras áreas que não são somente a psicologia e na engenharia de software existe a, como é que é o nome? É experimental? Engenharia de software experimental? É um instrumento que utiliza bastante ainda esse paradigma de uma variável independente, uma variável dependente, só que eu achava que não dava para restringir as duas variáveis apenas, porque na teoria da atividade sempre são três, isso aqui é um modelo de experimentação da teoria da atividade própria, que é um pouquinho diferente, é uma teoria que surgiu na psicologia, como eu falei, então eles consideram uma evolução desse modelo anterior do Pavlov, que eu já vou mostrar alguns exemplos, acho que um exemplo fica melhor do que um modelo. Um exemplo de estímulação única ou estimula resposta do Pavlov é o famoso experimento do cãozinho, você dá a comidinha para o cãozinho, o cãozinho sabe que a comidinha é gostosa, ele saliva antes de comer a comida, porque ele sabe que aquilo é bom, aí você faz um tempo assim, aí você toca uma campainha e o cão não está nem aí, porque ele não sabe o que tem, não tem significado nenhum para aquela campainha, aquele estímulo não faz sentido nenhum, não tem conexão nenhuma, não tem resposta programada para ele sobre a campainha, mas se você associa, toda vez que você vai dar comida, você toca a campainha, você condiciona o cãozinho a salivar quando ouvir a campainha, e depois que você tira o estímulo da comida e você toca a campainha, o cão continua salivando, isso aqui é basicamente o esquema básico de treinamento de cães, que é o condicionamento, o reflexo condicionado. Esse tipo de modelo foi descoberto pelo Pavlov com os cães, Pavlov propôs que isso deveria ser feito com crianças, foi tentado, falhou-se miseravelmente. E aí, um dos primeiros lugares onde foi tentado isso foi na União Soviética, que foi uma revolução dos trabalhadores e tal, e aí eles queriam revolucionar tudo, mudar tudo, a educação, vão fazer uma educação científica, tentaram fazer aquilo e houve coisas bizarras acontecendo. O grupo de pesquisadores que criou a teoria da atividade tentou se opor a esse modelo simplista de experimentação e falar que a educação não era tão simples assim, como estímulo-resposta. Um dos pesquisadores que desenvolveu esse método de maneira muito clara foi o Alexei Leontiev. Esse é um exemplo de um experimento que ele fez com crianças na idade pré-escolar, ele fez em várias idades, na verdade, mas o ponto principal dele era mostrar que na idade pré-escolar surgia a capacidade de dar sentido a um artefato, um objeto que te ajuda a entender e aprender como lidar com uma contradição. Então nesse experimento de dupla estimulação você tem um estímulo que não é simples, é um estímulo complexo, é um estímulo contraditório, por exemplo, um jogo pode ser um estímulo contraditório, nesse caso é o jogo das cores proibidas, não sei se já jogaram, é um jogo que é conhecido no Brasil também, popular, você fala o seguinte, vou dizer algumas frases pra você e você não pode dizer, e você tem que responder essas frases, é pergunta, fazer perguntas, você tem que responder essas perguntas, mas você não pode dizer duas cores, branco e verde, daí eu começo a perguntar qual é a cor do sol, você fala amarelo, qual é a cor do mar, azul, qual é a cor da neve, aí você fala branco e perdeu. Então você tem um impulso de falar, responder a resposta corretamente, mas você tem também um contra impulso que é a regra do jogo, que você tem que internalizar e saber lidar com ela. Crianças muito pequenas não conseguem fazer isso, elas respondem de impulso diretamente, mas as crianças conforme elas vão passando pra essa fase pré-escolar, elas vão aprendendo a dar sentido pra todos os impulsos que vêm de fora e conseguir que a regra seja mais forte dentro dela do que a vontade de responder diretamente. E uma das maneiras de ajudar a criança a desenvolver essa capacidade é dando artefatos que auxiliam essa tarefa. Por exemplo, é o que eles chamam de segundo estímulo, é um artefato, um objeto, um instrumento que ajuda a criança a tornar mais forte o impulso da regra. Então nesse caso você tem uma visualização da regra que são as possibilidades de cores. E essa criança aqui organizou essas cores do jeito que ela quis, ela pegou as cores proibidas são vermelho e azul, e toda vez que ela tinha que responder alguma coisa ela olhava, essa cor que eu estou pensando está entre uma dessas daqui, se não tivesse ela respondia, se não ela falava "não posso falar". E ela ganhou o jogo graças à sua utilização dessa ferramenta. Então o ponto desse experimento de dupla estimulação não é o efeito que essa tecnologia tem na psiquia, na psicologia da criança, mas sim o efeito que essa criança tem nesse artefato, ou seja, como que ela customiza esse artefato pra resolver o problema. E aí você compara em diferentes idades do desenvolvimento psicológico e você começa a perceber que crianças dessa idade fazem isso. Crianças maiores nem olham pras cores, elas já tem uma capacidade aguçada de abstrair e imaginar essas cores na sua cabeça. E os adultos também não utilizam. Então o ponto principal é entender esse processo de solução da contradição. Beleza, agora eu vou mostrar como é que eu fiz isso na minha pesquisa. Então a gente tinha aquele caso que eu estava discutindo do laboratório de diagnóstico por imagem, eles estavam entrando em conflito, eu propus uma ferramenta pra ajudar a lidar com o conflito. Essa ferramenta visualiza os fluxos de movimentação de pessoas de um lugar a outro do plano, isso aqui é a planta baixa, é como se fosse a arquitetura básica do prédio. E aqui tem um caminho da entrada do paciente, que é o verdinho, até ao registro dele na recepção, até o encontro dele com a enfermeira na sala de espera, até o momento que ele tira a roupa dentro da sala de troca de roupa, sei lá o nome disso aqui, vestiário. E aí começou a aparecer coisas estranhas, do tipo a enfermeira nesse momento vai pra área técnica pra ativar, ligar as máquinas, pedir pro técnico ligar as máquinas, enquanto isso o paciente atravessa um corredor totalmente nu, com um monte de outras pessoas passando. Esse tipo de coisa ninguém tinha visualizado porque ninguém tinha colocado fluxo pra funcionar. Ninguém imaginou isso, porque, não, aqui é óbvio, você vai botar um monte de... se você pensar só do ponto de vista da construção, você vai pensar que precisamos de um corredor pra poder conectar essas salas, porque é uma questão formal, estrutural, não tem como não ter corredor aqui, senão algumas salas vão ficar sem conexão lá no fundo. Porém, nós temos um problema de ordem psicológica e social causado por essa precise layout. E aí eles tiveram que refazer várias vezes, várias e várias vezes, e no final dos contos acabou não agradando e o projeto foi cancelado. Olhando essa situação, agora vem a parte mais computacional da minha pesquisa, falei, bom, aqui tá uma oportunidade interessante pra você desenvolver um software que permita o planejamento do espaço de uma planta baixa, juntamente com o planejamento do fluxo de atividade. E aí eu criei um plugin que pode ser incorporado dentro do Autodesk Revit, que é uma das ferramentas de ponta pra modelagem de ambientes construídos, e aí você vai lá, desenha os caminhos que a pessoa vai percorrer, você coloca o tempo que a pessoa vai ficar, o que ela tá fazendo, e ele já gera visualizações em 3D e até mesmo um videozinho fazendo o caminho percorrido pra você visualizar as proporções, se o corredor tá grande demais, tá pequeno demais e tal. Eu disponibilizei esse plugin no meu site também, quem quiser baixar, e fiz alguns experimentos com ele. O experimento que rendeu uma publicação interessante foi esse com estudantes de engenharia civil lá da Universidade de Twente, eu pedi pra eles resolverem os problemas que os profissionais estavam tentando resolver naquele projeto, usando essa ferramenta. Cada um resolveu de uma maneira diferente, porque no design a variabilidade de soluções é comum, e pra poder comparar isso, eu usei uma técnica muito simples, edição de imagem do Photoshop, eu fiz uma fusão. Então todas as imagens que foram produzidas pelos estudantes, acho que aqui tem mais ou menos umas 70 por aí, estão compactadas em uma imagem só aqui, e as linhas que estão mais nítidas são as linhas que são comuns entre todos os projetos, as que estão mais bagunçadas, aonde tem maior variação no projeto. Ou seja, essa região é, digamos assim, o nó da discórdia do projeto. Então aqui tem uma evidência muito clara de que aqui o projeto não está estável. A gente fez uma análise dos relatórios de aprendizagem dos estudantes, eles tinham que escrever isso por uma demanda pedagógica do professor que pedia isso, eu não era professor deles, eu era só um pesquisador nesse caso, o professor pedia, eu dei uma olhada nos relatórios, com a permissão deles, e detectei algumas partes que eles falavam coisas interessantes pra minha pesquisa na interpretação do que eles tinham feito. Comecei a colocar lá no IBS essas observações e identificar o que eles estavam fazendo, olhar pros planos que eles tinham criado e comecei a perceber contradições do espaço e contradições da atividade, que eu já tinha identificado anteriormente, algumas reapareceram, outras voltaram. Por fim a gente fez uma análise histórica da atividade, então aquele processo mais, como é que fala de miçanga, que os professores não gostaram muito quem que lisse na tese, mas basicamente o que significa? Categorizar todas as minhas anotações de acordo com três categorias ali que eu vou explicar daqui a pouco que são, categorizar que tipo de nível de contradição que ela está e fazer uma relação entre uma nota e outra com essa perspectiva histórica, uma coisa relacionada a outra na construção ou na explicação de como aquilo ali surgiu. Essa análise histórica também inclui a literatura que trata do objeto de pesquisa, então nesse sistema eu coloco todos os artigos que eu leio, quer dizer, não todos, os que são mais importantes, que trazem mais insights. Então eu puxo o PDF, arrasto para cá e começo a tirar as principais citações, os principais conceitos que cada um desse artigo tem e muitas vezes um conceito é explorado de maneira mais aprofundada em outro artigo. Então eu criei uma espécie de um mapa visual porque sendo vindo da área de design, obviamente que eu priorizo esse feedback visual, como você já deve ter percebido, para poder entender o que estava acontecendo na literatura, o que a literatura estava falando daquele objeto de pesquisa que eu estava estudando. E essa leitura, ou melhor, essa análise também da literatura também é feita muito em livros, nessa área de design, livros são muito importantes, na engenharia de software já não são tão importantes assim, mas um design é fundamental, leitura de livros grossos, densos como esse do Helefevre, para entender o que ele está dizendo, ele não usa imagens, praticamente não tem uma imagem nenhuma no livro, eu começo a fazer minhas próprias imagens, eu começo a anotar, fazer inscrições, utilizo muito esse, como é que eu chamo isso aqui? É um afirmamento de post-it pequenininho para você marcar o marcador de páginas do texto, então primeiro eu coloco isso aqui na primeira leitura, nas partes principais, na segunda leitura eu vou lá e começo a fazer as anotações, ou às vezes eu volto e leio uma parte só, agrifo, e depois eu transcrevo, tudo que tiver essas anotações vira um nó dentro do meu mapa quando eu vou fazer uma análise aprofundada de um livro só, eu fiz isso para apenas uns três ou quatro livros, não fiz isso para todos os livros que eu li, mas só aqueles que realmente eu citei muito. Então como é que se dá essa análise histórica da atividade? Agora entra a parte de sangue, isso é o Engel, não é o método que eu criei, é o método que ele usa na tese dele, essa aqui foi vetada essa discussão, todas as notas podem ser divididas em três tipos, segundo essa análise histórica da atividade. Existem as notas que você faz sobre a fase de desenvolvimento da atividade que você está estudando, no caso o objeto de pesquisa, estou estudando atividade de projeto daquele centro diagnóstico, existem as notas teórica e histórica, são as anotações sobre desenvolvimento de teorias que explicam essa atividade, basicamente a literatura e atual empírica, são anotações sobre as explicações da atividade atualmente fornecidas pelos próprios participantes da atividade, ou seja, aqui não é eu falando, aqui não é a literatura falando, aqui são as pessoas que eu entrevistei falando, ou seja, derivam do meu trabalho de campo, que eu coletei no campo. Isso aqui, essa interpretação dessas anotações é intermediada pela teoria da atividade, aquele modelo sistêmico que eu falei, eu não vou explicar esse modelo agora, mas ele permite identificar contradições em três níveis, primário, secundário, terciário, quaternário, não vou explicar isso aqui agora, tá? Mas eu vou mostrar isso aqui, que aqui vem outra parte computacional interessante da minha tese, eu fui muito criticado no departamento de engenharia por não ter dados, por não ter quantidade, e aí quando no final da pesquisa, lá no último ano, eu colotei todas as anotações que eu tinha, exportei do compendium e coloquei num mapa só, todos os mapas, deu isso aqui, tá? E as cores representam o tipo, se é objeto histórico, se é teórico histórico, se é atual empírico, esse mapa aqui é só para ver o tamanho do universo, ele não serve para você ter nenhum insight a não ser esse, é grande, tá? Depois eu comecei a experimentar, fiz várias visualizações diferentes dessas mesmas dados e cheguei nessa daqui que eu acho bastante reveladora, porque ela mostra o fenômeno da triangulação dessa análise de dados qualitativos. Então, no total, nós tivemos 3.099 anotações, cada uma dessa anotações pode ter uma linha, às vezes tem uma página de texto, e aqui você vê ao longo do tempo, do começo da minha pesquisa, o primeiro ano, o segundo ano, o terceiro ano, o quarto ano, que no começo obviamente você tem muito mais anotações sobre teoria, então eu estou tentando definir qual vai ser a perspectiva que eu vou olhar para o meu objeto de pesquisa quando eu ainda não tenho acesso a ele, porque no começo é difícil você negociar acesso a estudos de caso, que as organizações abram as suas portas para você ir lá estudar, mas muito pouca anotação sobre a empírica. Você quer ver a proporção? A proporção muito maior é a teórica. Tem muito mais anotações teóricas, não porque eu tenha feito mais trabalho teórico do que empírico, mas porque para entender a teoria eu preciso de anotações mais do que para entender o empírico, porque no empírico eu me basei muito numa experiência prévia que eu já tinha com criação desses artefatos, com experiência de programação, enfim, então não era tão difícil para mim entender o que estava acontecendo, e às vezes quando a gente não está entendendo a gente não anota, porque é ruim, tá? A gente acha que entende e a gente não anota, daí depois não dá para fazer uma análise mais balanceada. Mas enfim, o que é interessante aqui é que há um tempo de triangulação muito forte no meio da pesquisa, em que a teoria, a definição do objeto e as evidências empíricas vão se alterando o tempo todo, tá? No final, as coisas meio que, a parte definição do objeto acaba praticamente, né? Porque já está definindo o objeto, é uma questão meramente de publicar, escrever a tese no final do ano, e volta a questão teórica, porque você volta na teoria, inclusive novas literaturas que surgiram no meio tempo, né? Enquanto a parte empírica diminui, mas continua rodando por algumas feedbacks que você precisa dar, você precisa coletar mais um outro dado para fechar o seu panorama. Então beleza, quando eu mostrei isso aqui os engenheiros começaram a me respeitá-lo, falaram "nossa, três mil notas, caramba, que paciência", e usar o mesmo método também durante quatro anos, que é uma coisa que raramente as pessoas têm paciência de fazer, mas é que dá essa vantagem, de você ter essa isonomia para depois poder comparar. O que eu descobri com essa tese? Eu não vou explicar todas as descobertas, só vou dar um exemplo, tá? São seis novas contradições que eu achei, uma delas que eu vou mostrar de exemplo é a expansão do objeto de design versus a contração de representações de design. Caraca, o que isso quer dizer? Tá? Um exemplo. Você tinha anteriormente, na história, isso aqui é uma contradição, uma questão histórica, então você tinha a atividade de construção civil muito focada nos materiais de construção numa determinada época, e você tem uma migração para a situação atual em que a atividade se torna cada vez mais interessada em experiências. Se fala, hoje eu fui contratado lá para trabalhar num departamento de engenharia civil porque eles queriam melhorar a experiência do usuário de um prédio. Eles queriam que um prédio fosse como um aplicativo da Apple. O software hoje é uma referência, digamos, engenharia de software é uma referência para eles, para os engenheiros civil, em termos de atratividade de um produto. Então eles querem fornecer essa experiência, só que dentro da própria engenharia de civil e da arquitetura tem uma crescente informatização do processo de criação. Utilizando ferramentas como eu mostrei do Autodesk Gravite que contraem, reduzem essa representação que antes era bastante fluida, baseada nos esboços que o arquiteto fazia, esses esboços eram bem soltos, muito parecidos às vezes com a pintura artística, para um tipo de desenho que já contém informação. Hoje o paradigma mais forte de tecnologia nessa área é o BIM, Building Information Modeling, que é você utilizar a modelagem de um prédio não só do ponto de vista geométrico, mas do ponto de vista de constructabilidade, do ponto de vista informacional, do ponto de vista dos custos. Então quando você desenha uma parede você diz quanto ela vai custar, qual material que ela vai ser, você diz quem vai construir e em que época você vai construir isso. Toda essa informação fica dentro do mesmo modelo para que ela sirva não só para o arquiteto, para o engenheiro civil, mas também para o engenheiro hidráulico, para o construtor e para aí vai. Então uma das grandes áreas hoje de pesquisa de design colaborativo é Building Information Modeling. Eu estudei alguns casos desses, mas não foi o meu foco da pesquisa. Então eu vi que por um lado você tem uma demanda por experiências que são bastante subjetivas e difíceis de você pontuar e dizer onde que está, por outro lado você tem ferramentas cada vez mais precisas e detalhadas, com tradição. Então aqui as ferramentas que eu criei são meio que termo entre uma coisa e outra justamente para tentar tornar essa contradição um pouco mais palatável. A ferramenta-obra, digamos assim a minha obra-prima da minha tese, é o jogo Hospital Expansivo. Eu tentei colocar nesse jogo de tabuleiro todas as contradições que eu encontrei na tese para que uma pessoa que não queira ler a minha tese possa se conscientizar dessas contradições e perceber que elas não são facilmente resolvidas simplesmente por mandar embora, demitir o arquiteto, ou você implementar uma tecnologia como Building Information Modeling. Nesse jogo você tem essa tecnologia, você pode implementar na construção de hospital e você vê que na maioria das vezes não resolve o problema de colaboração porque existem questões econômicas, políticas que precisam ser negociadas com os atores antes para eles adotarem essa tecnologia, que normalmente as pessoas não fazem, e a tecnologia acaba sendo utilizada como uma ferramenta política para uma pessoa dominar os outros. Então sempre uma pessoa que se adianta no Building Information Modeling nesse jogo acaba usando isso como um poder de troca, ela começa a vender informação para os outros que não têm informação. Então é um jogo muito bacana que já foi testado em quatro países do mundo, inclusive aqui no Hospital de Clínicas do Paraná. A gente usa aqui no curso de arquitetura como material didático da disciplina chamada Arquitetura Hospitalar e sempre a gente recebe muitos bons comentários dos estudantes que falam "olha, eu nunca consegui entender como se dá essa dinâmica de um projeto completo com todos os stakeholders" porque a gente lê os modelos no livro como deveria ser, mas a gente sabe que na prática não é assim que acontece, na prática nós temos muito conflitos e o jogo permite que você experimente o conflito sem se machucar. Então você pode fingir ser uma pessoa agressiva, você pode até ser desonesto nesse jogo, tem a possibilidade de formar cartéis. Eu não sabia, eu montei o jogo, mas os empreiteiros podem formar cartéis para poder fixar o preço. Então quando a primeira vez que fizeram isso foi no Hospital de Clínicas do Paraná, eles falaram que "lava jato, lava jato", quer dizer, uma questão política muito importante que estava no momento apareceu no jogo e eles falaram "não, isso aqui é lava jato, também acontece aqui, a gente tem esse tipo de conduio entre as empreiteiras e o poder público, também no nível micro". Mas quem já viu a série do Netflix "Mecanismos" sabe que não é só lá em cima que tem corrupção, tem aqui embaixo também. Mas voltando ao tema da tese, esse jogo aí é vendido na Europa por 10 mil euros, ninguém compra, claro. Mas foi um modelo de negócio que o professor criou, eu não achei muito bom, mas o professor lá na Holanda, ele tem também, é diferente do Brasil, ele tem direitos autorais sobre a pesquisa. O professor tem 50%. Eu não sei porque foi essa estratégia, mas foi o que aconteceu. 10 mil euros. Não, eu não vendo, eu não posso vender o jogo. No Brasil a gente ficou discutindo de ter um preço mais barato, mas acabou que não teve. Então, finalizando, eu descobri duas maneiras de abordagem de design, que eu chamei design redutivo e design expansivo. O design redutivo não é uma coisa que deve ser evitada, mas ele não é uma coisa que deve ser única. Então, o design redutivo é aquele que você quebra um problema em partes e resolve as partes separadas. Você divide a resolução desse problema entre especialistas. E aí quando chega no final você tem um frank-stype, cada um fez uma coisa diferente, as coisas não se conectam, e para você resolver esse problema você tem que eliminar todas as contradições. Essa é a abordagem do design redutivo. As contradições são excluídas. Se uma solução contradiz a outra, uma delas cai, uma delas sai. No design expansivo é o contrário. Você vai adicionando mais e mais elementos, mais pessoas, mais questões, e cada vez mais, até acabar o prazo do projeto. Você considera muitos aspectos e você, obviamente, levanta muitas contradições e isso não necessariamente é um problema para o projeto atingir a inovação que ele é um mesmo. Normalmente esse tipo de abordagem está mais ligada a um perfil de inovação do que a um perfil de otimização de eficiência, por exemplo, como design redutivo. Porém, toda inovação chega uma hora que ela deixa de ser inovação e ela precisa de eficiência. Então, eu proponho na minha tese que o design redutivo dá lugar ao design expansivo e o design expansivo dá lugar ao redutivo. Quer dizer, eles não se anulam, se complementam. Só que até hoje a literatura em princípio especial de engenharia tem dedicado muito mais ao design redutivo do que ao design expansivo. Então, eu falo, olha, tem isso aqui também. Conclusão, design não pode evitar reproduzir contradições. Contradições não são necessariamente ruins. Contradições estão por trás de inovações e jogos, eu testei de maneira empírica, podem ser uma maneira muito interessante para lidar com contradições de maneira produtiva. Por fim, antes de eu deixar vocês perguntarem, quero mostrar o que eu estou fazendo agora, que eu nem gostei para achar ele, Andrea, mas eu nem sei quando que eu vou terminar isso aqui também. Eu acho que vou ter que mudar aqui a minha telinha para poder ver ela em espelhada, se não vou conseguir mostrar para vocês. Então, o que eu estou fazendo agora para o meu postdoc é isso aqui. Putz, está uma resolução muito baixa. Não dá para ver. Vou botar uma resolução um pouquinho maior. Então, eu estou estudando como o trabalho de campo principal é na Apple Developer Academy, que é coordenada pelo Fábio. Fábio tem me ajudado também nesse estudo aqui. Porque todas as observações etnográficas que a gente faz lá, vai parar aqui dentro desses mapas. Acho que ele não aguentou o tranco aqui. Vai ter que ser nessa resolução mais baixa mesmo. Então, eu vou colocando as anotações dentro dos projetos que eu vou observando dentro da Apple Developer Academy. E eu vou relacionando algumas dessas evidências com anotações teóricas. Por enquanto eu não fiz isso ainda. A única conexão que eu fiz foi entre o Scholarship Challenge e a literatura sobre codificação criativa. Eu não vou explicar agora o que é. A gente já publicou, melhor publicou. A gente enviou para revisão artigos sobre codificação criativa na Apple Developer Academy. A gente tem ainda muitas outras relações aqui para desenvolver. E aqui eu acho mais interessante e mais audacioso é a definição das contradições da atividade em gênero de software. Então, eu estou tentando descobrir quais são as principais. E eu já tenho aqui nesse mapa mais ou menos umas 20. Eu já li os principais livros da área. Por que livro? Porque normalmente os papers não falam de contradições. São sempre na gíria a maior parte dos papers solucionam o problema e acabou. Mas você está trazendo aí só a teoria? Por enquanto é só a teoria. São notas, anotações que derivaram diretamente da teoria. Depois eu pretendo pegar essas anotações e confrontar com as anotações que eu retirei do trabalho empírico na Apple Developer Academy e outros casos que eu vai estudar. Fred, só que reside ou que tudo da gênero de software? Inicialmente eu estou pegando qualquer literatura que descreva de uma maneira histórica a gênero de software. Então, eu comecei... o primeiro livro que eu comecei aqui foi aquele "The Mythical Man-Math". Não sei como é que é o "Mitical Man-Math". Aqui eu encontrei muitas contradições. Vamos pegar um exemplo aqui. O Fred Brooks fala que num projeto de software você tem que dividir o trabalho porque o software é muito grande, muito complexo. Só que quando você faz isso você perde integridade conceitual. Porque o conceito que você tem como arquiteto do projeto você não consegue explicar para outras pessoas porque é um conhecimento de natureza tácita. E aí ele começa a ficar fragmentado e aí você às vezes não consegue controlar, mas esse conceito perde e fica um software Frankenstein. Essa é uma contradição que ele fala que tem uns problemas, olha, separação das tarefas de design é um dos problemas que é causado mais prático. A comunicação entre as pessoas é muito fraca, né? Difícil de controlar... aqui tem outra. A complexidade do software vai aumentando proporcionalmente à vontade de controlar essa complexidade. Vontade, só não capacidade. Tem várias discussões interessantes aqui, mas ainda estão em fase bem embrionária. Só estou trazendo mais para mostrar que tudo que eu apresentei aqui é aplicável em gênero de software. Eu estou no começo, né? É obviamente que ainda vamos ter que passar pela toda rodada de convencimento dos revisores da disciplina para ver se isso passa no Crivo, né? A gente já teve aquele artigo de codificação criativo no ano passado que foi rejeitado na principal conferência de gênero de software. Então a gente sabe que não vai ser uma trajetória fácil para justificar essas abordagens, mas é o que eu posso dizer que eu consegui fazer isso na engenharia civil, que eu acho que é uma disciplina muito mais estabelecida do que a engenharia de software em termos de engenharia muito mais antiga. E se eles se passaram lá, por que não vai passar na engenharia de software? É o que eu acho, minha estratégia. Então eu publiquei, né? Eu publiquei em Jornos de Engenharia Civil. Então se eu passei lá, eu espero que eu vá conseguir. Por isso que eu estou progredindo, continuando nesse caminho. Beleza? Então era isso. Se vocês tem alguma dúvida, um comentário, uma crítica, desculpem por ter feito uma apresentação.